Trânsito parado, passageiros abandonados, escolas sem aula, pacientes sem hospital. A população da capital passou uma terça-feira de terror. O problema, segundo especialistas, veio da falta de planejamento do GDF, que diminuiu receitas e extrapolou gastos.
A diminuição das receitas e o aumento de gastos com pessoal explicam o conturbado fim do atual governo. Em 2014, o Executivo local empenhou R$ 10,5 bilhões no pagamento de servidores públicos e terceirizados, totalizando 54% da arrecadação (veja quadro). Há quatro anos, o GDF usou R$ 5,3 bilhões para esse fim, ou seja, 97,7% a menos que agora. Para especialistas ouvidos pelo Correio, a concessão de aumentos salariais sem estudo de impacto financeiro comprometeu as contas da gestão de Agnelo Queiroz (PT).
Com as finanças desequilibradas, serviços básicos deixaram de funcionar. Sem dinheiro em caixa, várias categorias não receberam em dia. Desde a semana passada, rodoviários deflagram sucessivas paralisações. Há dois dias, os 23 mil professores da rede pública decretaram greve. Ontem, eles fecharam o Eixo Monumental, em frente ao Palácio do Buriti. A mobilização provocou um colapso no trânsito da região central. A eles se juntaram servidores da Saúde. Em comum, todos reclamam do atraso no pagamento dos salários (leia mais nas páginas 18 e 19).
Diante do cenário de caos, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) decidiu intervir. No fim da tarde de ontem, o procurador-geral de Justiça, Leonardo Bessa, convocou vários promotores para discutir propostas a fim de evitar que a situação do DF piore. Bessa deve agendar um encontro ainda esta semana com o presidente do Tribunal de Contas do DF (TCDF), Inácio Magalhães. A ideia é tomar medidas articuladas.
Na avaliação do economista e fundador da organização não governamental Contas Abertas, Gil Castelo Branco, o maior erro da equipe de Agnelo foi não se adequar à nova realidade econômica do país e do mundo. “Quando o governo federal promoveu desonerações de impostos para manter os índices de emprego, uma das consequências foi o menor repasse de receitas para estados e municípios. Os gestores deveriam manter o pé no freio para evitar o colapso, mas o GDF fez justamente o contrário. Gastou acentuadamente em contratação e reajustes e agora toma medidas desesperadas para não ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal”, criticou o especialista.
A leitura de Gil Castelo Branco é confirmada pelos números. Um estudo do próprio GDF aponta que, no período de 2010 a 2014, as despesas do Poder Executivo saltaram de R$ 11,8 bilhões para R$ 19 bilhões, um incremento de 65%. “Num momento complicado, o governo ainda assumiu dívidas, como as obras do Estádio Nacional e do Centro Administrativo. Além do dinheiro investido nesses e em outros empreendimentos, é preciso mais recursos para dar sustentação aos investimentos. Tal falta de planejamento nos leva a assistir a esse melancólico fim de governo”, complementou o economista.
Reclamações
Enquanto a cúpula do GDF tenta encontrar uma fórmula para sanar as dívidas, moradores do DF cobram soluções para os inúmeros problemas. O mato toma conta de praças e monumentos públicos; motoristas e cobradores de empresas de ônibus deixaram de rodar; e as aulas nas 660 escolas públicas do DF tiveram de ser canceladas nos últimos dois dias, pois os docentes não receberam salário. “É uma vergonha o que estamos passando. Atrasei o pagamento da faculdade da minha filha, de água e de luz. É um absurdo estarmos aqui lutando por um direito tão básico, que é receber pelo seu trabalho”, criticou a professora Maria Alves do Nascimento, 51 anos.
O professor de administração pública da Universidade de Brasília (UnB) José Matias-Pereira diz não ter recebido com surpresa o estouro nas contas públicas. Na opinião dele, pesaram para a consolidação do cenário atual as escolhas feitas por Agnelo ainda no início do seu mandato. “É fundamental que um governo tenha austeridade na forma de governar. É preciso se cercar de gestores competentes e compromissados em ofertar serviços públicos de qualidade desde o início, e isso não foi feito.”
O docente ressalta que as ações de Agnelo para estancar a crise visam evitar futuras sanções penais. “Mal assessorado, o governo extrapolou nos gastos e agora tem de criar fórmulas para entregar ao seu sucessor (Rodrigo Rollemberg) um caixa minimamente equilibrado. Ele (Agnelo) sabe que, se não corrigir alguns erros, pode até responder criminalmente por isso, o que afetaria profundamente a carreira política”, destacou.
Por meio de nota, o GDF garantiu que vem honrando todos os compromissos e que ainda não ultrapassou os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal. “O Poder Executivo está cumprindo ambos os limites da LRF. Conforme Relatório de Gestão Fiscal do 2º Quadrimestre de 2014, o índice de gastos com pessoal alcançou 46,04%. O limite máximo do Poder Executivo é de 49% e o limite prudencial é de 46,55%”, destaca o texto. O índice apontado pelo governo inclui os repasses do Fundo Constitucional, não considerados pelos técnicos do GDF ao apontar o aumento para 54%.
