INVESTIGAÇÃO » Batida nas celas de
Estevão e de GeddelPoliciais fazem busca no bloco 5 do Centro de Detenção
Provisória para apurar regalias concedidas aos dois detentos na Papuda. Com o
ex-senador, foram apreendidos pen-drives e documentos, além de produtos
proibidos no sistema penitenciário
*Por Ana Maria Campos
Luiz Estevão: no momento da operação, durante a
partida da Seleção Brasileira, o ex-senador teria tentado descartar cinco
pen-drives, que acabaram recolhidos pelos policiais
Enquanto a bola rolava em Rostov, na
Rússia, com a Seleção Brasileira em campo, cerca de 40 policiais civis entraram
no bloco 5 do Centro de Detenção Provisória (CDP), no Complexo Penitenciário da
Papuda. Estava em curso a Operação Bastilha, sob a responsabilidade da Divisão
de Facções da Coordenação de Combate ao Crime Organizado, aos Crimes contra a
Administração Pública e contra a Ordem Tributária (CECOR). Os alvos eram dois
presos ilustres: o ex-senador Luiz Estevão e o ex-ministro Geddel Vieira Lima.
Os mandados de busca e apreensão foram expedidos pela Vara Criminal de São Sebastião
como medida para avaliar suspeitas de regalias concedidas na Papuda aos dois
detentos. O trabalho tem o apoio dos promotores do Núcleo de Controle e
Fiscalização do Sistema Prisional (Nupri).
O horário para a entrada no CDP foi
escolhido estrategicamente. Os presos foram surpreendidos quando a partida
entre o Brasil e a Suíça já estava empatada. Estevão e o companheiro de cela,
José Dirceu, foram levados para o pátio central do bloco, enquanto os policiais
civis da DOE (Divisão de Operações Especiais) vasculhavam o local. Como na
fiscalização do ano passado, foram encontrados chocolates e agora também
medicamentos sob o poder de Estevão, que serão avaliados para comprovação de
que estão permitidos pela Vara de Execuções Penais. Uma tesoura também foi achada,
objeto vetado no sistema penitenciário.
Documentos
No momento em que foi retirado da cela,
o ex-senador Luiz Estevão tentou descartar cinco pen-drives, mas um agente
percebeu a movimentação e fez a apreensão. O conteúdo desses dispositivos
também será avaliado pela investigação. No caso de Geddel, ex-ministro do
governo Michel Temer, havia apenas anotações. O emedebista está preso
provisoriamente desde setembro do ano passado, depois que as malas de dinheiro
com R$ 51 milhões, que pertenceriam a ele, foram descobertas em um apartamento
em Salvador. Geddel divide a cela com outros nove presos, enquanto Estevão tem
apenas como companheiro no cárcere o ex-poderoso ministro do governo Lula José
Dirceu, que cumpre pena de 30 anos e nove meses de prisão por corrupção,
lavagem de dinheiro e organização criminosa, em ação da Lava-Jato.
Durante a busca, chamou a atenção dos
investigadores a grande quantidade de documentos de Luiz Estevão apreendida na
biblioteca do bloco 5, dando a impressão de que a sala de uso comum funciona
como um escritório particular do empresário. No local, foram apreendidas várias
pastas, com documentos de negócios do ex-senador. Toda a operação no CDP foi
registrada em vídeo pelos policiais civis, mas as imagens não serão divulgadas
para preservar o ambiente do sistema penitenciário. Detalhes, no entanto,
poderão ser usados como evidências no inquérito.
Com Geddel, foram encontradas anotações:
ex-ministro divide a cela com nove presos
A investigação do Nupri e da Divisão de
Facções começou no início do ano, a partir de denúncias de que presos ligados a
organizações criminosas tramavam ações de violência contra delegados e juízes.
Esses fatos, descritos em relatórios de inteligência da Secretaria de Segurança
Pública e Paz Social, não foram confirmados, mas a apuração avançou com
evidências de regalias concedidas aos presos do bloco 5, uma área de
vulneráveis, em que cumprem penas ex-policiais e políticos. Passaram por lá o
doleiro Lúcio Funaro e o ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique
Pizzolato, que ficaram amigos de Estevão.
