Segundo
delação, Tadeu Filippelli recebeu dinheiro ilícito de empreiteira - Delação de ex-executivo da Andrade Gutierrez revela
repasses supostamente irregulares para empresas indicadas pelo
ex-vice-governador Tadeu Filippelli. Uma delas foi responsável pela licitação
de 2011, questionada pelo MP
*Por Ana Viriato
Dois episódios relativos ao transporte público
urbano, com supostas irregularidades, se cruzam na trajetória da última gestão
do Distrito Federal encabeçada pelo ex-governador Agnelo Queiroz (PT) e pelo
ex-vice-governador Tadeu Filippelli (PMDB). O acordo de leniência — uma espécie
de delação premiada das empresas — da Andrade Gutierrez apresenta elementos que
conectam as fraudes do BRT Sul à consultora Logit, integrante do consórcio
responsável pela condução do processo licitatório de 2011 que dividiu a prestação
do serviço rodoviário de Brasília em cinco bacias. As empresas Marechal,
Piracicabana, Pioneira, Expresso São José e Urbi venceram o certame.
Terminal do BRT Sul: consultora
indicada por Filippelli aparece na elaboração dos sistemas expresso e básico do
DF
De acordo com o depoimento do ex-diretor da Andrade
Gutierrez Rodrigo Ferreira Lopes, em meio às negociações do sistema de
transporte expresso, a empreiteira firmou contrato simulado, no valor de R$ 900
mil, com a consultora Logit, a pedido de Filippelli — o acordo serviria para
ocultar a verdadeira destinação do montante, ainda em investigação do
Ministério Público Federal (MPF).
Sob a justificativa do recebimento de consultorias
em engenharia de tráfego e mobilidade urbana, a Andrade Gutierrez realizou o
repasse por meio de três boletos de R$ 300 mil, cada. Dois deles mencionam
estudos relativos ao “Arco do Tietê, em São Paulo”. A empresa, inclusive, é
paulista e fica no bairro de Pinheiros. Firmado em 21 de outubro de 2013, o
contrato é assinado pelo delator Rodrigo Ferreira e pelo sócio-proprietário da
Logit Wagner Colombini Martins.
Segundo o ex-executivo da Andrade Gutierrez, os
contratos simulados eram um dos formatos pelos quais Filippelli recebia propina
da empreiteira — os valores indevidos ainda seriam remetidos por meio de
doações oficiais ou em espécie. A construtora também firmou acordo com a AB
Produções — Canto do cerrado filmes, por R$ 1,6 milhão, indicada pelo
ex-vice-governador.
Honorários
A participação da Logit era frequente na gestão de
Agnelo Queiroz e Tadeu Filippelli. A empresa, assim como a Logitrans, integrou
o consórcio responsável pela consultoria necessária à elaboração da licitação
do novo sistema de transporte rodoviário. Após a escolha das cinco
concessionárias, o certame chegou a ser anulado pela 1ª Vara da Fazenda Pública
em razão de indícios de irregularidades. Mas, posteriormente, derrubou-se a
decisão.
Era responsabilidade do consórcio Logit/Logitrans a
definição dos termos da política tarifária e de integração do transporte; da
estrutura financeira e operacional; além dos aspectos jurídicos e
institucionais para a gestão, regulamentação e fiscalização do programa; entre
outros. À frente do projeto, estava o advogado Sacha Reck, consultor jurídico
do quadro técnico do consórcio. A Logitrans tinha, entre os sócios, o pai de
Sacha, Garrone Reck, e o irmão, Alexis Reck. A Logit era de propriedade de
Wagner Colombini Martins, o mesmo sócio que assinou o contrato entre a empresa
e a Andrade Gutierrez, anos depois, no BRT Sul.
O problema era que, à época, Sacha, supostamente,
também defendia os interesses da Viação Marechal, empresa para qual havia
prestado serviços de advocacia. Além disso, fazia parte do Comissão Permanente
de Licitação de Brasília. O Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT)
acredita que o advogado tenha, assim, ajustado o projeto básico da licitação
com base nas necessidades da Marechal.
Na denúncia, o MPDFT detalha que, durante o
cumprimento dos mandados de busca e apreensão, foram encontrados comprovantes
de pagamentos de honorários advocatícios feitos pela Marechal ao escritório de
Sacha. Além disso, o órgão especíifica que, na fase de habilitação, a
concessionária teria apresentado documentos em desconformidade com o edital,
como documento inidôneo fiscal, atestado de capacidade técnica viciado, balanço
patrimonial e demonstração de resultados inidôneos. Ainda assim, a empresa
“contou com a ajuda de Sacha, integrante da comissão de licitação, para
corrigir os erros”, destaca a petição.
Sacha Reck:
atuação sob suspeita na licitação do transporte do DF
Operação Riquixá
Alvo de 13 ações judiciais na Justiça local e de
dois processos no Tribunal de Contas do DF, Reck garantiu aos promotores no
Paraná, na Operação Riquixá, que cometeu vários “erros” em sua carreira, mas em
Brasília foi diferente (leia Memória). A alegação está descrita em delação
premiada, na qual o advogado admite irregularidades em dezenas de estados, como
Paraná, Santa Catarina e São Paulo. “Eu não sou mentiroso. É porque lá (no DF)
estão caçando um crime que não foi cometido”, afirmou no depoimento prestado
aos promotores Vitor Hugo Nicastro Honesko e Leandra Flores, que atuam em
Guarapuava (PR). As informações foram prestadas em 13 de julho de 2016.
A Justiça levantou o sigilo da delação depois que o
Ministério Público do Paraná apresentou, em março deste ano, denúncia contra o
advogado, na qual o aponta como integrante de uma organização criminosa que
atuava em vários municípios para fraudar licitações de transporte
Segundo as investigações, Reck agia desde a
formulação do edital direcionado até o julgamento das propostas apresentadas
pelas concorrentes, garantindo a contratação da empresa que pagava pelos
serviços do seu escritório. As acusações foram confirmadas pelo próprio
advogado.
A reportagem não conseguiu contato com a defesa de
Tadeu Filippelli. O Correio ligou para o advogado do ex-vice-governador,
Alexandre Queiroz, entre as 8h e as 22h de ontem. No entanto, não obteve
resposta. Mensagens via WhatsApp foram enviadas ao longo do dia, mas a defesa
do peemedebista não retornou até o fechamento desta edição. A reportagem também
não conseguiu contato com o advogado Sacha Reck.
Memória - Alvo de uma CPI
Em 2015, a CPI do Transporte indiciou o advogado
Sacha Reck, o empresário Wagner Colombini Martins, sócio-diretor da empresa
Logit, e outras 15 pessoas pelas irregularidades identificadas no processo
licitatório relativo à prestação do serviço básico rodoviário, que dividiu o
Distrito Federal em cinco bacias. A investigação da comissão começou após o
Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) pedir à Justiça a
suspensão dos contratos com as empresas de ônibus vencedoras do certame. Entre
outras medidas, o relatório final recomendou que o MPDFT ajuizasse ações de
improbidade administrativa. A votação terminou em três votos favoráveis e dois
contrários à aprovação do parecer.
(*) Ana
Viriato – Fotos: Breno Fortes/CB/D.A.Press – Antonio Cunha/CB/D.A.Press – André
Violatti/CB/D.A.Press – Correio Braziliense