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#BRASÍLIA - URBANISMO » Menos verde, mais alagamento

Constantes cheias na Asa Norte são explicadas pela impermeabilização do solo, com a construção de prédios e vias asfaltadas. Região pode ser a primeira da área tombada de Brasília na lista de risco da Defesa Civil durante as chuvas

Por: Maryna Lacerda - Correio Braziliense
Publicação: 18/01/2015 

Maria Cassiano reconstrói o restaurante dela, na 510 Norte, alagado no temporal de 16 dezembro: temor de novos prejuízos a cada chuva forte (Marcelo Ferreira/CB/D.A Press


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Maria Cassiano reconstrói o restaurante dela, na 510 Norte, alagado no temporal de 16 dezembro: temor de novos prejuízos a cada chuva forte

“É só o céu escurecer para a gente se preocupar. Da janela, a gente vê as nuvens e sente um frio, um arrepio. É um caos anunciado”. Assim o morador do bloco F da 402 Norte Marcelo Arcinethe de Magalhães, 65 anos, define a expectativa para a retomada das chuvas no Distrito Federal, a partir desta semana, conforme previsão do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Basta uma precipitação mais intensa para os moradores da região temerem passar por situações como a de 16 de dezembro, em que quando blocos da quadra ficaram alagados e carros e prédios danificados. A Defesa Civil estuda a possibilidade de incluir as quadras 202, 402, 710, 510 e 310 Norte na lista de áreas de risco de Brasília. Caso isso aconteça, será a primeira vez que setores da área tombada entram para a relação. 

Para entender as causas dos alagamentos, o Correio percorreu o caminho das águas pluviais, na Asa Norte, sob orientação do subsecretário de operações da Defesa Civil do DF, coronel Sérgio Bezerra. Os alagamentos têm dois pontos iniciais e uma explicação em comum (veja quadro). A impermeabilização do solo, efeito da redução de áreas verdes no Plano Piloto, aumenta o fluxo de águas pluviais em direção à parte mais baixa da Asa Norte. Com a construção do Estádio Nacional Mané Garrincha e do Noroeste, esse fenômeno se intensifica, de acordo com Bezerra. “O sistema de drenagem, que já está obsoleto, não comporta a quantidade de água a ser escoada”, afirma. 

O problema é antigo. Nas contas da empresária Maria Cassiano, 57 anos, já se vão 22 anos de transtornos na 510 Norte. Dona de um restaurante no subsolo do bloco A, ela lida com dificuldades em circular pela quadra assim que a chuva começa. Há pouco mais de um mês, a cena que viu a deixou em choque. O investimento de duas décadas ficou totalmente submerso e Maria perdeu tudo. De produtos e equipamentos a revestimentos de parede. “A loja ficou dois dias e meio submersa. O Corpo de Bombeiros e a Defesa Civil tiveram que bombear a água, que ficou acima da porta. Depois que tiraram a água, entrei e vi o prejuízo. Encostava no revestimento e ele caía, porque o cimento tinha amolecido. Seis meses antes, eu tinha feito uma boa manutenção da parte elétrica”, lembra.

Depois do susto, a empresária só quer pensar em se reerguer e retomar as atividades. No início de fevereiro, ela pretende reinaugurar o restaurante. “Estou triste, sofrida. Aqui vivi a melhor parte da minha vida até agora. Ainda não coloquei os prejuízos na ponta do lápis para não sentir ainda mais. Estou tocando a obra e, mais para frente, vou contabilizar tudo”, comenta. A esperança na reabertura da loja não é a mesma quando pensa na solução definitiva do transtorno. “Entra governo, sai governo e nada muda”, critica. 
Projeto para solução da questão já existe, mas esbarra em questões burocráticas, segundo a Secretaria de Obras. A concorrência pública para criação do Programa Águas do DF, que pretende melhorar o sistema de drenagem pluvial do Plano Piloto e de Taguatinga, está paralisada desde fevereiro de 2013, por ordem do Tribunal de Contas do DF. A licitação está na fase de pré-qualificação das empresas candidatas e ainda não há prazo para avançar. A obra deve custar R$ 350 milhões. 

Pontos críticos
Estádio Nacional Mané Garrincha
 (Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

A origem do problema

Antes da construção da arena, o espaço onde ficavam as pistas de atletismo e o campo de terra eram pontos importantes de absorção da água que desce do Palácio do Buriti. Com o solo coberto pelo asfalto, a enxurrada escorre para a via paralela ao Colégio Militar e desemboca na W3 Norte. O projeto de urbanização do entorno previa obras de acessibilidade e paisagismo, mas, devido a irregularidades, o TJDFT suspendeu a licitação. 

Tromba d’água
 (Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Do estádio à W4 Norte não há uma boca-de-lobo. Em dias de chuva forte, forma-se uma tromba d’água. A força da correnteza ameaça a ciclovia lateral ao Colégio Militar, recém-construída. A base da pista, em brita, já foi levada, assim como a cobertura mais fina do solo. Agora, só resta a parcela mais dura da terra, e o concreto da ciclovia pode se partir em uma próxima precipitação.

102 e 402 Norte
Escoamento ineficiente
 (Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Só no cruzamento da W3 aparece o primeiro bueiro, incapaz de absorver grandes volumes de água. Na comercial da 102, há mais bocas-de-lobo, mas são antigas, com diâmetro reduzido. O acúmulo de lixo e detritos na rede pluvial colabora para o esgotamento do sistema de escoamento. A tesourinha da 102/202 é o primeiro ponto de alagamento.

Como uma bacia
 (Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Por causa do relevo, a 402 funciona como bacia e recebe a água que escoou da área do Palácio do Buriti. Os blocos G e H, da área residencial, são os mais prejudicados. As garagens dos dois prédios estão interditadas desde a chuva de 16 de dezembro. Ela deixou pelo menos 30 carros submersos, danos elétricos e estruturais.

Setor Noroeste

Assoreamento
 (Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Com as obras do setor, o terreno fica exposto e a parte mais fina da terra é carregada para a via principal. A lama se acumula em bocas-de-lobo, reduzindo a capacidade de escoamento da água. Duas bacias de contenção, no Parque Burle Marx, servem como depósito do volume pluvial que não escoa para a rede de drenagem, mas ambas sofrem assoreamento. 

Mato e lixo
 (Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

A primeira bacia, mais próxima ao bairro, é rasa, apesar de extensa. Por causa da quantidade de terra que desce nas chuvas, ela sofre assoreamento. A segunda bacia, perto da via do Setor Terminal Norte, é mais profunda e tem melhor sistema de controle do volume, mas sofre também com assoreamento e falta de manutenção. O resultado disso é o aparecimento de mato e lixo em seu interior.

510 / 710 Norte

Rio subterrâneo
 (Minervino Junior/CB/D.A Press - 17/12/14)

A correnteza desce do Noroeste, passa pelo Parque Burle Marx, pela Casa do Ceará e chega à W3, onde o asfalto impede a infiltração da água, que desembocaria nos subsolos das quadras. Em 16 de dezembro, comerciantes do bloco A da 510 Norte viram a água superar a porta dos estabelecimentos.

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