Sem medo de se orgulhar
*Por Mariana Niederauer
Alerta ao leitor: esse é mais um texto sobre a Copa
do Mundo. Nos próximos quatro anos, outros assuntos vão dominar a sua timeline
e as conversas de domingo. Muitos deles, provavelmente, mais importantes do que
o torneio mundial. A inflação, a pobreza, a violência, a corrupção. Mas o
futebol certamente também surgirá.
No momento em que o tema entrar na roda,
seguramente você se recordará do desempenho da Seleção no jogo contra a
Bélgica. E o que essa lembrança representará? Pense com calma, reflita. Quando
abro os olhos depois dessa pausa, as memórias que me vêm à cabeça são todas dos
instantes de pura felicidade que o esporte proporcionou.
Tive o prazer de ver o Brasil ser campeão duas
vezes. Do título de 1994, as lembranças são basicamente reproduções de replays
na televisão. A icônica celebração de Bebeto. O chute para fora de Roberto
Baggio. Já a comemoração do apito final no jogo decisivo de 2002 ainda ressoa
nos ouvidos. A chuva de papel picado improvisada momentos antes com os primos
entrou em perfeita sintonia com a que explodiu sobre o capitão Cafu ao erguer a
taça no Japão.
A derrota no continente europeu, diante de uma
seleção europeia montada para desafiar a criatividade do ataque Canarinho dói.
E nós podemos sofrer. É permitido. Chore. Cale-se como se calaram os 200 mil
torcedores no Maracanã em 1950. Mas permita-se também ter orgulho.
Ou esperávamos mesmo que nossos atletas jogassem
como russos, belgas e suíços? A Seleção de 1982, uma das inspirações de Tite, é
até hoje lembrada pela qualidade de seus jogadores, que não levaram o título,
mas encantaram. O nosso “futebol arte” foi e é temido até hoje. E quem pode
dizer que os 11 defensores da camisa verde-amarela na última sexta-feira não
mantiveram a tradição?
Entrou em campo um ingrediente que sempre acompanha
os brasileiros: a emoção. Não há como exigir nem do maior dos craques que o
deixe de lado. Ele está no gingado dos dribles de Neymar. Na força de Marcelo
ao percorrer de uma ponta a outra o lado esquerdo do campo. Na precisão de Thiago
Silva e Miranda ao afastar as inúmeras bolas que se aproximaram da área
brasileira. Até o pequeno Fagner se agigantou na marcação de Hazard.
A única vergonha que resulta do Mundial cai nos
ombros dos brasileiros que assediaram mulheres em postagens nas redes sociais
ou dirigiram ofensas racistas a Fernandinho. Pelé e Garrincha quebraram esse
paradigma há décadas. Juntos, Edson, o Rei, e Mané, o Anjo das Pernas Tortas,
responderam o preconceito com a alegria de três Mundiais.
Graças a esse legado, ninguém enfrenta a Seleção
Brasileira sem temer a agilidade e o talento dos nossos craques. Nenhum jogador
defende o seu país sem pensar nos milhões de brasileiros representados pelos
torcedores que cantam o Hino à capela nos estádios. Se nos unimos, em todos os
cantos do mundo, para torcer e celebrar a vitória, não há razão para nos
separarmos na derrota. O respeito é o jogador que deve completar esse time
sempre.
(*) Mariana Niederauer -
Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog - Google