Os cães da raça labrador são treinados, em média, por dois anos, antes de serem entregues a um cego: fila de espera com mais de 300 pessoas.
Para manter o projeto que ajuda os deficientes visuais a se
tornarem autossuficientes, ONG lança campanha. Com doações pela internet, será
construída uma fabriqueta para produzir camisetas, canecas e bottons. A
realização do sonho custa R$ 30 mil
Eles são lindos, dóceis e amáveis, mas não brincam
em serviço. Agitados por natureza, os cães-guias desempenham com seriedade o
trabalho de ser os olhos de deficientes visuais. O Distrito Federal é pioneiro
no treinamento desses labradores com a finalidade de dar qualidade de vida aos
cegos. Apesar da disposição de colaboradores e voluntários, o Projeto Cão-Guia
de Cegos passa por problemas financeiros e, para garantir a continuidade do
trabalho, lançou uma campanha. Com a ajuda de doadores, pretende montar uma
pequena fábrica para produzir canecas, bottons, cartões e camisetas com a marca
registrada do cão-guia. Hoje, esses produtos existem e são uma das principais
fontes de renda da ONG. Mas a produção ocorre em pequena escala, com alto custo
e de forma terceirizada.
A concretização do sonho de ter a própria
fabriqueta nas dependências do Centro de Treinamento de Cães-Guias está
próxima. Depende, porém, da boa vontade da população brasiliense. Até 26 de
setembro, o projeto receberá doações — entre R$ 10 e R$ 5 mil — por meio de uma
plataforma na internet. Pelo site:
www.kickante.com.br/campanhas/fabriqueta-do-cao-guia, é possível colaborar e
ainda ser recompensado por isso. Entre as retribuições, o doador receberá
produtos com o selo de qualidade cão-guia, ilustrações de artistas de Brasília,
ensaio fotográfico pet e curso de obediência canina. Para transformar a sala,
que hoje serve de depósito, o projeto precisa arrecadar R$ 30 mil. O valor
engloba maquinário, mobiliário, suprimentos e a taxa cobrada pelo site.
“O projeto representa para o cego três coisas:
liberdade, segurança e independência”, conta Lúcia Campos, 61 anos,
coordenadora da iniciativa. A aposentada começou a atuar no Cão-Guia de Cegos
em 2001 e está à frente da coordenação desde 2011. Ela lembra a satisfação que
sente ao ver o sorriso de cegos que renovam as esperanças a ganhar um amigo
fiel. Ao todo, foram entregues 43 cães-guias para deficientes visuais de todo o
Brasil, mas o número é muito pequeno diante das nais de 300 pessoas que estão
na fila de espera.
Treinamento
Tudo começou quando a Associação Brasiliense de
Ações Humanitárias (ABA) firmou uma parceria com o Corpo de Bombeiros Militar
do Distrito Federal (CBMDF). “À época, três militares foram para o Canadá fazer
o curso de treinamento de cães-guias. Quando eles retornaram, já trouxeram
quatro cachorros para o Brasil”, explica Lúcia.
O curso de treinamento, que dura em média dois
anos, acabou por dar início ao projeto, que hoje cuida de 30 cães — entre
reprodutores, aposentados, machucados e em treinamento. Mesmo com a
disponibilidade de seis treinadores e 20 voluntários, os valores gastos para
manter o canil são grandiosos. Para se ter uma ideia, o treinamento de um
cão-guia dura cerca de três anos e custa, em média, R$ 30 mil. Até 2005, o
projeto recebia suporte do governo, mas, desde 2006, o auxílio deixou de ser
pago. “Costumo dizer que, desde então, a gente deixou de viver e passou a sobreviver”,
lamenta Lúcia. Sem dinheiro em caixa e dependendo de doações de voluntários e
patrocinadores, a ONG passou a terceirizar a confecção de produtos
personalizados para aumentar a arrecadação.
Justino Pereira Bastos, 43 anos, ficou cego há
cerca de 11. Ele vive com dois cães-guias: Claus e Zeus — ambos adquiridos por
meio do cadastro no Projeto Cão-Guia de Cegos. O primeiro, já aposentado,
chegou a Justino em 2006 e hoje tem 11 anos. O segundo, Zeus, está sob os
cuidados do transcritor braille desde novembro de 2014. Sem economizar elogios,
Justino demonstra gratidão pelos benefícios que vieram com os amigos. “Com
eles, eu ganhei mobilidade e inclusão. Quando as pessoas me veem com o cão,
elas param para conversar e fazem perguntas, coisa que não costuma acontecer
quando o deficiente está de bengala”, desabafa.
Para ele, a parceria dos labradores é fundamental
para diversos aspectos na vida de um deficiente visual. Por isso, auxiliar um
projeto como esses significa a emancipação de muitos cegos. “Os cães são
amigos. Temos um carinho muito grande um pelo outro, porque vivemos juntos 24
horas por dia.”
Como
participar - Deficiente
visual
O deficiente visual interessado em receber um
cão-guia pode mandar um e-mail para caoguiadf.cadastro@gmail.com. Ele
preencherá uma ficha com informações gerais e fará parte da lista de espera.
Quanto à seleção de beneficiados, o processo é feito por ordem de cadastro e
pelo perfil do animal treinado. Isso ocorre porque cada animal desenvolve um
perfil. “Se o cão que ficou pronto é ideal para alguém 100% cego, procuramos no
cadastro o primeiro inscrito que tenha tais características”, explica a
coordenadora do projeto, Lúcia Campos.
Família
hospedeira
Para quem deseja ajudar na criação dos animais, há
também a possibilidade de se tornar uma família hospedeira — voluntários que acolhem
os cães ainda filhotes e se responsabilizam pela socialização desses animais. A
partir dos 12 meses, o labrador deverá ser devolvido ao canil para iniciar o
treinamento voltado para o trabalho de guia. Atualmente, o projeto conta com a
colaboração de 10 famílias hospedeiras.
Voluntário
Se você quer doar tempo e trabalho para o cuidado
com o canil e com os bichos, pode se tornar um voluntário. Ele ajuda com os
cães que não estão em treinamento. Caminha, brinca e dá banho nos animais. Há
também os voluntários especialistas, como advogados e veterinários, que podem
oferecer ajuda em momentos de maior necessidade. Para participar, basta mandar
um e-mail para caoguia.voluntariado@gmail.com e se inscrever.
Fonte: Correio Braziliense – Fotos: Carlos
Vieira/CB/D.A.Press.