Querida amiga,
*Por Ana Dubeux
Falo direto do futuro próximo. Aqui comigo, no meu pensamento, já é dia 21 de abril. Enfim, 6.0. Imagino a expectativa que estava para virar a década do cinquentenário. Lembra o que aconteceu em 2009? Pandora ainda manda lembranças. Dez anos para se recuperar daquele baque... E olha só: chega o coronavírus às vésperas dos 60 anos. Nada de achar que é sina. Talvez seja para nos lembrar o quão epopeica é sua jornada.
Pense num rio caudaloso, passando revolto, arrancando os troncos pelo caminho, levando tudo o que acha pela frente. Esse é o nosso tempo. Tá ligeiro, apressado, sem paciência e até indigesto. Mal dá para assentar tanta novidade. Enfim, achamos um sentido grande para a tecnologia, acusada de afastar as pessoas, veja só. Utilidade, a gente sabia que tinha. Mas significado mesmo, daqueles para achar bonito, só agora.
Graças a ela, haverá shows hoje. Lives de artistas bacanas, aplausos da janela, overposting de lindas paisagens no Instagram. Todo mundo compartilhando declarações de amor para você. Querida Brasília, há muito merecimento em sua história. Resiliente como o cerrado, entorta, mas cresce, abre flores, colhe frutos. Receba de bom grado suas homenagens. Você é mesmo nossa casa linda. Hoje estou confinada aqui, mas eu sinto mesmo que você é que está confinada em mim.
Tem visto os comerciais dos bancos? Não te lembra as propagandas de margarina de antigamente? As coisas vão e voltam. Mudam os atores, os nomes, os roteiros e... as pestes. Mas, no fundo, as pessoas gostam mesmo é de uma bem contada historinha de amor com sorrisos cativantes, pais jogando crianças pra cima, mães fazendo bolos com elas na cozinha. Meus amigos aquarianos estão sofrendo muito com isso, aposto. Viva os memes! O humor sempre salva...
Vale tudo em tempos de corona. Recebo e passo adiante o novo eco das redes: #tudopassa. Ouço Lulu cantando no ouvido: “Tudo sempre passará”. Todo mundo entoando o mantra budista (menos a emissora pública, é claro, que virou evangélica). Nada de muito novo no reino de Alice. Entre a insegurança, o medo e a incerteza, a gente abraça com força a pieguice com sentimentos genuínos de amor aos nossos e ao próximo. E segue acreditando em novos tempos. Bons tempos, em que espirro de autoridade não será notícia.
Estamos maratonando Covid-19. Espero genuinamente que só tenha uma temporada. Há episódios cansativos, como a politicagem absurda em meio à pandemia. Há personagens esdrúxulos, como o próprio presidente da República, que admite que está tudo bem se tiver de dar colo aos mortos. Há uma canseira absurda de ouvir sobre economia – quando foi diferente? Quando falaram em vida, humanidade...? Sim, vamos amargar uma imensa crise econômica. Só me pergunto quando não a vivemos. E os motivos foram vários: de corrupção às péssimas gestões. Talvez vivê-la por conta de um vírus seja a mais aceitável das razões.
Brasília, sua linda, estamos cansados. Mas vamos comemorar. Quando fizer 70, tudo será diferente. Ou não. Desejo que seus filhos tenham juízo e você tenha descanso. Quem for de champanhe, que estoure a rolha hoje. Quem for de reza, que acenda velas. Quem for meu, que fique comigo, em casa, para comemorarmos todos juntos logo adiante.
(*) Ana Dubeux – Editora-Chefe do Correio Braziliense – Fotos/Ilustração: Blog - Google
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