Por: Saulo Araújo - Correio Braziliense
Publicação: 10/12/2014
Cerca de 3km de engarrafamento tomaram conta do centro de Brasília, com a manifestação dos professores e de servidores da Saúde em frente ao Palácio do Buriti |
A diminuição das receitas e o aumento de gastos com pessoal explicam o conturbado fim do atual governo. Em 2014, o Executivo local empenhou R$ 10,5 bilhões no pagamento de servidores públicos e terceirizados, totalizando 54% da arrecadação (veja quadro). Há quatro anos, o GDF usou R$ 5,3 bilhões para esse fim, ou seja, 97,7% a menos que agora. Para especialistas ouvidos pelo Correio, a concessão de aumentos salariais sem estudo de impacto financeiro comprometeu as contas da gestão de Agnelo Queiroz (PT).
Com as finanças desequilibradas, serviços básicos deixaram de funcionar. Sem dinheiro em caixa, várias categorias não receberam em dia. Desde a semana passada, rodoviários deflagram sucessivas paralisações. Há dois dias, os 23 mil professores da rede pública decretaram greve. Ontem, eles fecharam o Eixo Monumental, em frente ao Palácio do Buriti. A mobilização provocou um colapso no trânsito da região central. A eles se juntaram servidores da Saúde. Em comum, todos reclamam do atraso no pagamento dos salários (leia mais nas páginas 18 e 19).
Médicos e funcionários de serviços hospitalares fizeram com que só serviços de emergência funcionassem |
Diante do cenário de caos, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) decidiu intervir. No fim da tarde de ontem, o procurador-geral de Justiça, Leonardo Bessa, convocou vários promotores para discutir propostas a fim de evitar que a situação do DF piore. Bessa deve agendar um encontro ainda esta semana com o presidente do Tribunal de Contas do DF (TCDF), Inácio Magalhães. A ideia é tomar medidas articuladas.
Na avaliação do economista e fundador da organização não governamental Contas Abertas, Gil Castelo Branco, o maior erro da equipe de Agnelo foi não se adequar à nova realidade econômica do país e do mundo. “Quando o governo federal promoveu desonerações de impostos para manter os índices de emprego, uma das consequências foi o menor repasse de receitas para estados e municípios. Os gestores deveriam manter o pé no freio para evitar o colapso, mas o GDF fez justamente o contrário. Gastou acentuadamente em contratação e reajustes e agora toma medidas desesperadas para não ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal”, criticou o especialista.
Professores ficaram na frente da sede do governo até o fim da tarde, quando o trânsito foi liberado |
A leitura de Gil Castelo Branco é confirmada pelos números. Um estudo do próprio GDF aponta que, no período de 2010 a 2014, as despesas do Poder Executivo saltaram de R$ 11,8 bilhões para R$ 19 bilhões, um incremento de 65%. “Num momento complicado, o governo ainda assumiu dívidas, como as obras do Estádio Nacional e do Centro Administrativo. Além do dinheiro investido nesses e em outros empreendimentos, é preciso mais recursos para dar sustentação aos investimentos. Tal falta de planejamento nos leva a assistir a esse melancólico fim de governo”, complementou o economista.
Reclamações
Enquanto a cúpula do GDF tenta encontrar uma fórmula para sanar as dívidas, moradores do DF cobram soluções para os inúmeros problemas. O mato toma conta de praças e monumentos públicos; motoristas e cobradores de empresas de ônibus deixaram de rodar; e as aulas nas 660 escolas públicas do DF tiveram de ser canceladas nos últimos dois dias, pois os docentes não receberam salário. “É uma vergonha o que estamos passando. Atrasei o pagamento da faculdade da minha filha, de água e de luz. É um absurdo estarmos aqui lutando por um direito tão básico, que é receber pelo seu trabalho”, criticou a professora Maria Alves do Nascimento, 51 anos.
O professor de administração pública da Universidade de Brasília (UnB) José Matias-Pereira diz não ter recebido com surpresa o estouro nas contas públicas. Na opinião dele, pesaram para a consolidação do cenário atual as escolhas feitas por Agnelo ainda no início do seu mandato. “É fundamental que um governo tenha austeridade na forma de governar. É preciso se cercar de gestores competentes e compromissados em ofertar serviços públicos de qualidade desde o início, e isso não foi feito.”
O docente ressalta que as ações de Agnelo para estancar a crise visam evitar futuras sanções penais. “Mal assessorado, o governo extrapolou nos gastos e agora tem de criar fórmulas para entregar ao seu sucessor (Rodrigo Rollemberg) um caixa minimamente equilibrado. Ele (Agnelo) sabe que, se não corrigir alguns erros, pode até responder criminalmente por isso, o que afetaria profundamente a carreira política”, destacou.
Por meio de nota, o GDF garantiu que vem honrando todos os compromissos e que ainda não ultrapassou os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal. “O Poder Executivo está cumprindo ambos os limites da LRF. Conforme Relatório de Gestão Fiscal do 2º Quadrimestre de 2014, o índice de gastos com pessoal alcançou 46,04%. O limite máximo do Poder Executivo é de 49% e o limite prudencial é de 46,55%”, destaca o texto. O índice apontado pelo governo inclui os repasses do Fundo Constitucional, não considerados pelos técnicos do GDF ao apontar o aumento para 54%.