Você pode imaginar um servidor jogar roedores em sessão da
Câmara dos Lordes, em Londres? Ou mesmo na Câmara dos Comuns? Ou, saindo do
universo da aristocracia, no Congresso americano, francês ou russo?
Possivelmente não. Até quinta-feira, era difícil conceber o episódio até no
parlamento brasileiro.
Mas
combinação indigesta encorajou Márcio Martins Oliveira a abrir uma caixa e
soltar cinco roedores. Os dois hamsters e três esquilos da mongólia caíram em
ambiente recoberto de simbologia. O espaço: CPI da Petrobras. O depoente: João
Vaccari Neto. O contexto: habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal
desobrigou o tesoureiro do PT de assinar termo de compromisso. Liberado, ele
poderia mentir sem ser preso para não produzir provas contra si.
Foi
constrangedora a cena que ganhou destaque na mídia mundial. Deputados e
funcionários correndo, subindo nas poltronas, soltavam gritinhos de medo. Ao
mesmo tempo, a Polícia Legislativa imobilizava o assessor da Segunda
Vice-Presidência da Câmara e o levava para prestar depoimento. Minutos depois,
o presidente Eduardo Cunha anunciava a demissão do comissionado.
O ato
desrespeitoso merece recriminação. Um dos poderes da República é esbofeteado
diante de câmeras e microfones. Algo está errado. Trata-se de longa história
que acumula fatos constrangedores: plenários vazios, folgas prolongadas,
projetos contrários ao interesse público, venda de votos, envolvimento em atos
de corrupção, conivência com malfeitos, acúmulo de privilégios e poucas
respostas satisfatórias.
Na
ocasião da soltura dos roedores, acrescentavam-se ingredientes explosivos.
Investigava-se esquema bilionário de pagamento de propinas feito pela mais
brasileira das empresas brasileiras cuja trajetória orgulhava gerações de
adultos e crianças. A Petrobras estima em até R$ 6 bilhões as perdas com o
assalto que a desmoralizou. O depoente era o tesoureiro do PT, partido acusado
de mentor e beneficiário da organização criminosa.
O
episódio deve ser pedagógico e servir de alerta para o Congresso Nacional. O
Legislativo, vale lembrar, é um dos tripés da democracia. Fragilizado,
fragiliza o regime de franquias e compromete a convivência harmônica dos Três
Poderes da República. É grave. Senadores e deputados precisam ler a lição dos
ratos.
Fonte: Visão do Correio Braziliense – 11/04/2015