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Sempre a imagem

Sempre a imagem 

Dez nos depois do maior desastre ambiental do país, a ferida aberta em Mariana segue supurando entre os escombros da burocracia e o silêncio conveniente dos que lucraram com a lama. O rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em novembro de 2015, arrastou com seus 44 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério não apenas casas e plantações, mas também a crença — já rarefeita — de que a justiça brasileira pudesse ser célere, eficaz e equitativa. Dez anos depois, ou onze conforme o calendário das vítimas, a reparação ainda se arrasta como uma lesma manca pelos corredores do Judiciário. 

Foram mais de 300 mil pessoas atingidas direta ou indiretamente pela avalanche de resíduos que desceu das encostas de Bento Rodrigues até o leito do Rio Doce, apagando do mapa comunidades inteiras, destruindo o bioma e comprometendo a vida aquática até a foz, no Espírito Santo. Oficialmente, 19 pessoas morreram nos minutos seguintes ao desmoronamento, mas os moradores locais garantem que o número é maior. Há mortos sem nome, desaparecidos sem estatística e histórias que o tempo e o descaso se encarregaram de soterrar sob toneladas de lama tóxica. 

As mineradoras Samarco, Vale e BHP Billiton — esta última de origem britânica — seguem desde então em um vaivém processual que mais parece uma coreografia bem ensaiada da impunidade. Enquanto isso, parte das vítimas já morreu sem receber indenização, e outras sobrevivem com pequenas pensões, sem o direito elementar à recomposição do lar e da dignidade. É um roteiro já conhecido: de um lado, empresas com exércitos de advogados; de outro, cidadãos invisíveis, sem o peso social ou econômico capaz de fazer girar a roda emperrada da justiça. 

Estudo recente da Fundação Getúlio Vargas apontou que a expectativa de vida das populações expostas aos rejeitos metálicos — ferro, silício, alumínio e outros — caiu em média dois anos e meio desde o desastre. Trata-se de um dado estarrecedor, mas que pouco ecoa nos relatórios oficiais. O metal pesado, afinal, não intoxica apenas os corpos: envenena também a memória coletiva e a moral pública. 

De lá para cá, formou-se uma cadeia infindável de comissões, fundações e comitês. Criou-se até uma entidade chamada Fundação Renova, encarregada de coordenar a reparação, que mais tarde foi extinta, deixando para trás o mesmo rastro de incertezas que a lama deixou nas margens do rio. Cada tentativa de acordo entre Estado e empresas resultou em novas repactuações, novos prazos, novas cifras. O último grande acerto, celebrado com pompa em 2024, prevê o pagamento de R$ 170 bilhões aos estados de Minas Gerais e Espírito Santo, valor que soa grandioso até que se descobre o detalhe: o montante será parcelado ao longo de vinte anos. Um tempo suficientemente longo para que a lembrança do desastre se dissipe e os beneficiários iniciais talvez já não estejam vivos para usufruir da justiça prometida. 

Aos moradores e pequenos agricultores restam cifras modestas: R$ 35 mil para uns, R$ 95 mil para outros. Em troca, uma década de sofrimento, doenças, deslocamentos forçados e o peso psicológico de assistir ao desaparecimento de um modo de vida. As mineradoras, por sua vez, terão ainda de reconstruir casas — como se tijolos e rebocos pudessem restaurar a alma perdida de Bento Rodrigues. 

Enquanto isso, a outra face do litígio se desenrola em Londres, onde uma ação coletiva movida por milhares de atingidos contra a BHP Billiton cobra uma indenização de R$ 230 bilhões. O caso brasileiro, ao que parece, precisou atravessar o Atlântico para que se encontrasse esperança de justiça. E foi justamente isso que incomodou o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), que recorreu ao Supremo Tribunal Federal. Em decisão monocrática, o ministro Flávio Dino restringiu a atuação dos municípios que contrataram escritórios estrangeiros para tratar do caso. Para o então presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, permitir que uma tragédia ocorrida em solo nacional fosse julgada por outro país seria “muito ruim para a imagem da Justiça brasileira”. 

Talvez o ministro tivesse razão quanto à imagem. O problema é que a imagem, diferentemente da justiça, não precisa ser reparada, apenas preservada. O que se busca em Londres não é vaidade institucional, mas resposta efetiva. E essa, ao que tudo indica, tarda. 

A frase que foi pronunciada: “Da terra, da água, do sol e do ar, só faltam dois pra tributar.” (Delegado Peralta)

Binacional: Esperança no senador Esperidião Amin. Esforço hercúleo em estabelecer um teto para o preço da energia elétrica vinda da usina de Itaipu. O objetivo é baratear a tarifa para o consumidor. Agora, com o estímulo aos carros elétricos, o consumidor que gerar mais energia, contribui com o governo. Esperidião Amin quer o contrário. Na historinha de Brasília, abaixo, energia já era problema.

 

Circe Cunha e Mamfil – Coluna “Visto, lido e ouvido” - Ari Cunha - Quebra da barragem da mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG) Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil - Delegado Peralta. Foto: hnt.com - Senador Esperidião. Foto: senado.leg.br - Correio Braziliense 


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