A segunda fase da ação cumpriu mandados em uma das unidades de saúde
mais famosas do Distrito Federal. Os investigadores também prenderam o dono, o
cirurgião plástico José Carlos Daher, por porte ilegal de arma
O esquema de fraudes em cirurgias articulado por
médicos e empresários de órteses e próteses revelado pela Operação Mister Hyde
teve novo revés com a deflagração da segunda fase da investigação. Entre os
alvos, está o cirurgião plástico José Carlos Daher e o Hospital Daher, no Lago
Sul. Na tarde de ontem, o médico acabou preso por porte ilegal de arma de uso
restrito, durante busca e apreensão na casa dele, na QL 8 do Lago Sul. Pela
manhã, 11 promotores e 20 policiais cumpriram sete mandados de condução
coercitiva e cinco de busca e apreensão. Documentos obtidos pelo Correio mostra
a negociação entre Daher e o empresário Johnny Wesley Gonçalves Martins, alvo
da primeira parte da operação. O esquema pode ter movimentado R$ 30 milhões
(leia Linha do tempo).
As investigações da Promotoria de Justiça Criminal
de Defesa dos Usuários de Serviços de Saúde (Pró-vida) apontam que Daher atuava
diretamente nos pagamentos que envolviam órteses e próteses. Em um e-mail ao
qual investigadores da Operação Mister Hyde tiveram acesso, o cirurgião
plástico notifica os funcionários sobre um “novo acordo”. A correspondência
eletrônica trocada em agosto de 2009 detalha a negociação. “Ele (Johnny Wesley)
quer operar 50% de seus casos no nosso hospital, o que corresponde a três
pacientes por mês”, escreveu Daher. O neurocirurgião Johny Wesley é sócio da TM
Medical, empresa de insumos médicos acusada de liderar a fraude. Ele está
preso.
Denúncias de destruição de provas e formatação de
computadores obrigaram o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios
(MPDFT) e a Polícia Civil a adiantarem a operação. O Conselho Administrativo de
Defesa Econômica (Cade) será acionado por haver a suspeita de formação de
cartel entre as fornecedoras dos materiais e o Hospital Daher. “As primeiras
escutas telefônicas já levantavam suspeitas contra o hospital. Um dos médicos
investigados na primeira fase havia dito que gostava de operar nesses dois
hospitais (Daher e Home) porque recebia dobrado”, explica Maurício Miranda,
promotor da Pró-vida.
Os médicos envolvidos, além dos honorários,
recebiam das unidades de saúde de 3,5% a 7% e mais quase 30% da distribuidora
dos materiais. Mais de 100 pacientes teriam passado por procedimentos
desnecessários ou com material vencido ou de baixa qualidade somente em 2016,
segundo o MPDFT. Ontem, um consultório usado como sala de cirurgia clandestina
foi interditado no anexo do Daher. A diferença entre o Home (alvo na primeira
fase) e o Daher é que, no primeiro, quem atuava eram os funcionários. No
segundo, notamos uma participação forte do dono no gerenciamento das transações
ilegais”, acusou Maurício.
Em correspondência obtida pelo Correio, Daher
orienta os funcionários a não receberem “em hipótese nenhuma” pacientes que
chegassem para atendimento com ordem judicial vindos de processos da Secretaria
de Saúde. Ele reclama de o hospital não ser pago por esse tipo de internação.
“Em nenhuma hipótese, devemos internar qualquer mandado. Os leitos vazios devem
permanecer desativados. Os aparelhos devem ser guardados e deve-se criar uma
placa a ser pendurada: ‘Leito em manutenção’”, destaca trecho do texto enviado
por Daher, em fevereiro de 2011. “Jamais internar mandado. Haja o que houver”,
frisa.
Cinco funcionários do Hospital Daher prestaram
depoimento coercitivamente: Maria de Lourdes da Silva Pinto; superintendente da
unidade médica; Wirliane Pires da Silva, chefe do Departamento Financeiro; José
Wilson do Bonfim Lopes, médico responsável técnico do Daher; Patrícia Bezerra
Mendes, também do Departamento Financeiro; e Marco Aurélio Silva Costa, diretor
comercial. Ana Maria Monteiro Machado, ex-funcionária, não foi encontrada na
operação desta quinta.
