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#MPDFT: ENTREVISTA LEONARDO BESSA » Diálogo e limite no discurso

O novo procurador-geral de Justiça do DF, Leonardo Bessa, espera desafogar o Judiciário e se revela irredutível no combate à corrupção

Por: Ana Maria Campos - Almiro Marcos - Correio Braziliense 
Publicação: 07/12/2014

"Nas áreas de improbidade administrativa e criminais, não tem discussão. Não tem conciliação. Depois do fato consumado, não tem diálogo"


Saúde, educação e transporte público são as áreas mais sensíveis e que merecem um olhar dedicado do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). A constatação é de quem vai fiscalizar o Executivo e o Legislativo nos próximos dois anos, o novo procurador-geral de Justiça do Distrito Federal, Leonardo Roscoe Bessa. 

Nomeado pela presidente Dilma Rousseff, o promotor, com 23 anos de atuação na carreira, tomou posse na última sexta-feira e estreia no cargo em um momento em que também há renovação no Governo do DF. 

Em entrevista ao Correio, Bessa, 47 anos, prega uma boa relação com o novo governador, Rodrigo Rollemberg. Quer adotar um modelo de diálogo institucional, uma parceria em benefício da população. A intenção é prevenir os problemas para reduzir, assim, as disputas que assoberbam o Judiciário. 

Com a experiência na Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor (Prodecon), em que muitas demandas se tornaram ações judiciais e questões foram resolvidas em acordos entre as partes, Bessa pretende trabalhar com o intuito de impedir os litígios que se arrastam por anos na Justiça. No caso de políticos corruptos, no entanto, não há discussão: “Depois do fato consumado, não tem diálogo”.  


"O Ministério Público tem que se envolver mais com a questão da saúde, educação e transporte coletivo. Existe uma necessidade premente nessas áreas. Vamos enfrentar esses temas pensando em que medida podemos agir de maneira propositiva, e também o limite disso"

"Ir para a Justiça, ao contrário do que muitos imaginam, não resolve as situações em todos os casos. O promotor pode até dizer: 'Ah, entrei com a ação', só que a realidade, quando você olha pela janela, é que não mudou coisa nenhuma"


Qual é a prioridade da sua gestão?
Neste momento, internamente, a prioridade é regulamentar a Lei 13.024, que traz uma nova realidade: mais estabilidade para o promotor de Justiça adjunto. Essa lei fala que o promotor entra e fica vinculado a uma promotoria. Hoje, o promotor adjunto muda muito. Essa alteração vai trazer mais estabilidade. Mas é uma mudança de paradigma muito forte. Tem uma comissão que está analisando o caso. O promotor adjunto terá uma promotoria fixa. Teremos uma distribuição e instalação, com a probabilidade de surgirem novas 55 promotorias com atribuições dentro do DF.

Qual a repercussão para a população, 
para fora do 
Ministério Público?

Uma coisa que já é um consenso é que as promotorias de tutela de direitos coletivos e difusos têm que estar na ponta, estar nas cidades. Algumas cidades vão ter, por exemplo, uma promotoria de direitos coletivos que vai cuidar da área de saúde, de patrimônio público urbanístico e consumidor.

Existem áreas que terão mais atenção?
O Ministério Público tem que se envolver mais com a questão da saúde, educação e transporte coletivo. Existe uma necessidade premente nessas áreas. Vamos enfrentar esses temas pensando em que medida podemos agir de maneira propositiva, e também o limite disso. Não sou empolgado com essa coisa de levar tudo para o Judiciário, porque, às vezes, significa não resolver.

A sua experiência de vários anos na Promotoria do 
Consumidor, na defesa dos interesses da população, 
motivou a opção por essas áreas?

Vem disso, mas também da sensibilidade de quem vive em Brasília e vê esses problemas muito de perto.

A qualidade da saúde está piorando?

É difícil dizer sem dados. Mas queremos saber qual a situação de fato. Vamos solicitar informações do governo. Com base nisso, precisamos alertar, sermos chatos e cobrar respostas.

Qual será o perfil da sua 
atuação como 
procurador-geral?

A minha perspectiva é do diálogo, de trabalhar em conjunto, mas até determinado limite. Tenho diálogo, relações institucionais positivas com os órgãos públicos, até porque os agentes públicos têm muitos interesses em comum. Muitas vezes, a falta de diálogo gera uma tensão ou uma ação desnecessária, mas também há um limite no diálogo. É isso que as pessoas precisam amadurecer e entender. 

Sua ideia então é não adotar uma postura de inimigo...
Sim. Não é guerra, é divergência. É agir com lealdade: ‘Olha, o Ministério Público, nesse ponto específico pensa deste modo. Não conseguimos avançar ou avançamos só 50%, então a gente vai para o Judiciário’. Ir para a Justiça, ao contrário do que muitos imaginam, não resolve as situações em todos os casos. O promotor pode até dizer: ‘Ah, entrei com a ação’, só que a realidade, quando você olha pela janela, é que não mudou coisa nenhuma. Quando iniciei na Promotoria do Consumidor, a gente tinha muitas ações. Em três anos, acho que era a promotoria que tinha mais ações no Brasil inteiro, foram mais de 200. Mas a realidade continuava igual. Então, peraí, vamos dar um passo atrás. Ação é uma alternativa de solução, mas não é a única.

