ELA ACORDOU W3
*Por Daniel Cariello)
No
consultório:
– Bom
dia, doutor.
– Bom
dia. O que a traz aqui?
– Hoje,
eu acordei totalmente W3!
– Não me
diga… Como isso começou?
– Não sei
bem. Ontem, depois da segunda pinga de pequi, comecei a me sentir meio
"tesourinha". Aí, quando me olhei no espelho, de manhã, notei que
estava assim, W3.
– Você
está se sentindo mais W3 "Sul" ou "Norte"?
– E tem
isso?
–Tem,
claro. É comum, pacientes reclamarem de uma sensação de W3 Sul,
um sentimento de se tornarem desimportantes, depois de terem vivido
uma época de glória.
–Talvez
eu esteja mais W3 Norte, então. Tô me sentindo como alguém, que tinha um grande
vazio, que foi preenchido desorganizadamente.
– Era
disso que eu tinha medo!
– Por
quê, doutor?
– Casos
de W3 Sul são mais facilmente tratados. Uma volta de Grande Circular, às 18
horas, geralmente, resolve. O sentimento de abandono desaparece
completamente.
– Sério?
– É
batata! O único efeito colateral possível é a Síndrome de W3 Sul ser
substituída por uma de Sudoeste Econômico, uma sensação horrível de aperto. Mas
essa é temporária: basta descer do ônibus que passa.
– Mas
então, o meu caso de W3 Norte é grave, doutor?
–Não sei
dizer. É um fenômeno, relativamente, novo. Tive poucos pacientes com esse
diagnóstico.
– Você
pode me ajudar? Por favor!
–Podemos
tentar um tratamento alternativo. Há alguns meses, recebemos, aqui, um rapaz
com os mesmos sintomas e receitamos uma grande dose de Conjunto
Nacional. Nada como combater o caos com mais caos.
–Deu
certo?
–Não
sabemos, parece que ele se perdeu no shopping e não conseguiu
mais encontrar a saída. Olhando pelo lado bom; não voltou para
reclamar! Mas não se preocupe, vamos utilizar outra técnica com você. Só não
posso garantir que vá funcionar.
–Topo
qualquer coisa para me livrar disso.
Uma
semana depois, ela retorna ao consultório.
– Que bom
vê-la novamente! Seguiu o tratamento?
– Segui.
–Ficou
uns dias em casa, quieta, sem contato com o mundo, só escutando Legião Urbana
acústico e Renato Russo em italiano?
– Fiquei.
– Ainda
está W3?
– Não.
– Eu
sabia!!! Como se sente agora?
–Depois
desse claustro? Agora me sinto Noroeste: totalmente vazia, subitamente
desvalorizada, completamente empoeirada. Você precisa me ajudar,
doutor!
– Ai, meu
Dom Bosco…
(*) Esse
texto foi, originalmente, publicado na revista Veja Brasília e faz parte do
livro de crônicas Cidade dos Sonhos, lançado em 2015. (Foto/Ilustração: Blog-Google)
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CRÔNICA