Outros suspeitos
Na capital federal, segundo o titular da Delegacia
de Combate ao Crime Organizado (Deco), Luiz Henrique Sampaio, o preço de
órteses e próteses é de 800% a 1.000% maior do que no restante do país. “A
concorrência era entre três empresas. Uma entrava para ganhar e outras duas
sabendo que perderiam”, detalha. Participam do esquema mais unidades de saúde,
empresas e médicos, mas, para não atrapalhar as investigações, a Polícia Civil
e o MPDFT não divulgaram nomes. “Outros hospitais vão ser alvos de
investigação”, adianta o Miranda.
A Polícia Civil chegou ao Hospital Daher após
analisar trocas de e-mails e extratos de pagamento entre a MT Medical e a
unidade médica. O MPDFT suspeita que a deflagração da Mister Hyde, em 1º
setembro, não coibiu a prática irregular, e médicos continuaram a realizar os
procedimentos desnecessários. “Estamos trabalhando para comprovar se houve
cirurgias neste período”, adiantou o promotor.
Em nota, o Hospital Daher negou envolvimento no
esquema e garantiu colaborar com as investigações. “Não fomos avisados ou
comunicados do teor da visita e estamos colaborando ativamente com as
solicitações realizadas”, detalha o texto. A Secretaria de Saúde não comentou o
caso.
Perfil - Mago do nariz e da face
Discípulo do cirurgião Ivo Pitanguy, o médico José Carlos Daher, 71
anos, ficou conhecido pelos procedimentos na face, sobretudo as rinoplastias.
Formado pela extinta Faculdade de Medicina da Universidade do Brasil, atual
Universidade Federal do Rio de Janeiro, ele criou e chefiou o Serviço de
Cirurgia Plástica do Hospital das Forças Armadas entre 1972 e 1982. Em 1979,
ele fundou o Hospital Daher, no Lago Sul, e, desde então, passou a liderar o
ramo na capital federal. Desde 2012, Daher era presidente do Sindicato
Brasiliense de Hospitais, Casas de Saúde e Clínicas (SBH). Deixou o cargo há
dois meses. O médico é membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia
Plástica e publicou diversos trabalhos no Brasil e no exterior sobre cirurgia
plástica.
Linha do tempo - 2016
Março
As apurações começam após uma paciente denunciar
que, ao fazer uma cirurgia na coluna, um arame de 50 cm foi deixado na jugular
dela.
1º de setembro
A Operação Mister Hyde da Polícia Civil é resultado
de investigação iniciada em parceria com o MP. Doze pessoas são presas na
primeira fase. Entre os detidos, há sete médicos e cinco empresários e
funcionários de hospitais. Também são cumpridos 22 mandados de busca e
apreensão e quatro conduções coercitivas. A apuração evidencia casos em que
cirurgias eram sabotadas pelos médicos para que o paciente necessitasse de
novos procedimentos, o que geraria lucro para o esquema.
2 de setembro
Quinze pacientes se apresentam como mais vítimas do
mesmo grupo. As buscas continuam no Hospital Home (613 Sul). A Polícia Civil
recolhe, no fim da tarde, documentos e computadores para complementar as
investigações. À noite, cinco dos sete médicos envolvidos no esquema da máfia
das próteses no DF ganham a liberdade provisória.
6 de setembro
O superfaturamento de equipamentos, a
realização de cirurgias sem necessidade e o uso de produtos
vencidos são confirmados em escutas telefônicas.
9 de setembro
As investigações sobre a Máfia das Próteses
chegam aos planos de saúde. Um dos focos será descobrir como ocorreram as
irregularidades dentro das operadoras, inclusive com a suspeita de
participação de funcionários das empresas. Esses grupos podem ter pagado,
por cirurgias, até três vezes mais do que os valores de mercado.
21 de setembro
O MP encaminha à 2ª Vara Criminal de
Brasília a primeira denúncia contra os envolvidos.
23 de setembro
O Juiz da 2ª Vara Criminal de Brasília aceita
denúncia contra 17 acusados.
Fonte: Otávio Augusto – Fotos: Ed
Alves/CB/D.A.Press – Antonio Cunha/CB/D.A.Press – Correio Braziliense
Bom dia! Chiquinho Dornas, pasdei por um procedimento com um desses bandidos em 01/03/2016, e até hoje sofro as consequências, desde a ocorrência Polícial venho aguardando para depor. O descaso sobrepassa essas esferas alcança todo o judiciário com sua impunidade e morosidade legal. Isso de fato beneficia grupos criminos como esses!
ResponderExcluirLeonardoadm85@gmail.com