Condenado a 26 anos de prisão por
desvios de recursos públicos do TRT de São Paulo, Estevão está na cadeia há
dois anos e três meses. Não é a primeira vez que são detectados benefícios a
políticos, vantagens que outros presidiários não desfrutam (leia memória). No
ano passado, durante uma fiscalização, foram encontrados chocolates, cafeteira
elétrica, máquina de café e massa importada. O privilégio resultou na
exoneração do diretor do CDP, Diogo Ernesto, e do diretor adjunto da prisão,
Vitor Espíndola Salas.
MEMÓRIA » Casos recorrentes de favorecimentos - Espaço do bloco do Centro de Detenção Provisória, que teve reforma
financiada por Estevão
Presos ilustres, com condenações de
três décadas de prisão, José Dirceu e Luiz Estevão aparecem em outros episódios
de favorecimentos no sistema penitenciário do DF. Em maio, três delegados, João
Helder Ramos Feitosa, Marcory Geraldo Mohn e Elivaldo Ferreira de Melo, e um
agente da Polícia Civil, Wilton Borges de Sousa, foram denunciados pelo crime
de corrupção passiva privilegiada e são alvos de uma ação de improbidade
administrativa por terem beneficiado com regalias José Dirceu e outros três
condenados no processo do mensalão durante o cumprimento da pena do sistema
penitenciário do Distrito Federal.
Segundo as ações, ajuizadas pelos
promotores do Núcleo de Investigação e Controle Externo da Atividade Policial
(NCAP), Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares e o publicitário Marcos Valério
Fernandes de Souza tiveram privilégios autorizados pelos policiais civis que
atuavam na Subsecretaria do Sistema Penitenciário (Sesipe), em 2014, durante o
governo de Agnelo Queiroz (PT). Eles recebiam visitas fora do horário permitido
a outros detentos e, pelo menos uma vez, a filha do ex-chefe da Casa Civil
Joana Saragoça chegou na cadeia do Centro de Internamento e Reeducação (CIR)
dentro de uma viatura descaracterizada conduzida pelo agente Wilton Borges de
Sousa, então chefe de gerência de inteligência da Sesipe.
O ex-senador Luiz Estevão responde a
uma ação de improbidade administrativa por financiar a reforma do bloco do
Centro de Detenção Provisória (CDP) onde cumpre pena no Complexo da Papuda. O
Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) apontou que a
reforma foi executada por uma empresa de fachada, sob a coordenação de uma
arquiteta do grupo empresarial de Estevão.
Também são alvos da ação o
ex-subsecretário do Sistema Penitenciário (Sesipe) Cláudio Magalhães, o
ex-coordenador-geral da Sesipe João Helder Ramos Feitosa e o ex-diretor do CDP
Murilo Cunha, acusados de conivência. Os três delegados da Polícia Civil foram
designados pelo governo de Agnelo Queiroz para atuar no sistema penitenciário.
Na ação, ajuizada em agosto de 2016,
cinco promotores de Justiça do Núcleo de Controle e Fiscalização do Sistema
Prisional (Nupri) compararam Estevão ao narcotraficante Pablo Escobar, que
construiu um presídio em Medellín, que ganhou o nome de La Catedral.
Em janeiro do ano passado, em uma
vistoria realizada no CDP, foram encontrados itens proibidos na cela de Luiz
Estevão, como chocolate, cafeteira elétrica, cápsulas de café e massa
importada. Por conta disso, o empresário passou uma temporada na solitária.
O ex-senador responde ainda a outra
ação de improbidade por ter sido liberado indevidamente da prisão para passar o
fim de semana em casa, apenas com autorização da Sesipe, sem o aval da Vara de
Execuções Penais. Uma das filhas de Estevão postou uma foto do pai nas redes
sociais, o que despertou a atuação do Ministério Público Federal. Também nesse
caso os servidores responsáveis pela liberação, Cláudio Magalhães e Murilo da
Cunha, se tornaram alvo da ação de improbidade.
(*) Ana Maria Campos – Fotos: Helio
Montferre/CB/D.A.Press – Sergio Lima/AFP – MPDF - Blog/Google - Correio Braziliense