A Polícia Federal prendeu sete pessoas, das quais três são ex-deputados federais, e cumpriu 16 mandados de busca e apreensão
Nova fase da investigação aponta que o grupo criminoso do
doleiro Alberto Youssef agia além da Petrobras. Polícia Federal suspeita da
existência de propinoduto para alimentar campanhas eleitorais
A mais nova fase da Operação Lava-Jato, desencadeada na manhã
de ontem, apresentou, pela primeira vez, elementos consistentes de que a
organização criminosa montou um grande esquema de corrupção além dos limites da
Petrobras. Os investigadores descobriram, na 11ª fase, intitulada de A Origem,
que a quadrilha também fincou tentáculos no Ministério da Saúde e na Caixa
Econômica Federal, uma espécie de propinoduto com a participação de uma agência
de publicidade e empresas de fachada. A principal suspeita é de que os desvios
foram cometidos para alimentar campanhas eleitorais. Após prender os operadores
e os empreiteiros, em março e novembro do ano passado, agora, a Polícia Federal
colocou atrás das grades integrantes que perderam foro privilegiado do núcleo
político da quadrilha. Foram presos os ex-deputados André Vargas (SP), Luiz
Argôlo (BA) e Pedro Corrêa (PE), que já cumpria pena em regime semiaberto por
ter sido condenado no mensalão.
Além dos
ex-políticos, a Polícia Federal colocou na prisão Ricardo Hoffmann,
ex-vice-presidente da agência Borghi/Lowe em Brasília; Leon Vargas, irmão de
André Vargas; a secretária de Argôlo, Elia Santos da Hora; e um laranja de
Corrêa, Ivan Torres. Além dos sete mandados de prisão, a PF cumpriu nove de
condução coercitiva e 16 de busca e apreensão. Todos os presos foram encaminhados
ontem à noite para a sede da Polícia Federal em Curitiba, no Paraná.
Os
investigadores descobriram que a agência de publicidade Borgui/Lowe, que firmou
contratos com a Caixa e o Ministério da Saúde para o desenvolvimento de
campanhas institucionais, repassava 10% do valor recebido para duas empresas de
fachada controladas pelos irmãos Vargas. A LSI e a Limiar, uma consultoria e a
outra de serviços empresariais, não desenvolviam atividades. A LSI teve apenas
um funcionário entre 2011 e 2012 e a Limiar nunca possuiu um empregado sequer.
De acordo com o Portal da Transparência, do governo federal, a Borghi/Lowe
recebeu R$ 112,8 milhões da União desde 2011.
“A
quantidade de crimes nos quais André Vargas se envolveu é indicativa da
habitualidade e profissionalismo na prática de delitos, especificamente
corrupção e lavagem”, disse o juiz federal Sérgio Moro, à frente dos processos
da Lava-Jato, em seu despacho. Ele relatou que Vargas se envolveu em quatro
esquemas diversos de corrupção e lavagem de dinheiro em curto espaço de tempo.
André
Vargas teve o nome ligado à operação nas primeiras fases da Lava-Jato. Ele
viajou em um avião emprestado pelo doleiro Alberto Youssef, um dos principais
operadores do esquema. Vargas também teria feito tráfico de influência no Ministério
da Saúde para fechar parceria com o Labogen, um laboratório do doleiro. “Não
havia qualquer razão para inclusão da Labogen na parceria para produção do
medicamento, já que ela não tinha registro, jamais havia produzido, não tinha
capacidade técnica comprovada, não tinha linha de produção nem sequer tinha
autorização para funcionamento”, alertou Moro. O apartamento de Andé Vargas e
sua esposa, Edilaira Soares Gomes, no bairro de Alphaville, em Londrina, no
valor de R$ 980 mil, foi sequestrado pela Justiça Federal.
Troca de
mensagens
A parceria para produção de medicamentos foi
fechada entre 2013 e 2014. O Ministério da Saúde desfez o negócio
posteriormente. Na época, o então comandante da pasta, Alexandre Padilha,
admitiu que chegou a se reunir com André Vargas. Pressionado, Vargas renunciou
ao cargo de vice-presidente da Câmara e, no fim do ano passado, teve o mandato
cassado.
Luiz
Argôlo foi flagrado em várias interceptações telefônicas e troca de mensagens
com Alberto Youssef. De acordo com a investigação, o ex-parlamentar emitia
notas fiscais falsas para receber dinheiro em espécie das mãos do doleiro.
Argôlo teve o pedido de cassação aprovado pelo Conselho de Ética da Câmara, mas
a legislatura acabou antes que o processo fosse para o plenário da Casa. Ele
não conquistou mandato nas eleições do ano passado. Contra Pedro Corrêa, os
investigadores encontraram pedidos de dinheiro por escrito para Youssef
Repasses suspensos
O Ministério da Saúde comunicou, na tarde de ontem, a
imediata suspensão dos pagamentos à agência de publicidade Borghi/Lowe,
contratada em 2010. A pasta, por meio de nota oficial, assegurou que criou uma
comissão de sindicância administrativa para avaliar a regularidade da execução
do contrato com a empresa. Garantiu também que as informações dos contratos de
publicidade, do período em análise pela Polícia Federal, serão encaminhadas
para a Controladoria-Geral da União (CGU) e ficarão à disposição dos demais
órgãos de controle, como Tribunal de Contas da União e Ministério Público, para
auxiliar nas investigações.
A
Borghi/Lowe ressaltou apenas que “as autoridades estão buscando informações
quanto a um ex-funcionário”. A agência alegou que “cooperou ativamente
atendendo a ordem judicial e continuará a fazê-lo”.
O
advogado Marcus Gusmão, que defende André Vargas, disse que a defesa ainda
analisa os documentos que embasaram a prisão do ex-deputado. Por isso, eles não
vão se pronunciar até o momento, embora o escritório do advogado Michel Saliba
já tenha dito anteriormente que o então deputado não participou de crimes. O
Correio não conseguiu contactar familiares de Pedro Corrêa, mas apurou que seu
advogado ainda não obteve detalhes da operação. A reportagem nãoconseguiu falar
com o advogado de Luiz Argôlo, Aluísio Lundgren Régis.
A BR
Distribuidora, que tem contrato com a Borghi/Lowe, informou que a verba anual
estimada em R$ 80 milhões, dividida entre as duas agências vencedoras do
processo licitatório, inclui toda a parte de mídia (contratação dos espaços nos
veículos de comunicação) e também os custos de produção, cabendo às agências
uma remuneração variável em função do tipo de serviço. De acordo com a nota, o
percentual fica entre 0% e 15% dos serviços efetivamente contratados.
Fonte: João Valadares –
Eduardo Militão – Amanda Almeida – Correio Braziliense – 11/04/2015