Há mais de dois anos, o senador Eduardo Girão (Novo-CE) vem insistindo na necessidade de uma CPI do Crime Organizado para investigar a infiltração de facções e milícias no poder público e o avanço do narcotráfico no país. O pedido, protocolado ainda em 2022, ficou esquecido nas gavetas do Senado até recentemente.
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Na última semana, porém, o tema voltou com força após a Operação Contenção, no Rio de Janeiro — uma das maiores ações já realizadas contra o tráfico, que escancarou a força do crime nas comunidades e reacendeu o debate sobre o controle territorial de facções. O episódio, que terminou com a morte de policiais e criminosos, trouxe à tona a discussão sobre a omissão do Estado e a politização da segurança pública.
Em meio a esse cenário, Girão acusa o governo Lula de “tomar de assalto” a comissão, tirando da oposição o comando, colocando o senador Fabiano Contarato (PT-ES) na presidência, e esvaziando sua função investigativa. “Deu PT na CPI do Crime Organizado”, resume o senador, ao criticar o que considera um movimento de blindagem institucional.
Nesta entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, ele comenta os bastidores dessa disputa, critica a postura do Supremo Tribunal Federal, cobra independência do Senado e detalha as descobertas da CPMI do INSS, que investiga um esquema bilionário de fraudes contra aposentados e pensionistas.
Entrelinhas: Finalmente, a comissão saiu do papel. No entanto, o senhor vem denunciando irregularidades na formação da CPI do Crime Organizado. O que aconteceu, afinal? Girão: Deu PT na CPI do Crime Organizado. Deu perda total. A gente lutou muito por essa comissão desde 2022. Consegui mais de 30 assinaturas de senadores, e o presidente Rodrigo Pacheco simplesmente engavetou o pedido. Só depois da tragédia no Rio de Janeiro — uma operação importante que revelou o poder das facções —, é que o assunto voltou à pauta.
Mas o que fizeram agora foi um assalto político. Eles não queriam a CPI e, mesmo assim, tomaram a presidência e a relatoria. Falaram: “Ah, não tem ninguém armado aqui”. Mas assalto também se faz de outras formas — como eles fizeram.
Entrelinhas: Como foi essa “tomada de assalto”? Girão: O governo Lula tomou o comando de algo que não queria. Nós perdemos por um voto, e esse voto foi resultado de manobra do PSD, que trocou senadores na última hora pra garantir o controle. É muito grave.
Essa CPI era pra ser independente, mas o governo tem medo da autonomia. Qual é o problema de ter um presidente da oposição e um relator da situação? Isso seria equilíbrio. Mas não — eles querem tudo nas mãos.
Mesmo assim, vamos continuar lutando. Se tentarem transformar a CPI em teatro, eu não participo. O povo brasileiro não merece falsas expectativas.
Entrelinhas: O senhor também tem feito críticas fortes ao Supremo Tribunal Federal. Como avalia a atuação do ministro Alexandre de Moraes e o papel do Senado nesse contexto? Girão: É inacreditável, mas o Alexandre de Moraes estava agora há pouco dentro do Senado. E sabe com quem? Com o presidente Davi Alcolumbre — o mesmo que segura mais de 80 pedidos de impeachment de ministros, sendo a maioria contra ele.
Esse ministro virou tudo ao mesmo tempo: delegado, promotor, vítima, presidente da República e agora quer ser governador do Rio de Janeiro. Ele caiu de paraquedas numa relatoria que era do ministro Gilmar Mendes. O próprio regimento do STF foi rasgado. Mas, pra essa turma, rasgar regimento e Constituição virou rotina.
Ele é o único juiz do mundo sancionado pela Lei Magnitsky, por violar direitos humanos, e ainda vem dar lição de democracia. O Brasil vive uma inversão completa.
Entrelinhas: O senhor disse que não há “clima político” no Senado para tratar desses pedidos de impeachment. Por quê? Girão: Porque há blindagem. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, virou escudo do STF. Toda semana eu olho nos olhos dele e pergunto: “E os pedidos de impeachment, presidente?”.
Temos dois milhões de assinaturas de cidadãos, dois juristas renomados — Sebastião Coelho e Rodrigo Saraiva Marinho —, 147 deputados e apoio de 41 senadores. Mesmo assim, silêncio total.
Mas pra blindar o “careca do INSS”, a Advocacia do Senado é rápida: dá despacho em horas, proíbe câmeras, impede imagens. É o retrato da inversão institucional. Ainda assim, eu creio: os humilhados serão exaltados. A soberba precede a queda.
Entrelinhas: O senhor mencionou o caso do INSS. Como avalia o andamento da CPMI que investiga as fraudes na Previdência? Girão: Essa turma já era pra estar toda presa. Quem acompanha a CPMI do INSS sabe: a gente fica até duas da manhã e vê mentiras descaradas. O dinheiro orbitava entre parentes, amigos, diretores de sindicatos e confederações.
Mesmo com a blindagem, conseguimos aprovar requerimentos importantes. Descobrimos que parte do dinheiro foi parar fora do país. E até agora o Frei Chico, irmão do presidente Lula e vice da Contag, não foi convocado. Isso é um escândalo.
O governo sabia de tudo. A CGU não viu, a AGU não viu, ninguém do Ministério da Previdência viu. E o mais grave: o dinheiro pra indenizar os aposentados está saindo do Tesouro Nacional, ou seja, do próprio bolso das vítimas. É como se o ladrão usasse a poupança da vítima pra pagar o prejuízo.
Entrelinhas: Apesar disso, o senhor acredita que a CPMI do INSS pode gerar punições reais? Girão: Pode, se mantiver independência. O presidente Carlos Viana tem conduzido com equilíbrio, e o relator Alfredo Gaspar é um homem de coragem. Nós vamos reapresentar os requerimentos que foram negados.
Querem negar de novo? Que neguem, com o dedo digital do PT registrado. O povo está vendo. Uma da manhã, trinta, quarenta mil pessoas acompanhando a TV Senado. Isso mostra que o brasileiro quer saber a verdade.
Entrelinhas: Diante de tanta frustração, o que o mantém nessa luta política? Girão: O amor ao Brasil. Eu acredito que não há mal que dure pra sempre. Os humilhados serão exaltados, e a soberba precede a queda — é bíblico.
Eu não me candidatarei à reeleição, porque sou contra esse instrumento. Mas, até o último dia de mandato, vou lutar pra que esse país volte a ter justiça e democracia. Hoje há censura e perseguição a quem é de direita ou conservador. Isso precisa mudar.




