Há 60 anos, um avião da Pan American inaugurava
oficialmente o aeroporto de Brasília, com um voo comercial para Nova York .
Desde então muita coisa mudou naquele que hoje é o principal hub nacional
*Por Renato Alves
À 1h de 2 de maio de 1957, o Viscount
presidencial pousou, trazendo Juscelino Kubitschek e sua comitiva. Era o
primeiro pouso noturno do aeroporto de Brasília. O grupo vinha para a primeira
missa da nova capital e a inauguração oficial do terminal aéreo, no dia
seguinte, quando um avião da Pan American faria um voo comercial para Nova York
(EUA). Compunham o aeródromo uma pista de terra batida com 2,4m de extensão,
margeada por uma construção de madeira, que abrigava menos de 200 pessoas. Ela
ficava onde hoje está o recém-desativado Terminal 2 e tinha um restaurante, mas
nenhuma climatização, nem esteiras de bagagem. Também não havia hangar.
Aeronaves permaneciam ao relento, assim como quem embarcava e desembarcava. Em
1958, no primeiro ano com os 12 meses de operação seguidos, o aeroporto recebeu
pouco mais de 2 mil passageiros.
Passados 60 anos, o cenário é bem
diferente. Terceiro mais movimentado do Brasil, o Aeroporto Internacional
Juscelino Kubitschek concentra o maior número de conexões do país. Chega a
receber 20 milhões de passageiros por ano. Para abrigá-los, um gigantesco e
moderno terminal, com o corpo central e o satélite construídos em 1971, e dois
píeres, inaugurados em 2014. Único da América do Sul a operar pistas paralelas
simultâneas independentes, conta com duas pistas por onde pousam e decolam 440
aviões diariamente — cada um tem 3,3 mil m de comprimento. A administradora, o
consórcio Inframerica, emprega 800 pessoas. Outros 11,2 mil trabalham nos
guichês e nas salas das companhias aéreas, além de empresas que prestam
serviços a elas e nas mais de 100 lojas e quiosques do terminal.
Francisco trabalha no aeródromo desde 1979: ele se
casou com uma ex-atendente do local
Folhas
de buriti
Em 1956, na primeira vez que JK pousou no Planalto Central, quando a
construção da nova capital ainda era um projeto, seu avião desceu no aeroporto
Vera Cruz. Localizado onde seria a Rodoferroviária, o terminal aéreo tinha uma
pista de 2,7 mil m de comprimento em terra batida e um barracão de pau a pique
coberto com folhas de buriti, que servia de abrigo aos passageiros e
tripulantes. Brasília só foi inaugurada em 21 de abril de 1960, mas a cidade
precisava de um aeroporto antes, para facilitar o acesso às obras da nova
capital. Os serviços para construir o aeroporto definitivo começaram em 6 de
novembro de 1956. A pista foi projetada com 3,3 mil m de extensão, mas a
primeira etapa compreendia só 2,4 mil m.
O acanhado terminal de madeira atendeu os passageiros até 1971, quando
instalações bem mais modernas entraram em operação. Piauiense, Francisco Costa
Amorim mudou-se para Brasília, sete anos depois, chamado por um irmão.
“Funcionário da Infraero, ele me arrumou um trabalho como segurança na
empresa”, conta Chico, como é mais conhecido. Permaneceu nesta função, no
aeroporto, até 1985. No terminal, conheceu uma mulher com que teve uma filha,
mas não se casou. Chico também fez muitas amizades no aeroporto, que lhe
garantiram trabalho. “Depois da Infraero, trabalhei para a Sata. O aeroporto
tinha três rampas de embarque e desembarque. Eu ficava na da Varig”, lembra. Em
seguida, conseguiu uma vaga em uma agência de turismo. A loja fechou. Desde
então, ele trabalha como autônomo, atendendo clientes de diversas agências.
“Resolvo problemas no embarque. A minha vida é dizer boa viagem”, brinca ele,
aos 62 anos, casado com uma ex-atendente do aeroporto, com quem teve dois
filhos.
Avião de gado
Outro piauiense, Marcos Trindade também tem uma vida atrelada ao
aeroporto candango. Ele veio para Brasília com os pais em 1974, quando tinha 14
anos. Aos 19, começou a trabalhar no terminal de cargas do aeródromo. “Naquela
época, os carros que mais víamos no aeroporto eram as Veraneios do Congresso
Nacional, trazendo parlamentares e os parentes deles. A gente ficava de olho,
pois, após os motoristas os deixarem eles nos davam carona até a Rodoviária do
Plano Piloto”, conta o hoje gerente de logística do aeroporto. Enquanto as Veraneios
dominavam o estacionamento externo, bois da raça Jersey ocupavam os aviões de
carga que pousavam em Brasília. “Nos anos 1970, os empresários da cidade
investiram pesado nessa raça de gado. Toda semana tínhamos uma aeronave lotada
dela para descarregar”, lembra Marcos. Assim como o conterrâneo Chico, ele se
casou com uma mulher que trabalhava no aeroporto. Ela deixou a TAM e montou uma
agência de turismo. O casal tem dois filhos e uma neta.
