“A política é a ocupação dos ociosos, a ciência dos
ignorantes, a riqueza dos pobres.”
(Eça de Queiroz)
A jovem
advogado e professor universitário, que me disse estar propenso a disputar
mandato eletivo em 2016, ou 2018, e me pediu que opinasse, respondi, segundo o
método socrático, com outras indagações. Perguntei: o amigo dispõe de muito
dinheiro, e está disposto a investi-lo em cabos eleitorais, cartazes,
santinhos, veículos, motoristas, combustível, aluguéis de salas, lanches,
pizzas, cerveja, refrigerantes?
Possui
tempo livre para dedicar à campanha? Terá paciência para consumir dias e dias
em conchavos com lideranças autoritárias, falsas e venais, até assumir cargo de
direção e integrar o controle da máquina? Prometerá coisas que, de antemão,
sabe não poder garantir e cumprir?
Qual é o
partido? O rol é numeroso: PMDB? PTB? PDT? PT? DEM? PCdoB? PSB? PSDB? PTC? PSC?
PMN? PRP? PPS? PV? PTdoB? PP? PSTU? PRTB? PHS? PSDC? PCO? PTN? PSL? PRB? PSol?
PR? PSD? PPL? PEN? Pros? SD?
São 32
legendas, quase todas desprovidas de representatividade, cujos donos se
alimentam dos recursos do Fundo Partidário, para dar esporádicos sinais de vida
nos horários eleitorais obrigatórios. Entre elas, não mais do que cinco ou seis
poderão ser consideradas, as demais são administradas como sociedades dedicadas
à realização de negócios.
Contará
com apoio de forte central sindical? De empresas e empresários? Para encurtar
conversa que já vai longe, separe alguns milhões de reais e os entregue a
marqueteiro, abandone o ensino e o escritório, esqueça-s de que é intelectual,
exercite a demagogia, conquiste a simpatia das massas e mergulhe no
desconhecido. Talvez se eleja e passe a conhecer o lado obscuro da vida pública.
Lembrei-me,
quando lhe escrevi, da frase de Eça de Queiroz que encabeça o artigo,
encontrada no livro Uma campanha alegre, publicado em 1871, onde também
advertiu que: “Quanto mais um homem prova a sua incapacidade, mais apto se
torna para governar”. Exemplos os temos, e às centenas.
O autor
de A Relíquia, O Primo Basílio, A cidade e as serras possuía visão pessimista
de Portugal, como se percebe em trecho que não resisto ao impulso de
transcrever: “O país perdeu a inteligência e a consciência moral. Os costumes
estão dissolvidos e os caracteres, corrompidos. A prática da vida tem por única
direção a conveniência. Não há princípio que não seja desmentido, nem
instituição que não seja escarnecida. Ninguém se respeita. Não existe nenhuma
solidariedade entre os cidadãos. Já se não crê na honestidade dos homens
públicos. A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na
inércia. O povo está na miséria. Os serviços públicos vão sendo abandonados a
uma rotina dormente. O desprezo pelas ideias aumenta a cada dia. Vivemos todos
ao acaso. Perfeita, absoluta indiferença de cima a baixo! Todo viver
espiritual, intelectual, parado. O tédio invadiu as almas. A mocidade
arrasta-se, envelhecida, das mesas das secretárias para as mesas dos cafés. A
ruína econômica cresce, cresce, cresce... O comércio definha. A indústria enfraquece.
O salário diminui. A renda diminui. O Estado é considerado na sua ação fiscal
como um ladrão e tratado como um inimigo”.
O libelo
de Eça de Queiroz deve servir de advertência. Já não há dia em que o cidadão
desperte para o trabalho sem tomar ciência de mais uma falcatrua de grosso
calibre, de operação policial à cata de corruptos, de bilhões de dinheiro
público desviados para contas ocultas no exterior. Empresários, executivos e,
sobretudo, políticos são recolhidos presos temporária ou preventivamente, para
aguardar julgamento. Não se mencionam milhões, dezenas ou centenas de milhões,
mas bilhões de reais.
Como
ocorreu com Portugal, a paralisia se apoderou do país. O Poder Executivo está
imobilizado. O ministério, desacreditado. O Poder Legislativo, dividido entre
Câmara dos Deputados e Senado, é palco constrangedor de disputas pessoais.
Manobras regimentais impedem o andamento dos trabalhos. Não se consegue aprovar
sequer o projeto de lei destinado a regulamentar a terceirização. Matérias de
alta indagação permanecem no limbo, enquanto senadores e deputados cuidam de
interesses pessoais.
Política
é a arte da conquista do poder pela persuasão, jamais pela violência. O caminho
do entendimento, entretanto, só se revela possível quando os partidos são
representativos, e os quadros dirigentes, escolhidos pelas bases, se comportam
como adultos, à altura das graves responsabilidades.
Por: Almir Pazzianotto Pinto - Advogado, ex-ministro do Trabalho e ex-presidente do TST - Fonte: Correio Braziliense