Área de proteção do Rio Descoberto vem sofrendo também com o excesso de
perfurações subterrâneas, muitas clandestinas, em busca de água, o que agrava
ainda mais o abastecimento no Distrito Federal
*Por Flávia Maia
Poço irregular flagrado pela PM na Bacia do Rio Descoberto em outubro de
2017: fiscalização ainda é deficitária
As perfurações subterrâneas — como poços tubulares
e cisternas — na área de proteção do Rio Descoberto vêm contribuindo com a
queda da vazão do reservatório. À retirada das águas profundas soma-se a falta
de chuva e a demanda de uso da água além da capacidade da bacia. Todos esses
elementos estão gerando um estresse hídrico responsável pelos sucessivos
recordes históricos de diminuição do volume do espelho d’água e uma escassez no
abastecimento jamais vista no Distrito Federal — com possibilidade de dois dias
de racionamento durante a semana.
Segundo especialistas, perfurações não planejadas
podem prejudicar o ciclo hidrológico por anos e contribuir para a diminuição da
quantidade de água nos rios, que são reabastecidos por lençóis freáticos. “Se
eu tiro a água subterrânea, isso não vai refletir dias depois, são meses e
anos. Assim, se a crise hídrica fosse resolver com as próximas chuvas, os poços
não seriam tão preocupantes. A crise deste ano pode ser resultado do que foi
retirado no ano passado”, explica Sérgio Koide, professor da Universidade de
Brasília (UnB).
Existe uma dificuldade do poder público em
controlar as águas abaixo do solo, porque o início da fiscalização é recente.
Segundo informações da Agência Reguladora de Águas do Distrito Federal (Adasa),
900 outorgas foram liberadas para a perfuração e uso de poços na Bacia do
Descoberto. Entretanto, existem 1,5 mil poços cadastrados na região e estima-se
a existência de 1,8 mil unidades perfuradas. O que significa que metade dos
poços não tem autorização para retirada de água, embora a própria agência
reconheça que eles existam e estejam em operação. Além disso, pelo menos 300
poços são clandestinos. Somente este ano, a Polícia Militar do Distrito Federal
encontrou e lacrou três poços irregulares. A pena para quem comete essa infração
é detenção de seis meses a um ano e multa.
O coordenador de fiscalização da Adasa, Hudson
Rocha de Oliveira, explica que a maioria dos poços foram perfurados antes da
existência da instituição — a reestruturação da forma como funciona hoje é de
2008. Ele comenta que há três anos a agência vem fazendo um trabalho de
reconhecimento da região para mapear os poços. “Desde 2015, nós estamos
cadastrando esses poços porque a Adasa precisa ter o controle da água
subterrânea que alimenta os nossos rios e nascentes”. Segundo Hudson, a
quantidade de multas triplicou nos últimos anos. Ele explica que o aumento de
multas não significa mais poços clandestinos, mas o acréscimo deve-se ao fato
de que, primeiro a agência focou na conscientização e advertências antes da
penalidade máxima.
Autorização
Entretanto, uma barreira regulatória está travando
a legalização dos poços na região. Embora a Adasa tenha convocado os donos de
poços para regularizarem a situação, uma resolução do fim de 2016 da própria
agência proibiu a concessão de mais outorgas. Essa situação peculiar faz com
que os poços continuem operando, com cadastro no órgão regulador, mas sem a
autorização formal, que é a outorga. “A fiscalização notifica para regularizar,
os usuários se cadastram. Eles não estão irregulares, só não têm o papel de
outorga. Eles continuam em operação, mas nós, como órgão regulador, temos uma
estimativa de quanto eles estão tirando. Os poços clandestinos nos preocupa
mais”, afirma Hudson.
Para o pesquisador da Embrapa Cerrados e presidente
do Comitê da Bacia do Paranoá, Jorge Werneck, a situação é delicada. “Em tempos
de crise hídrica, as decisões não são fáceis. Oficializar algo em um período de
restrição pode trazer muitos percalços. Tem que estudar quem pediu a outorga,
ver o uso e encontrar um caminho para regularizar a situação”.
Hidrômetros
O professor da UnB Sérgio Koide defende que é
preciso regularizar a situação; “Como a gente pode gerenciar se a gente não
conhece?”, questiona. Para Koide, a Adasa poderia fazer um monitoramento via
drone. “Pelas imagens será possível quantificar os poços, cruzar as coordenadas
e ver quais são os regulares e se estão usando a quantidade de água permitida”.
O especialista defende ainda que os poços tenham hidrômetros como os existentes
nas casas para medir a quantidade de água usada. “Se a pessoa tem dinheiro para
furar um poço, que é caro, ela pode pagar pela água.”
Para a promotora de Meio Ambiente do Ministério
Público do DF, Marta Eliana, faltam elementos para uma fiscalização mais segura
do uso da água. “Não existe uma fiscalização efetiva de quanto se tira de água
subterrânea. Não é porque a pessoa tem a outorga que significa que ela usa
somente aquela quantidade”, destaca.
Glossário Cisterna
Poços de diâmetros de um metro ou mais, escavados
manualmente e revestidos com tijolos ou anéis de concreto, captam o lençol
freático e têm geralmente profundidades de até 20 metros.
Poço tubular
Obra de engenharia que dá acesso à água
subterrânea, executada com sonda por perfuração vertical e profundidade de até
2 mil metros para captação de água.
Captação ampliada
Por conta
da crise hídrica, a outorga da Agência Reguladora de Águas, Energia e
Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa) permite que sejam retirados até
726 litros de litros por segundo no novo subsistema do Bananal. A captação será
colocada em operação antes mesmo de as obras estarem finalizadas, com 85% dos
serviços executados. A vazão de água captada aumentará gradativamente, podendo
chegar ao nível máximo em até duas semanas.
Asa Norte, Sudoeste, Cruzeiro e Noroeste serão
abastecidas pelo novo empreendimento. Atualmente, as regiões são atendidas pelo
sistema Santa Maria. Também faziam parte do sistema Lago Norte, Paranoá, Itapoã
e Taquari até a inauguração da captação do Lago Paranoá, no começo de outubro.
Com as duas captações em funcionamento, mais de
1.400 litros de água por segundo, antes retirados do reservatório de Santa
Maria, estão livres e, aos poucos, vão sendo repassados, por meio de
inteligação dos sistemas, para as regiões abastecidas pelo Descoberto, como
Núcleo Bandeirante, Candangolândia e Guará. Segundo a Caesb, o objetivo é
desafogar o Descoberto, que há mais de um mês vem batendo, diariamente, novos
recordes negativos.
(*) Flávia Maia – Correio Braziliense - Fotos: PMDF- Divulgação - Gabriel Jabur - Agência Brasília -
Que artigo bem escrito sobre Perfuração de poço artesiano, muito bom mesmo, estão de parabéns pelo conteúdo top
ResponderExcluirAchei o que precisava para saber tudo sobre poço artesiano o que é, obrigada pelo conteúdo, parabéns pelo serviço de informar tão bem a população
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