O goianiense Caio Cunha trabalha no aeroporto há 28 anos. Começou na
área comercial da Infraero. Com a privatização, em 2012, abriu mão da
estabilidade no serviço público. Tornou-se gerente comercial. “A grande
diferença entre uma administração e outra é que, antes, o foco era operacional,
embarcar e desembarcar o passageiro, e pronto. Só que a demanda do aeroporto
cresceu demais e não havia mais conforto”, observa. No aeródromo desde o fim do
anos 1980, ele lembra da falta de preocupação com a segurança. “Os passageiros
ficavam perto das aeronaves. Tinha até quem fumava na pista. Não havia esquema
para evitar atos de terrorismo.” Caio também se recorda da ponte-aérea. “O
passageiro chegava e comprava a passagem para o Rio de Janeiro e a usava em
qualquer companhia. Todas tinham o mesmo preço. Só havia Vasp, Varig e
Transbrasil”, explica. A falência das empresas e as promoções, especialmente em
compras feitas pela internet, acabaram com esse serviço.
Passageiros aguardam voo no restaurante do terminal
de madeira
Comissárias da extinta Real Aerovias esperam chegada
de aeronave
Linha do tempo
1956
Para receber a comitiva para construção
da Nova Capital Federal, foi feito um aeroporto provisório chamado Vera Cruz.
Localizado no mesmo local onde posteriormente seria a Rodoferroviária, o
terminal aéreo tinha uma pista de 2,7 mil metros de comprimento em terra batida
e terminal de passageiros de pau a pique coberto com folhas de buriti.
1957
7 de janeiro – Pista provisória do
aeroporto definitivo recebe avião com engenheiros da Novacap.
28 de janeiro – Definidas as primeiras
empresas aéreas a operarem no novo aeroporto: Loide Aéreo Nacional, Real
Aerovias, Vasp e Cruzeiro do Sul.
30 de abril – Entrega da pista
definitiva, hoje conhecida como 11L29R. Foi também a data de início da operação
da Real-Aerovias, primeira companhia aérea a ter voo regular do aeroporto de
Brasília.
3 de maio – Inauguração oficial do
aeroporto com o 1º voo comercial da Pan American para Nova York. No mesmo dia é
celebrada a primeira missa de Brasília, na Praça do Cruzeiro.
1958
31 de maio – Movimentação dos três
primeiros meses: 268 pousos e decolagens, sendo 2.799 desembarques e 2.574
embarques. Seis companhias aéreas com voos regulares: Loide Aéreo Nacional,
Real-Aerovias, Paraense, Sadia, Vasp e Cruzeiro do Sul.
1959
Movimentação do ano: 6.741 pousos e
6.738 decolagens.
1971
O terminal de passageiros de madeira é
desativado e é construído o novo terminal onde hoje ele está localizado.
1994
Aeroporto ganha corpo central e
satélite, nove pontes de embarque, 30 balcões de check-in, três esteiras de
bagagem e um sistema de comunicações totalmente informatizado, tornando-se o
primeiro aeroporto inteligente da América Latina.
1999
O aeródromo é batizado com seu nome
oficial: Aeroporto Internacional de Brasília Presidente Juscelino Kubitschek.
2005
22 de dezembro – Inauguração da segunda
pista de pousos e decolagens.
2012
1º de dezembro – Inframerica assume a
concessão do aeroporto sob supervisão da Infraero. Começam as obras de
ampliação previstas em contrato de concessão.
2014
31 de março – Inauguração da Sala VIP
doméstica e primeira operação da AirFrance.
7 de agosto – Brasília é o segundo
maior aeroporto em movimentação do país.
18 de novembro – Ampliação da
capacidade de pista para 52 aeronaves por hora, tornando o aeroporto de
Brasília o com a maior capacidade de pista do país.
2015
5 de janeiro – Recorde de movimentação
histórica: 65 mil passageiros em um dia.
Março – Aeronáutica aumenta a
capacidade de pista do aeroporto de Brasília para 60 voos por hora,
consolidando-se como terminal aéreo com a maior capacidade de pista do país.
Julho de 2015 – Aeronáutica começa a
realizar operação paralela simultânea independente. O aeroporto de Brasília é o
primeiro da América do Sul a operar de tal forma.
2017
30 de março – Desativação do Terminal 2
e transferência das operações da Azul para o Terminal 1.
Na terra e no ar - Confira os
números registrados pelo Aeroporto Internacional de Brasília em 2016:
.Funcionários: 12 mil
· Pousos e decolagens: 440/dia
· Passageiros: 49 mil/dia
(*) Renato Alves – Fotos: Carlos
Vieira/CB/D.A.Press – Arquivo – Correio Braziliense