Os grileiros agiam na Granja
Modelo, próximo à BR-060, no Riacho Fundo 1: área total de 93 hectares
*Por Alexandre de Paula
– Walder Galvão
Servidores agiam como informantes de grileiros.
Segundo investigação da Polícia Civil, funcionários públicos, um deles ligado a
gabinete de distrital, colaboravam com esquema de parcelamento irregular em
área de preservação do Riacho Fundo. Lucro estimado é de R$ 1,8 milhão
Servidores
públicos do Distrito Federal são acusados de integrar um esquema de grilagem,
compra e venda de lotes irregulares no Riacho Fundo 1. Eles repassavam
informações, de acordo com apuração da Polícia Civil, para uma organização criminosa
da região. Os suspeitos avisavam os grileiros sobre futuras derrubadas e
operações policiais, o que permitia que o grupo driblasse a fiscalização. Um
dos alvos da ação deflagrada ontem, batizada de Generous, é assessor do
gabinete da deputada distrital Telma Rufino (Pros). Os agentes cumpriram seis
mandados de prisão, mas cinco suspeitos continuam foragidos. Estima-se que a
associação faturou mais de R$ 1,8 milhão.
Rogério Barbosa
Carneiro trabalha com a parlamentar desde agosto de 2015. Atualmente, ocupa
função comissionada, com salário líquido de R$ 3.632,10. Entre outubro de 2011
e novembro de 2012, ele atuou como agente operacional da Diretoria de Operações
e Defesa do Solo e da Água. O órgão fazia parte da extinta Secretaria de Ordem
Pública e Social. O Correio não conseguiu localizar a defesa do suspeito.
Em nota, Telma
Rufino destacou que tomará medidas cabíveis depois de se informar sobre o caso
e ressaltou que a ação policial não se destina a investigar questões
relacionadas ao mandato. “A operação de busca realizada no gabinete número 8
não possui qualquer relação com a atividade parlamentar, sendo de caráter
pessoal e voltada a um dos servidores. A deputada informa que tomará ciência a
respeito dos fatos para que sejam adotadas as medidas cabíveis”, ressalta o
texto.
As investigações
iniciaram em janeiro, quando os agentes da Delegacia Especial de Proteção ao
Meio Ambiente e à Ordem Urbanística (Dema) identificaram a atuação dos
suspeitos na Granja Modelo, próximo à BR-060, no Riacho Fundo 1 (veja Onde
fica). Os suspeitos começaram a lotear o lugar, produzir documentação falsa e
vender os imóveis às vítimas. “A associação era composta por quatro líderes que
se apresentavam como proprietários das terras, que, na verdade, pertencem à Terracap
(Agência de Desenvolvimento)”, explica o delegado à frente do caso, Marcelo
Cerqueira.
Os policiais
prenderam apenas um dos chefes do grupo. De acordo com o investigador, o bando
era articulado, com divisão de funções. “Todos tinham cargos diferentes. Uns
vendiam os terrenos e produziam a documentação falsa, e outros trabalhavam fora
do lugar, vigiando o perímetro ou colhendo informações, como o servidor público
(Rogério)”, detalha. Para não levantar tantas suspeitas, os anúncios do
comércio irregular eram feitos na própria região, verbalmente e por placas.
O delegado não
revelou a identidade de todos os envolvidos no esquema ou em qual local
trabalham, sob o argumento de que os dados poderiam atrapalhar a apuração. “No
fim das investigações, tudo será esclarecido. Como nem todos foram presos, não
podemos dar tantos detalhes”, justificou. Entretanto, Marcelo adiantou que eles
ocupariam cargos essenciais no governo e eram recrutados pelo grupo para
fornecer informações privilegiadas, o que manteve o esquema de pé por, no
mínimo, seis meses.
Flagrante de construções ilegais
no local onde os acusados são suspeitos de aplicar golpes em 40 pessoas
Ameaças e lucro
Os policiais
constataram que o grupo criminoso enganou pelo menos 40 pessoas, mas muitas não
procuraram delegacias por medo. Quando alguém era contrário ao esquema ou
tentava denunciar, sofria ameaças e desistia de procurar os investigadores.
