Como não podem criar despesas, os distritais escolhem para quais
projetos e programas pretendem direcionar as emendas individuais
*Por Ana Viriato
Projetos falhos prejudicam áreas essenciais. GDF libera R$
22,6 milhões, em emendas, para cultura, esporte, lazer e educação. Secretaria
de Fazenda pretende rever os gastos com os eventos festivos
O Palácio do Buriti pagou R$ 22,6 milhões em
investimentos e custeios, previstos em emendas parlamentares até o fim da
primeira quinzena de agosto. Incorporadas ao orçamento da capital, anualmente,
por distritais, as destinações costumam privilegiar os redutos eleitorais de
cada um. Ao quitar a cifra milionária, o GDF contemplou cinco áreas do serviço
público e priorizou os setores de cultura, esporte e lazer e educação (veja
Quadro). Na contramão, saúde, segurança e transporte não receberam um tostão.
O secretário de Fazenda, Planejamento, Orçamento e
Gestão, André Clemente, admitiu a baixa liquidação de recursos em áreas
sensíveis da capital, mas a atribuiu a falhas estruturais nos projetos
elaborados pelo Executivo em gestões anteriores. “Recebemos o governo com
poucos programas e de baixa qualidade. Nos primeiros meses, trabalhamos muito
na revisão de projetos de urbanismo, saúde e educação e na verificação das
prestações de contas, por exemplo. A execução nesses setores será acelerada
daqui para frente”, afirmou.
Em contrapartida, a aplicação de recursos em
eventos deve cair. “Foram os primeiros a receber a verba, porque têm data
marcada e ocorrem todos os anos. Mas verificamos que alguns têm valores muito
altos. A partir de agora, vamos avaliar essas festividades com um olhar de
maior austeridade. Queremos criar um ambiente em que elas se tornem
autossustentáveis”, adiantou Clemente.
A Lei Orçamentária Anual (LOA) deste ano, aprovada
em dezembro de 2018, autoriza o emprego de R$ 436,5 milhões em emendas
parlamentares. Contudo, R$ 341,9 milhões estão bloqueados, devido à
“indisponibilidade de dotação”, conforme o Portal da Transparência. O valor
remanescente deve ser pago até o fim do ano.
Divulgação: No início deste mês, os parlamentares aprovaram, em
primeiro turno, uma emenda à Lei Orgânica que permite a divulgação da
destinação dos recursos. O texto estabelece que as disseminações de atos,
programas, obras ou serviços públicos não podem ser enquadradas como “promoção
pessoal”. Hoje, eles fazem as divulgações no fio da navalha, sob o risco de
ações de improbidade. A ideia é emplacar a nova lei para uma atuação com mais
segurança.
Entre os mandatários, o distrital com o maior valor
executado em emendas é Cláudio Abrantes (PDT), líder do governo na Câmara
Legislativa. Cinco transferências do parlamentar foram efetivadas, no total de
R$ 2,8 milhões. O pedetista destinou R$ 1,3 milhão ao Programa de
Descentralização Administrativa e Financeira (PDAF). Com o dinheiro,
investiu-se, por exemplo, na construção do Centro Interescolar de Línguas
(CIL) de Planaltina, onde está sua base eleitoral, e na reforma da Coordenação
Regional de Ensino da cidade.
O distrital ainda aplicou R$ 879,7 mil em eventos
de lazer e R$ 617,4 mil em atividades e projetos culturais. “Pedi a liberação
desses recursos para festejos tradicionais de Planaltina, como a Festa do
Divino e a Via-Sacra. Outra parte foi destinada ao Festival CoMa e ao Brasília
Capital Moto Week, que costumam gerar emprego e renda. Os eventos foram
priorizados porque têm data marcada”, detalhou Abrantes.
Na segunda colocação, está Rodrigo Delmasso (PRB).
O republicano ocupava a vice-liderança do governo no Legislativo local até a
última terça-feira, quando Hermeto (PHS) assumiu o posto. O distrital teve R$
2,4 milhões em emendas pagas. A maior fatia da cifra, cerca de R$ 1,9 milhão,
destinou-se ao projeto Centro de Excelência do Esporte.
Os recursos financiaram as partidas de vôlei da
Liga das Nações, realizadas no Ginásio Nilson Nelson. “O secretário de Esporte
pediu que eu fizesse a destinação, porque corríamos o risco de perder os jogos
para Belo Horizonte. Como contrapartida, a Confederação Brasileira de Vôlei fez
um laboratório de treinamento para professores da rede pública. E, graças ao
acerto, vamos receber o evento até 2022”, explicou Delmasso, que praticava o
esporte na juventude. Ele também repassou R$ 100 mil para as finais do vôlei de
praia, sediadas no Parque da Cidade.