O Ministério Público tem um trauma de um procurador-geral 
que se relacionou demais 
com o Executivo e acabou criando 
uma crise. Seria um 
exemplo a não ser seguido?

Existe uma cautela na classe. Muitos colegas falam para não dialogar tanto. Mas o diálogo institucional tem que existir. Exemplo: a Assessoria de Controle de Constitucionalidade. Editam-se normas em que o MP questiona a constitucionalidade. Então por que não fazer uma reunião com a Câmara e com o seu presidente e dizer: ‘Olha, esse tipo de norma, se for editada, vamos entrar com ação’? Por que não tentar prevenir, questionar e dizer que tantas normas, nos últimos anos, foram questionadas por vício de iniciativa? É uma tentativa de tirar isso do Judicário, de desocupar o Judiciário. A pior coisa nesse exemplo é uma norma que gera efeito e depois é declarada inconstitucional. Uma ideia para abrirmos mais o diálogo com o Legislativo é que vamos providenciar a criação de uma assessoria parlamentar com a presença de um promotor. Isso é novidade. Até agora era um servidor, mas agora será um promotor.

Acredita que os deputados distritais estão abertos a esse 
diálogo, que são sensíveis a esse tipo de apelo?
Acredito. Podem me chamar de ingênuo e de utópico, mas acredito. De verdade, não é da boca para fora. Acredito que dá para avançar.
Acha que uma assessoria parlamentar ajuda?
O Ministério Público aprendeu muito com a PEC 37 (que dava poder exclusivo aos delegados para investigar, derrotada no Congresso). Aprendeu que tem que estar próximo do parlamento e não apenas em uma situação extrema como essa. Tem que estar próximo para dialogar. O parlamento faz normas, o Ministério Público brasileiro atua nas mais diversas áreas. Um promotor pode oferecer subsídio a um projeto de lei. O contato não é apenas para dizer que isso ou aquilo é contra os nossos interesses institucionais ou dos membros do MP, é para estar presente, para mostrar que também há outra face. É uma postura colaborativa.

Como será a relação com o novo governador? 
Ele se considera 
fruto da Geração Brasília, 
senhor também. á afinidade que pode facilitar o contato?

Teremos um diálogo com limite e respeito à independência institucional. Mas o governador eleito trouxe uma ideia interessante, de ouvir o Ministério Público, de até mesmo perguntar o que o Minstério Público entende como prioridade em tal área. Já houve uma reunião com o procurador-geral interino e os técnicos da transição. Em uma segunda reunião, eu já estava presente. Estamos fazendo as coisas bem articuladas. Ele já deu um sinal bacana. Mas não somos amiguinhos. É diálogo institucional, responsável, cada um respeitando seu limite, defendendo a sua posição, com lealdade, transparência. 

São muitas demandas e poucos promotores. 
Como melhorar a atuação?

O promotor é preparado para trabalhar com o direito, tem uma visão dogmática. Hoje, os colegas têm percebido que existem conhecimentos adicionais necessários. Por exemplo: orçamento. O Ministério Público não é defensor da sociedade? Se queremos ter certeza de que os recursos chegam à ponta, precisamos conhecer o orçamento. Por isso, precisamos reestruturar os cargos em comissão, trazer gente boa da Câmara, fazer um núcleo de apoio às promotorias. 

Em relação à atuação do Gaeco (Grupo de Atuação 
de Combate ao Crime Organizado), algo muda?

Coloquei no plano de gestão a importância do Gaeco, do CI (Centro de Inteligência) e do NCAP (Núcleo de Investigação e Controle Externo de Atividade Policial). Com certeza, a intenção é melhorar a estrutura, mas isso não significa, necessariamente, colocar mais colegas. Mas, já em campanha, garanti: não vai mudar ninguém. As pessoas vão continuar lá. São áreas sensíveis. 

Como será a relação do 
Ministério Público 
com a Polícia Civil? 

 A gente não deve ter a ideia de que há um confronto. Ao contrário, ambos têm objetivos em comum. Então, não dá para criar esta ideia de que tem uma tensão. Houve, sim, uma discussão na PEC 37 em que eles queriam a exclusividade da investigação. O Ministério Público mostrou como isso é ruim para a sociedade. A própria sociedade considerou que a medida era péssima.

Sua gestão vai optar, 
então, pela conciliação?

Não em todos os pontos. Nas áreas de improbidade administrativa e criminais, não tem discussão. Não tem conciliação. Depois do fato consumado, não tem diálogo. Mas, no caso do consumidor, por exemplo, tem como voltar atrás e a empresa reparar o dano. O Ministério Público tem que atuar de forma autônoma, mas colaborativa. É preciso mostrar que, se adotar determinada política pública, o litígio diminui. Precisa, sim, aumentar o número de juízes e promotores, mas é necessário diminuir o litígio.

Existe alguma preocupação com relação 
à aproximação do órgão com a sociedade?

Muitas vezes, dizem que o Ministério Público é aberto à sociedade. Mas é difícil para muita gente procurar o órgão, ir ao prédio. É fundamental ampliar o canal de comunicação da sociedade com o Ministério Público. Ampliar o contato virtual. A ouvidoria foi criada para o cidadão reclamar do promotor e acabou se tornando a principal via do cidadão se comunicar com o Ministério Público. Na Promotoria do Direito do Consumidor, por exemplo, conseguimos ampliar o número de denúncias. E não foi porque o problema aumentou e, sim, porque facilitamos o acesso.

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