A bancada bolsonarista na Câmara
dos Deputados foi rapidamente da celebração e do júbilo à cólera e ao
desencanto. Isso porque, em poucas horas, dormiu comemorando a aprovação da
urgência do projeto de anistia e acordou com Paulinho da Força a tiracolo
designado por Hugo Motta como
relator da matéria. O responsável pelo novo texto tratou de distribuir
entrevistas deixando claro o que o mundo político já falava nos bastidores: não
haverá anistia. O que haverá, como concessão do Centrão, será
uma alteração nas penas já atribuídas aos réus do 8 de janeiro,
incluindo, daí sim, Jair Bolsonaro, recentemente condenado pelo Supremo Tribunal
Federal.
Sem qualquer torcida, contra ou a favor: fato é que a
anistia foi engolida por um acordão que instrumentalizou o objetivo político
dos bolsonaristas. Estes foram feitos de gato e sapato. O que o Centrão queria
mesmo era a PEC da Blindagem, um esculacho institucional que, na prática, torna
todos os parlamentares juridicamente inexpugnáveis a qualquer tipo de
investigação. Na esteira desse escudo corporativista é que vinha a promessa de
aceleração da tal anistia, como uma espécie de contrapartida. Mas não nos
termos pretendidos por Eduardo
Bolsonaro, Sóstenes
Cavalcante e outros.
A escolha de Paulinho da Força é a materialização
dessas intenções. E ele já se colocou a trabalhar em nome da conjunção dos
diversos interesses envolvidos. Na última quinta-feira, apareceu em um vídeo ao
lado do deputado Aécio Neves e do ex-presidente Michel Temer. Ao
que consta, participou de uma reunião que envolveu, remotamente, Hugo Motta e
os ministros Alexandre
de Moraes e Gilmar Mendes,
com quem, aliás, já havia prometido dialogar. Na gravação, Temer, tido como
artífice da costura, inclusive rebatiza a PL da Anistia como PL da Dosimetria.
Nada de perdão. Nada de esquecimento. No máximo uma colher de chá nas punições.
Já havia escrito na Gazeta do Povo que a
mobilização política pró-anistia de governadores de direita era, em boa medida,
um teatro político e eleitoral. Nenhum deles, nem os líderes do Centrão, como
Gilberto Kassab, Ciro Nogueira e Valdemar
da Costa Neto, teriam a ganhar com o ex-presidente no jogo de 2026 como
titular. Mas a tão propalada anistia servia simultaneamente como peça de
propaganda política e moeda de troca. Todos, afinal, lucravam com ela como
possibilidade permanente, tanto para receber os votos dos bolsonaristas quanto
para enquadrar o governo Lula e mantê-lo receoso. Com a proximidade do ano
eleitoral, a articulação se acelerou.
Ao invés de um Bolsonaro perdoado e elegível, o
resultado será provavelmente um Bolsonaro condenado por menos tempo, preso em
casa e forçado a ser cabo eleitoral de alguém do campo oposicionista. Isso
para, na hipótese de uma vitória contra Lula, um candidato como Tarcísio,
Ratinho Jr ou Caiado, lhe conceder o indulto. Até lá terá de se contentar não
com a anistia, mas com uma dosimetria ampla, geral, irrestrita e devidamente
calculada pelo Centrão.