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Casa do Cantador inaugura primeira Cordelteca do DF, com 2 mil livretos


Casa do Cantador inaugura primeira cordelteca do DF, com 2 mil livretos Acervo da biblioteca é composto, majoritariamente, por doações de escritores de cordéis e colecionadores do país. Local foi decorado com painel inspirado na arte da xilogravura. Por Luiza Garonce, G1 DF
Casa do Cantador, em Ceilândia, inaugura 1ª cordelteca do DF com 2 mil livros de acervo

Pra fazer rimar É só intercalar A sílaba que aparece no rabicho daqui Desce duas linhas E cai no final do verso de lá Mas fazer poesia é uma arte, Contar histórias de toda parte E se fazer entender Sem muito dizer Se for cordel, então Aí que é “bão” Cultura popular Literatura romanceira Sabedoria nordestina A pura essência brasileira No coração da cidade avião A sextilha cravou feito xilogravura E escolheu Ceilândia pra matar a saudade do sertão Trouxe cordel e repente na bravura E até hoje mantém a tradição.
Casa do Cantador em Ceilândia, no Distrito Federal — Foto: Luiza Garonce/G1

Impressos em fino papel, ilustrados com técnica secular e pendurados em varais, os livretos de cordel transformam em poesia a sabedoria popular e representam a resistência literária do sertão nordestino. Uma tradição que a Casa do Cantador – recanto do Nordeste no Distrito Federal – prestigia com a abertura da primeira cordelteca da capital federal. O espaço será inaugurado nesta quarta-feira (11), com cerca de 2 mil livretos de cordel, catalogados por tema. A maioria das obras, segundo a gerente de acervo e idealizadora do projeto, Aline Ferrari, foi doada por cordelistas e colecionadores de todo o Brasil.

A biblioteca reúne cordéis de caráter pedagógico, informativo ou para “puro divertimento”, de acordo com Aline. “No Nordeste há uma tradição muito forte da sátira e da bibliografia”, explica. “Eles são encantados com Padre Cícero e aficionados por Lampião, o cangaço e a ‘cornice’, mas sempre pelo lado da piada.”
Aline Ferreira, gerente de acervo e idealizadora da cordelteca da Casa do Cantador, em Ceilândia, no DF — Foto: Luiza Garonce/G1

Entre os poetas e colaboradores da cordelteca, estão o escritor Sabiá Canuto – representante “ceilandestino”, como gosta de se identificar, da nova geração de cordelistas – e o artista plástico Valdério Costa, que também presenteou a biblioteca com um painel inspirado nas xilogravuras.
O cordelista Sabiá Canuto (dir.) e o artista plástico Valdério Costa (esq.) na cordelteca da Casa do Cantador, em Ceilândia, no DF — Foto: Luiza Garonce/G1

O desenho de Valdério faz referência a uma das mais conhecidas e reverenciadas obras desta vertente literária nordestina: “O romance do pavão misterioso”, de João Melchíades Ferreira da Silva (1869-1933). O motivo é que o poeta foi escolhido para dar nome à cordelteca. O cordel conta a história de amor entre um jovem e uma condessa impedidos de viver juntos pelo pai da donzela. O ponto alto do poema é o “pavão misterioso”, uma engenhoca tecnológica usada pelo casal para fugir pelos ares. Os versos começam assim: “Eu vou contar uma história De um pavão misterioso Que levantou vôo na Grécia Com um rapaz corajoso Raptando uma condessa Filha de um conde orgulhoso.”
Painel de Valdério Costa pintado na cordelteca da Casa do Cantador, em Ceilândia, inspirada em "O romance do pavão misterioso", de João Melchíades — Foto: Luiza Garonce/G1

A autoria do cordel, porém, é uma controvérsia histórica. Há quem diga que João Melchíades foi responsável pela popularização do romance, por ter sido o primeiro a escrever os versos. No entanto, há quem diga que o criador deste clássico foi José Camelo de Melo Rezende (1885-1964), que era analfabeto e contava a história em forma de cantoria na década de 1920. 'Ceilandeste' Um pedaço do Nordeste no Planalto Central, Ceilândia preserva a tradição e a cultura nordestina trazida por pioneiros, que construíram Brasília – a promissora capital federal dos anos 1960. “Aqui chegou boa parte de quem realmente botou a mão na massa para erguer essa cidade em tempo recorde”, reforçou Sabiá Canuto. “Eles trouxeram no pau de arara, em seus matulões, toda a tradição nordestina.”
O cordelista e professor Sabiá Canuto na Casa do Cantador, em Ceilândia, DF — Foto: Luiza Garonce/G1

Com o passar dos anos, Ceilândia se consolidou como ponto de produção de saberes daqueles que, mesmo distantes de suas terras, mantinham as raízes vivas por meio da música e da literatura. “Ceilândia tem a vocação do verso. Todo mundo sabe que é a cidade do rap, mas poucos sabem que é a cidade da tradição do repente.”


*Por Luiza Garonce, G1 DF


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