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O legado negativo de Barroso e a obrigação dos senadores

O legado negativo de Barroso e a obrigação dos senadores 

Na quinta-feira, passada, dia 9, o ministro do STF Luís Roberto Barroso anunciou a antecipação de sua aposentadoria – Barroso, que acabou de deixar a presidência da corte, poderia permanecer no Supremo até 2033, quando completa 75 anos, mas alegou que “gostaria de viver um pouco mais da vida que me resta sem a exposição pública, as obrigações e as exigências do cargo”. O ministro também disse que não se tratou de decisão tomada subitamente, mas algo que em que ele vinha pensando havia ao menos dois anos. Esta será sua última semana na corte, pois a aposentadoria começa no próximo sábado.

 

Embora seja importante reconhecer que Barroso adotou postura firme em casos de corrupção, tendo inclusive votado contra a suspeição de Sergio Moro – naquela ocasião, ele disse que “na Itália, a corrupção conquistou a impunidade. Aqui, entre nós, ela quer vingança. Quer ir atrás dos procuradores e juízes que ousaram enfrentá-la” –, o ministro deixa um legado muito deletério, na forma de incentivo ao ativismo judicial, da militância em favor de causas como a legalização do aborto e do uso de drogas, e da sua visão do Judiciário como poder “iluminista e contramajoritário”, encarregado de “empurrar a história”. No entanto, muito pior que isso (e isso já é suficientemente nefasto) foi sua participação no processo de destruição da democracia ocorrido ao longo dos últimos anos, e do qual o Supremo foi o grande protagonista. 


"Barroso deixa um legado muito deletério, especialmente por sua participação no processo de destruição da democracia ocorrido ao longo dos últimos anos"

 

O ministro que se orgulhava de ter “derrotado o bolsonarismo”, e que respondeu com um “perdeu, mané” a um brasileiro que o importunava em Nova York, validou com seu voto, em 2020, o abusivo inquérito das fake news, aberto um ano antes – e àquela altura os efeitos nocivos dessa investigação já se haviam feito sentir, com a censura a veículos de comunicação. Barroso, portanto, ajudou a manter aberta a caixa de Pandora da qual foram saindo todas as agressões às liberdades e garantias democráticas, da censura indiscriminada às denúncias e condenações sem individualização da conduta, nos julgamentos do 8 de janeiro. Nas vezes em que teve a chance de votar (antes que os casos fossem levados à Primeira Turma, em formato virtual), foi favorável à aceitação de denúncias genéricas e às condenações sem provas, chegando a dizer que o julgamento tinha um caráter “didático e civilizatório”, ao votar pela condenação de Aécio Lúcio Costa Pereira, o primeiro réu do 8 de janeiro a ter seu caso analisado pela corte. Mesmo quando presidiu o STF, entre setembro de 2023 e setembro de 2025, jamais levantou a voz contra o arbítrio, limitando-se a defender uma fusão de crimes para reduzir penas de “bagrinhos”, apenas em seus últimos dias à frente da corte, depois que todo o estrago já havia sido feito. 


Com exceção, portanto, dos temas ligados ao combate à corrupção, será difícil que tenhamos um ministro ainda pior que Barroso. Mas poderemos ter alguém melhor, se determinados agentes políticos tiverem a coragem de fazer a coisa certa. Não falamos, evidentemente, do presidente Lula, que em sua primeira indicação ao STF neste terceiro mandato resolveu recompensar seu advogado pessoal pelos serviços prestados durante a Operação Lava Jato, e na segunda indicação escolheu seu ministro da Justiça, uma pessoa de alma autoritária, adversária das liberdades, especialmente a liberdade de expressão – ninguém há de esperar algo diferente com a indicação que acaba de lhe cair no colo. Falamos é de quem tem o poder de frear a depredação institucional que Lula e o petismo adoram promover.

 

Qualquer indicado por Lula – e, a bem da verdade, nenhum dos nomes que têm sido ventilados desperta o mínimo entusiasmo – tem de ser sabatinado e aprovado pelo Senado. Primeiro, tem de conquistar o endosso da maioria dos membros da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ); depois, da ao menos 41 dos 81 senadores. Cristiano Zanin teve 21 votos contra 5 na CCJ, e 58 a 18 no plenário; Flávio Dino teve um pouco mais de dificuldade, mas nada que colocasse em risco sua indicação, sendo aprovado por 17 a 10 na CCJ e 47 a 31 no plenário. Estariam os senadores dispostos a fazer o que não fazem desde 1894, recusando uma nomeação presidencial para a suprema corte? 


Lula não irá dizer que está escolhendo um ministro do STF por afinidade ideológica ou para que lhe dê as mãozinhas amigas que o governo sempre busca quando encontra alguma dificuldade, mas é assim que o petismo funciona. Com a facilidade de recursos que há hoje, os senadores não têm desculpa para não chegar à sabatina já cientes de tudo o que o futuro escolhido de Lula pensa sobre vários temas e como agiu ou decidiu quando teve nas mãos o poder para tal. Sabatinas não existem para que senadores e indicado troquem gentilezas, mas para colocá-lo na parede, pedir explicações e esclarecimentos. 


O Brasil precisa urgentemente recuperar o respeito pelas liberdades democráticas, especialmente a liberdade de expressão e o devido processo legal. Precisa de três poderes que funcionem com independência, sem um Judiciário hipertrofiado. Precisa de ministros sem vocação para holofotes. Barroso, que está de saída, afirmou que o Supremo havia se tornado um “poder político”; uma das etapas da desejada pacificação do país é termos no STF ministros empenhados em desarmar o estado atual de coisas que levou ao fim da democracia no país. Diante do chamado a cumprir corretamente sua missão constitucional, ao participar do processo de escolha do próximo integrante da suprema corte, o Senado não pode se omitir. 



Gazeta do Povo - (Foto: Antonio Augusto/STF) - Editorial 


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