Suplente de Fernando Fernandes (Pros), Telma Rufino
(Pros) emplacou R$ 1,5 milhão em emendas. Ela assumiu a cadeira logo no início
da legislatura, quando o correligionário aceitou o convite do governador
Ibaneis Rocha (MDB) para comandar a Administração Regional de Ceilândia. A
verba contemplou projetos e eventos esportivos e culturais, como o maior São
João do Cerrado, o aniversário de Brasília e o Circuito Brasília de Esportes
Radicais.
Entre os novatos, o distrital com maior valor
liquidado em emendas é Reginaldo Sardinha, do Avante, partido do
vice-governador Paco Britto. O parlamentar distribuiu R$ 1,5 milhão entre
eventos culturais e de esporte. “As destinações possibilitaram fomentar áreas
que são realmente carentes, como o 19º Concurso de Quadrilhas Juninas e o 15º
Festival Cara e Cultura Negra. É muito importante o reconhecimento e a
valorização da cultura atrelados à geração de renda e receita”, declarou, em
nota enviada ao Correio.
Sem mandato- O grupo dos políticos que
ocuparam uma vaga na Câmara Legislativa entre 2015 e 2018, mas não renovaram o
mandato, abocanhou uma significativa fatia das emendas liquidadas: R$ 9,6
milhões. Eles têm direito às dotações porque as previram no orçamento antes de
deixarem a cadeira do Legislativo. Derrotado nas urnas, Cristiano Araújo (PSD)
teve R$ 3,7 milhões em transferências executadas. “Apoiamos eventos como o São
João do Cerrado e o Brasília Cidade Design. São festividades com cunho social, abertos
para o público”, disse o ex-parlamentar.
Eleito deputado federal, o ex-secretário de Esporte
Julio César (PRB) conseguiu a liberação de R$ 1,4 milhão. Desse montante,
R$ 668 mil se destinaram a “eventos esportivos nas regiões administrativas”. Na
lista das competições beneficiadas, estão a 15ª Copa Candanga de Futsal e a
Taça Nacional Paulo Zorello, campeonato de Kickboxing.
Ex-distrital e presidente da Companhia de
Desenvolvimento Habitacional do DF (Codhab), Wellington Luiz teve uma emenda liquidada.
A transferência de R$ 278.795 se destinou à regularização de áreas de interesse
social, sob a gestão da própria empresa pública.
»O que diz a lei - Pagamentos igualitários
- As
emendas individuais dos distritais correspondem a 2% da receita corrente
líquida (RCL) estimada na Lei Orçamentária Anual (LOA). O inciso 16 do artigo
149 da Lei Orgânica do Distrito Federal estabelece a obrigatoriedade da
execução orçamentária e financeira dos programas de trabalho previstos pelos
deputados, quando os textos destinarem dinheiro a investimentos, manutenção e
desenvolvimento do ensino ou ações e serviços públicos de saúde e
infraestrutura. A lei ainda determina o pagamento igualitário e impessoal das
emendas apresentadas, independentemente da autoria.
»Memória - Mais poder- Logo no início da legislatura, os
distritais avaliaram aumentar o percentual de receita corrente líquida à
disposição dos parlamentares. Nove deputados da base governista assinaram
projeto de emenda à Lei Orgânica que pretende reservar até 1% da receita para a
execução obrigatória de emendas coletivas, de bancada ou bloco parlamentar,
além dos 2% hoje previstos para emendas individuais. Diante de uma reação do
Palácio do Buriti, frearam o andamento da proposta, que segue, entretanto, oficialmente,
em tramitação.
»Distribuição - O Palácio do Buriti executou R$
22,6 milhões em emendas parlamentares individuais entre 1º de janeiro e 15 de
agosto. Desse montante, R$ 9,6 milhões correspondem a destinações realizadas
por ex-distritais. Outros R$ 8,4 milhões estão previstos em repasses de
deputados reeleitos. O valor remanescente, de R$ 4,6 milhões, se refere às
emendas dos novatos. Confira a distribuição dos recursos:
»Por área (em R$) Administração 41.123,81 -
Comércio e Serviços 1.229.352,37 - Cultura 11.760.110,33 - Desporto e Lazer
4.899.202,92 - Educação 1.980.000,00 - Essencial à Justiça 789.595,85 - Gestão Ambiental 528.955,20 - Saneamento 984.576,82 - Urbanismo
984.576,82
(*) Ana Viriato – Foto: Ed Alves/CB/D.A.Press –
Correio Braziliense