A falta de importância dada ao voto para distrital dificulta as
cobranças e o acompanhamento do trabalho feito durante o mandato dos 24
parlamentares que ocupam o posto
Número elevado de candidatos e sentimento de falta
de representatividade afastam o eleitor do pleito. Em vez de pesquisar a
trajetória do político, população costuma dar mais valor à influência de outras
pessoas na hora de tomar decisão sobre em quem votar
*Por » Alexandre de Paula
Você se
lembra em quem votou para deputado distrital nas últimas eleições? Sabe qual o
partido do candidato escolhido ou mesmo as razões que o levaram à definição? De
acordo com especialistas que estudam o tema, a maior parte da população do
Distrito Federal responderia não para essas questões. O desinteresse pela
eleição para distrital e o sentimento de falta de representatividade na Câmara
Legislativa do DF, para cientistas políticos, fazem com que o voto perca
qualidade. Além disso, deixa o eleitor cada vez mais distante dos
representantes e com mais tendência a escolher unicamente pela influência de
outras pessoas.
Doutor em
ciência política pela Universidade de Brasília (UnB), Leonardo Barreto escreve
uma tese que investiga o voto para esse cargo. “Nas minhas pesquisas, percebi
que o eleitor não dá muita importância para a eleição de deputado distrital.
Isso é também resultado do nosso sistema. Há uma quantidade muito grande de
candidatos e a probabilidade de você dar seu voto para alguém que não vai
ganhar é, geralmente, de mais de 70%”, aponta. Em 2014, 976 candidatos
concorreram ao cargo.
Por isso,
em vários casos, a escolha é definida sem um critério muito apurado, em que
pesa, principalmente, a indicação de pessoas conhecidas, como amigos, colegas e
líderes. “A maioria vota recebendo a indicação de alguém. Como a pessoa não
valoriza o voto para deputado distrital, essa indicação acaba sendo uma
economia na visão dela, que não precisa parar para pensar e para analisar
muito”, observa.
O
professor e cientista político da UnB David Fleischer também destaca a
indicação como um dos principais fatores para a escolha do eleitor. Segundo
ele, isso acaba reforçando o poder de alguns grupos. “O eleitor evangélico, por
exemplo, tende a votar no candidato que a própria igreja indica. Muitas
categorias também pressionam os seus membros para votar em alguém definido por
elas”, analisa.
Desinteresse
A
indiferença da população na escolha do candidato a deputado distrital leva a problemas
como a falta de embasamento para o voto. “A variável interesse está vinculada
diretamente à quantidade de informação no voto. Quanto mais desinteresse, menos
informação o voto tem. Aí a qualidade da escolha vai embora”, analisa Barreto.
Os principais
prejudicados pelo desinteresse, para o cientista político, são os chamados
candidatos de opinião, que se apoiam na defesa de propostas e de
posicionamentos. “Esses outros candidatos que representam algum grupo de
interesses praticamente não perdem nada, porque há uma estrutura em torno
deles.”
A falta
de importância dada ao voto para distrital dificulta as cobranças e o
acompanhamento do trabalho feito por deputados durante o mandato. “Os estudos
mostram que, seis meses após a eleição, mais da metade das pessoas não se
lembra em quem votou. Se você não se lembra nem quem foi seu candidato, como
vai cobrar dele? Isso gera uma ligação muito fraca entre deputados e
população”, acrescenta Fleischer.
"Os
estudos mostram que, seis meses após a eleição, mais da metade das pessoas não
se lembra em quem votou. Se você não se lembra nem quem foi seu candidato, como
vai cobrar dele?" David Fleischer, cientista político
"Isso
é também resultado do nosso sistema. Há uma quantidade muito grande de
candidatos e a probabilidade de você dar seu voto para alguém que não vai
ganhar é, geralmente, de mais de 70%" Leonardo Barreto, cientista político
Como escolher
Mesmo com todas essas questões, os especialistas
apontam que é possível a população votar melhor e sugerem estratégias para usar
na avaliação dos políticos. “O eleitor tem que olhar a ‘folha corrida’ do
candidato. Ver o que ele já fez, o que ele propõe e observar, claro, se há algo
contra ele, alguma denúncia”, sugere Fleischer.
Barreto recomenda, por exemplo, questionar por que
o candidato decidiu concorrer. “Pode parecer óbvio, mas tenho impressão de que
a maioria não consegue responder sequer a isso sem cair em discursos rasos.
Além disso, é preciso ver se o candidato tem trabalho comunitário já
desenvolvido ou histórico de atuação em alguma causa”, diz. Outra dica é
analisar as alianças feitas pelos postulantes à Câmara Legislativa. “É
fundamental ver com quem o candidato está, qual é o grupo dele, porque é esse
grupo que fará cobranças depois e que vai direcionar o mandato.”
Saber eleger prioridades é uma das qualidades
essenciais para um bom deputado distrital, segundo os especialistas. É
fundamental que, além de conseguir identificar quais são essas prioridades, o
postulante à Câmara Legislativa tenha propostas para elas. “O candidato precisa
saber identificar quais são os principais problemas do Distrito Federal e
conseguir apresentar soluções para essas questões”, afirma Fleischer.
A transparência é outra qualidade destacada. Ter
vida limpa e não se aliar com políticos corruptos é obrigação, para os
cientistas políticos. “Teria que ser alguém disposto também a fiscalizar o
governador, em tudo que for preciso, mesmo que seja aliado dele”, ressalta
Barreto. Combater desperdícios e valorizar a qualidade dos serviços prestados
são outras questões centrais atualmente. “E tem de ser alguém que veja o todo.
Um candidato dos professores, por exemplo, que defenda só aumento de salário e
não pense na melhoria do ensino em geral não serve.”
976 - Quantidade de candidatos a deputado distrital em 2014
976 - Quantidade de candidatos a deputado distrital em 2014
Para saber mais - As funções de um distrital
As atribuições da Câmara Legislativa do Distrito
Federal estão definidas na Lei Orgânica do DF. A CLDF, segundo a legislação,
deve “dispor sobre todas as matérias de competência do Distrito Federal”, com a
sanção do governador. Cabe aos 24 deputados distritais eleitos funções como a
criação e a aprovação de leis sobre questões relacionadas ao DF. Eles precisam
também avaliar a Lei de Diretrizes Orçamentárias — que prevê quais serão as
regras e prioridades para o orçamento do DF no ano seguinte — e propor emendas
a ela. Além disso, outra função importante dos distritais é fiscalizar e
controlar os atos do Poder Executivo.
(*) Alexandre de Paula - Fotos:
Minervino Junior/CB/D.A.Press - Breno Fortes/CB/D.A.Press - Correio Braziliense