“Muitas vezes, os lotes eram vendidos mais de uma vez para pessoas diferentes.
Quando o indivíduo se dava conta da fraude, tentava procurar a polícia, mas era
repreendido pelo grupo”, detalhou o delegado. A associação também extorquia os
compradores dos terrenos. “Os suspeitos cobravam até R$ 2 mil para que as
pessoas pudessem ter acesso ao lote”, detalha.
Desde janeiro, os
acusados teriam vendido 40 lotes no valor de R$ 45 mil. Com a prática, os
investigadores estimam que tenham lucrado ao menos R$ 1,8 milhão. O tamanho
total da área é de 93 hectares e, caso os criminosos estivessem ocupando todo o
perímetro, poderiam obter até R$ 80 milhões, de acordo com o delegado. “Sabemos
que existiam muito mais terras que seriam loteadas. Eles também estavam em
contato com supermercados e postos de gasolina, tentando vender terrenos ainda
maiores”, afirma.
Durante o
cumprimento dos mandados de busca e apreensão, os agentes apreenderam
computadores, que serão avaliados pelos peritos nos próximos dias. “Todo o
material passará por perícia, e as investigações continuam para identificar o
paradeiro dos foragidos. Pretendemos em breve estar com todos os responsáveis
presos”, diz o delegado Marcelo.
Loteamento
Segundo a
investigação, a área da Granja Modelo passou a ser invadida em janeiro, quando
os criminosos se aproveitaram das ocupações irregulares para fazer a grilagem.
De acordo com o delegado, mais de 40 famílias vivem no local, mas elas não
responderão pelo parcelamento irregular do solo. “São pessoas que não têm alto
nível intelectual e não participaram na grilagem”, explica Marcelo.
O perímetro
invadido faz parte de uma área de preservação ambiental destinada à diversidade
biológica de fauna e flora, além da preservação de recursos hídricos. Os 11
suspeitos serão indiciados por associação criminosa, parcelamento irregular do
solo, dano ambiental, falsificação de documentos, extorsão e ameaça. Caso
condenados, podem ficar presos por até 20 anos.
O delegado
informou que a região passou por duas operações de desocupação neste ano, no
entanto, os invasores voltaram ao local. Em nota, a DF Legal informou que a
área em questão, por estar dentro do Parque Ecológico e Vivencial do Riacho
Fundo, não é passível de regularização, e os invasores haviam sido notificados
para demolir as construções. “Este ano, foram realizadas duas operações de
desocupação no local, uma em abril e outra em maio”, reforça o texto.
A Secretaria de
Desenvolvimento Social informa, também em nota, que esteve na região em 4 de
junho, quando abordou as famílias e apresentou os serviços da Assistência
Social do DF. “A principal orientação foi para que agendassem o preenchimento
do Cadastro Único, para que possam ser avaliadas e incluídas no cadastro para
recebimento de benefícios, auxílios ou abrigamento, conforme a necessidade
constatada pela equipe técnica da secretaria”, aponta o órgão.
Memória - Histórico de prisões
No mês passado,
sete policiais militares foram presos por integrar um esquema de grilagem de
terras no Sol Nascente, em Ceilândia. O grupo atuava como milícia e é acusado
de loteamento do solo, extorsão e homicídio. Além disso, em abril, policiais
civis flagraram cinco pessoas por grilagem de terras em São Sebastião. No mesmo
mês, quatro pessoas foram detidas sob a acusação de parcelar e vender chácaras
em uma Área de Preservação Ambiental (APA), em Brazlândia. Em janeiro, 19
pessoas acabaram presas por invasão de terras no Paranoá.
O que diz a lei
A Lei nº 12.850, de 2013, define como crime promover, constituir, financiar ou integrar uma organização criminosa, sob pena de reclusão de 3 a 8 anos e multa. O inciso 4º prevê o crescimento da penalidade de um sexto a dois terços, caso a quadrilha mantenha conexão com outras.
(*) Alexandre de Paula – Walder Galvão – Fotos:
PCDF/Divulgação – Correio Braziliense
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