A volta de José Dirceu ao regime fechado dá mostras da
extensão do esquema de corrupção vigente no país. Investigações da Operação
Lava-Jato, que apura estrutura criminosa de fraude e lavagem de dinheiro na
Petrobras, levaram ao ex-chefe da Casa Civil da Presidência da República.
Segundo sentença do juiz Sérgio Moro, que comanda os trabalhos em primeira
instância, o então ministro teria recebido propinas enquanto ocupava o cargo e
persistiu na prática depois de deixar o governo.
A razão
para os depósitos milionários seria pagamento de consultoria, eufemismo
corriqueiro para justificar enriquecimentos inexplicáveis. Houve, segundo
entendimento do magistrado, modus operandi similar no mensalão e no petrolão.
Um e outro, como frisou o procurador do caso, têm o mesmo DNA. São práticas
rotineiras de assalto ao erário que desmoralizam empresas e instituições.
Servidores ocupam cargos não para promover o bem comum ou servir ao público,
mas para servir-se do público — tirar proveito para si, para os familiares e
para os grupos que os apoiam.
Ninguém
ousaria afirmar que os malfeitos que perpassam a administração do Estado nos
diferentes níveis se restringem aos dois casos. Tudo indica que vão além, muito
além. Impõe-se aprofundar as investigações para juntar peças aptas a completar
o painel de cores degradantes que revela o quão disseminada está a corrupção no
país. É câncer com metástase. As consequências, além da autoestima do cidadão,
afetam o bem-estar dos brasileiros. Educação, saúde, segurança pagam a conta
que compromete o futuro. Trata-se de dívida que jamais será saldada.
Dirceu
foi condenado uma vez. Cumpriu pena em regime fechado e agora a completa em
casa. A prisão preventiva decretada ontem não tem relação com os malfeitos
anteriores. Medida cautelar da investigação, deve-se a fatos novos
decorrentes da Operação Lava-Jato. Recorrer à excepcionalidade depende de
decisão do magistrado, que tem nos autos pormenores nem sempre conhecidos do
público. Moro entendeu que a distância das grades dificulta as investigações. O
próprio Dirceu temia o retorno ao cárcere. Daí por que tentou habeas corpus
preventivo. Sem êxito.
Pela
primeira vez, o Brasil assiste à sanção dessa abrangência com personagens do
topo da pirâmide social. Desde sempre, prisão era o destino de pobres cujas
condições financeiras não lhes permitem pagar bons advogados. Os donos de
contas bancárias generosas contratam profissionais capazes de apelar para
recursos processuais que procrastinam indefinidamente a decisão final. A
certeza da impunidade é, sem dúvida, uma das razões mais poderosas para a
desenvoltura com que políticos assaltam os cofres públicos. Passou da hora de
pôr ponto na roubalheira. No século 21, nada soa mais extemporâneo.
Fonte: “Visão” Correio Braziliense – (Foto: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo)