Santo Antônio do Descoberto: 50
mil pessoas (78,8% dos habitantes), não são naturais de Goiás, sendo que 48,3% nasceram
no Distrito Federal
O vaivém dos eleitores que moram no Entorno -
Somente este ano, 37.046 pessoas transferiram o título de outras unidades da
Federação para o Distrito Federal. Valparaíso é o município com maior migração
de títulos para Brasília, seguido por Águas Lindas e Novo Gama, todos de Goiás
*Por » Helena Mader
A influência que o Distrito Federal exerce sobre os
municípios do Entorno vai além da oferta de serviços públicos como saúde e
educação. A capital atrai eleitores de cidades vizinhas e mobiliza a atenção da
região metropolitana a cada eleição. De novembro de 2016, após o pleito
municipal, até junho último, 12,4 mil pessoas transferiram o título de eleitor
de localidades goianas limítrofes do DF. No mesmo período, 1,3 mil cidadãos que
votavam em cidades mineiras próximas também trocaram o domicílio eleitoral para
o DF.
A corrida para a mudança se intensificou desde
janeiro. Só este ano, 37.046 pessoas transferiram o título de outras unidades
da Federação para a capital. Goiás é o campeão de migrações de documentos para
o Distrito Federal. Ao todo, 9,9 mil eleitores procuraram a Justiça Eleitoral
em 2018 com interesse de votar em Brasília. Em seguida, aparece Minas Gerais,
com 4,1 mil eleitores, e Bahia, de onde saíram 3,8 mil novos eleitores do DF.
O município com maior migração de títulos para
Brasília foi Valparaíso de Goiás. Das eleições municipais para cá, 1.878
pessoas deixaram de votar na cidade goiana para exercer a cidadania na capital
federal. Na lista, também estão Águas Lindas de Goiás, de onde saíram 1.795
eleitores, e Novo Gama, que perdeu 1.749 títulos para o DF. Os dados são do
Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal (TRE-DF).
Não há informações de quantos eleitores do DF moram
no Entorno, pois muitos se mudam para a região metropolitana sem informar o
TRE-DF e sem fazer a devida mudança de domicílio eleitoral. Outro fator
frequente é a apresentação de comprovante de residência de parentes, usado por
moradores do Entorno para conseguir transferir o título para alguma zona
eleitoral de Brasília.
Mesmo morando em Valparaíso, o
aposentado Valdevino vota no DF
Divididos
Quem mora
na região metropolitana e vota no DF acompanha com atenção a formação de chapas
e a escolha dos pré-candidatos que vão concorrer em outubro. O aposentado
Valdivino Bento dos Anjos, 60 anos, mora hoje em Valparaíso, mas viveu durante
mais de três décadas no Distrito Federal. Ele se mudou em 2002, e,
inicialmente, transferiu o título para Goiás. Mas, há quatro anos, optou por
votar no DF e migrou o domicílio eleitoral novamente, apesar de ter residência
fixa no Entorno. “Brasília me acolheu muito bem quando cheguei, nos anos 1970,
e meus filhos ainda moram lá. Decidi votar no DF, apesar de morar em
Valparaíso, porque gosto de participar um pouco do futuro da cidade”, comenta
Valdivino.
O
presidente da Associação Comercial e Industrial de Luziânia, Marcos Melo,
lembra que, de quatro em quatro anos, o Entorno recebe uma romaria de políticos
tanto do DF, tanto quanto de Goiás, em busca de votos. “Depois das eleições,
todos somem. A população já está acostumada”, lamenta o líder comunitário. “No
caso de Luziânia, cerca de 30 mil pessoas vão diariamente para o DF, para
trabalhar ou estudar, e muitos preferem votar lá porque eles têm uma relação
mais próxima com Brasília do que com Goiás”, acrescenta.
Marcos
Melo aposta que, em 2018, o Entorno terá importância primordial para a eleição
no DF. “Em época de eleição, todo mundo se preocupa com a nossa região, e este
ano acho que o interesse pelo Entorno vai ser maior ainda. Espero que seja um
ano de mudanças, e que os velhos caciques vão para casa descansar, deixando
espaço para pessoas novas e com ideias renovadas”, finaliza o líder de
Luziânia.
Desinteresse
O
tapeceiro Matheus Silva, 30 anos, mora em Valparaíso, mas vota no Distrito
Federal. “Vou anular todos os outros votos, não quero nem saber quem vai
concorrer este ano. Político só vem aqui pedir voto, não ajuda em nada a
população”, reclama. Matheus tem domicílio eleitoral em Samambaia, cidade onde
morou até 2013, quando se mudou para o Entorno. “Não transferi meu título para
Valparaíso porque, em Goiás, tem votação de dois em dois anos. Prefiro votar no
Distrito Federal, já que só tem eleição a cada quatro anos. O pessoal daqui tem
que enfrentar filas enormes para votar, e eu não faço questão nenhuma de ajudar
a escolher esses políticos”, contou o jovem, desiludido com a política.
A
comerciária Marizete Maria dos Santos, 60 anos, também está pessimista quanto à
escolha dos futuros ocupantes de cargos públicos. Ela morou por uma década no
Riacho Fundo I e se mudou recentemente para Valparaíso. O domicílio eleitoral,
porém, continua no DF. A escolha dos candidatos, segundo ela, passa por
indicações de pessoas conhecidas. “Não costumo acompanhar muito os candidatos
nas eleições. Escolho em quem vou votar por indicação de pessoas da minha
igreja e dos meus familiares. Ninguém faz nada pela cidade mesmo, quando
aparece é só para pedir voto”, comenta Marizete.
O
carpinteiro Marcelo Carvalho Oliveira, 38 anos, se mudou de Taguatinga para o
Entorno há quatro anos, mas não quis alterar a documentação eleitoral. Fã do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do ex-governador Joaquim Roriz, que
por diferentes motivos devem estar longe das urnas, Marcelo diz que perdeu o
encanto pela política. “Temos problemas graves na saúde, na educação, na
segurança, mas ninguém faz nada”, reclama o morador de Valparaíso. Apesar de
descrente com o cenário eleitoral, ele já começou a pesquisar sobre os
políticos que serão candidatos este ano no Distrito Federal e promete escolher
com cuidado.
Marcelo reclama da falta de ação
do dos governos municipal e estadual
Inchaço
O consultor político e professor da Universidade
Católica de Brasília Creomar Souza lembra que, politicamente, o Entorno é uma
área de grande relevância para a capital federal. “A partir dos anos 1990,
passou a ser imprescindível para qualquer candidato majoritário fazer campanha
no Entorno. A região cresceu muito, especialmente por conta da demanda por
moradia e do inchaço do Distrito Federal, além do alto custo de vida de
Brasília”, comenta o especialista.
Para Creomar, o grande número de brasilienses que
moram nos municípios vizinhos explica as constantes transferências de
domicílios eleitorais entre o DF e cidades da região metropolitana. O consultor
político lembra ainda que, este ano, o voto dos moradores do Entorno deve
ganhar ainda mais importância. “A disputa pelo governo está bem aberta e não
temos nenhum candidato com votação claramente superior as dos outros. Com isso,
o eleitorado do Entorno tende a ganhar ainda mais importância”, finaliza o
professor.
37.046 - Total de eleitores que transferiram o título de outras unidades da Federação para a capital em 2018
Migrantes
Municípios com maior número de migração de títulos
do Entorno para o DF, desde 2016
Valparaíso de Goiás -1.878 - Águas Lindas de
Goiás - 1.795 - Novo Gama - 1.749 - Luziânia - 1.521
- Santo Antônio do Descoberto - 979 - Planaltina de Goiás
- 916 - Formosa - 821 - Padre Bernardo - 618
Influência política
O
crescimento rápido dos municípios da região metropolitana contou com a migração
em massa de brasilienses para o Entorno. As características demográficas da
região, altamente dependente do DF, explicam a influência política da
capital. Dados comprovam que, em alguns municípios, a maioria da população
nasceu no DF. Em Santo Antônio do Descoberto, por exemplo, 50 mil pessoas, o
que representa 78,8% dos habitantes, não são naturais de Goiás. Desses, 48,3%
nasceram no Distrito Federal.
Os dados são da Pesquisa Metropolitana por Amostra
de Domicílios, um levantamento realizado pela Codeplan. A companhia do governo
do DF já realizou o censo em seis municípios de Goiás, de 2017 para cá.
Alexânia, Cristalina, Formosa, Luziânia, Novo Gama e Santo Antônio do
Descoberto foram visitados pelos pesquisadores da Codeplan desde o ano passado.
No Novo Gama, a maior parcela é natural do Distrito
Federal — 37,97% do total, o equivalente a 41,3 mil pessoas. Em segundo lugar,
estão os nascidos em outros municípios de Goiás, que representam 18,21% do
total de migrantes. A renda domiciliar média mensal do município é de R$
1.871,31.
Municípios goianos mais antigos e consolidado têm
menos migração de eleitores para o DF. Em Formosa, por exemplo, 821 pessoas
transferiram o título para Brasília desde a última eleição municipal. Dos 106,4
mil habitantes da cidade distante 70km de Brasília, 73,6% dos moradores são
naturais de Goiás e só 8,8% nasceram no Distrito Federal.
(*) Helena Mader – Fotos: Minervino
Junior/CB/D.A.Press – Correio Braziliense