A morte, ontem, da ex-primeira
dama Marisa Letícia representa dor incomensurável para o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva. Mesmo sabendo que, agora, ele está viúvo pela segunda
vez, foi Marisa quem acompanhou toda a trajetória política do maior nome da
história do PT. Os dois se casaram em 1974, um ano antes de Lula se tornar presidente
do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo. Ele foi eleito em 1975
e, quatro anos depois, despontou como liderança nacional ao comandar a greve da
categoria em pleno regime militar.
Em 1980, Lula, ao lado de alguns sindicalistas, militantes de esquerda e
intelectuais, funda o PT e inicia a trajetória que o levará, 22 anos depois, ao
Palácio do Planalto. Oito anos de gestão, acompanhados de perto por Marisa. Não
foram poucas as críticas, aqui ou acolá, pela primeira-dama estar presente em
todos os eventos — ou quase todos — do marido. Até mesmo na videoconferência
com os jogadores da seleção brasileira, preparando-se para a Copa de 2006, lá
estava ela ao lado do marido presidente, de bolsinha a tiracolo.
Agora, Marisa se foi. E Lula? Misturar a morte com política é algo
cruel, mas inevitável. Dona Marisa, como era conhecida, ainda era uma das
poucas vozes que resistia à pressão da militância petista para que Lula fosse
candidato ao Planalto em 2018. Lula levava muito em conta essa posição, pois
sabia que uma candidatura dele tornaria a família ainda mais exposta às
investigações da Operação Lava-Jato.
Lula sabia do risco dessa exposição. Ele sempre disse que temia a prisão
dos familiares, nem tanto a dele próprio. Agora perde as amarras de vez. O PT
vai lançá-lo candidato ao Planalto no Congresso do partido, marcado para junho.
Aliados e adversários apostam que, neste momento, o petista pode ganhar uma
sobrevida em relação às investigações. Mas não por muito tempo.
Lula pode aparecer na delação da Odebrecht. Livrou-se do processo do
tríplex, mas ainda pesa sobre ele o sítio de Atibaia. Não se sabe o que pode
vir das delações de Eike Batista, embora Lula sempre tenha desconfiado do
empresário falastrão. Os dois se aproximaram mais via Sérgio Cabral, quando o
Rio de Janeiro conquistou o direito de sediar os Jogos Olímpicos em 2016.
São muitas balas viradas para o mesmo alvo. Algo deve acertar Lula. Se
ele não for preso, ou condenado em segunda instância, será candidato ano que
vem. Deve passar do primeiro turno, pela gordura da militância petista. Mas
dificilmente se elege, pois não tem mais o respaldo da bandeira ética e da
esperança de mudança que o elegeu em 2002. O presidente que encerrou o mandato
com 87% de popularidade pode perder a eleição para um ilustre Zé Ninguém. Mas,
agora, depois de ontem, o que Lula tem a perder?
Por Paulo
de Tarso Lyra – Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog - Google