O professor Francisco de Assis
Rocha com as alunas Kathlen Rodrigues, Simone Sinoh, Louise Pereira, além da
professora Flora Milton, trabalham em conjunto na UnB para combater o novo
coronavírus
*Por Mariana Machado
UnB na guerra
contra a Covid-19Professores e alunos da Universidade de Brasília arregaçam as
mangas e mostram que o meio acadêmico tem força e vontade para ajudar a vencer
o novo coronavírus. Pesquisas, estudos e laboratórios reforçam o arsenal do
Distrito Federal
Enquanto
os profissionais da saúde e da segurança encabeçam a linha de frente no
enfrentamento ao novo coronavírus, cientistas e pesquisadores nas universidades
debruçam-se sobre estudos na busca de entender e ajudar, da forma que puderem,
na batalha contra um inimigo comum. Considerada uma das maiores do país, a
Universidade de Brasília (UnB) mostrou que está disposta a reforçar na batalha,
e atualmente trabalha com cerca de 120 projetos sobre a temática, que, somados,
representam R$ 75 milhões em pesquisas.
Segundo a
decana de Projetos Institucionais, Cláudia Amorim, foi obtido, até o momento, o
aporte de R$ 30 milhões por meio da Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito
Federal (FAP-DF). “Temos mais ou menos 1/3 dos trabalhos contemplados.
Para os demais, buscamos apadrinhamento de financiadores”, detalha. “São
projetos de vários campos, porque todos têm algo a contribuir. Temos pesquisas
desde a área da saúde à psicologia, comunicação, educação, engenharia,
antropologia, arquitetura e muito mais.”
Exemplo disso
é o Departamento de Farmácia, que emprestou uma máquina usada para diagnósticos
em testes da Covid-19 para o Laboratório Central de Saúde Pública do Distrito
Federal (Lacen) (leia Para saber mais). A ideia é que o equipamento auxilie
quando o DF atingir o pico de casos. O aparelho se soma aos outros três em
funcionamento. Fabiano Queiroz Costa, gerente de biologia médica do Lacen,
explica que a unidade montou um arsenal, pronto para atender às demandas de
exames, caso aumentem. Estão a postos mais quatro máquinas, e outras duas devem
chegar nos próximos dias, recém-adquiridas pelo Governo do Distrito Federal
(GDF). “Hoje, fazemos avaliação de mil amostras por dia. A gente está montando
uma estrutura prevendo um cenário mais dramático, com capacidade instalada para
mil amostras diárias”, garante.
Com a escalada
de casos, Fabiano agradece a ajuda da universidade. “Todo apoio é bem-vindo.”
Um aparelho como o que foi emprestado custa, em média, cerca de R$ 200 mil, mas
versões mais complexas podem chegar a R$ 500 mil, calcula o professor Francisco
de Assis Rocha, do Departamento de Farmácia. “O Lacen está indo muito bem,
conseguindo fazer os exames que chegam. Não sabemos quando será o pico em
Brasília, então cedemos a máquina por precaução”, pondera. “Minha máquina hoje
foi colocada em uma sala, preparada para o aumento de demanda. Precisando, ela
está pronta. Essa é a primeira vez que algo assim acontece. Uma pandemia nessas
proporções nunca ocorreu aqui em Brasília”, destaca.
Para o professor, o momento fez com que muitos
acadêmicos se manifestassem. “A universidade está muito preocupada em ajudar,
não só no diagnóstico.” Nefrologista, ele está desenvolvendo uma pesquisa sobre
o impacto da doença em pacientes renais crônicos. “São pessoas que, três vezes
por semana, fazem diálise. Grande parte é de idosos ou com problemas de
hipertensão e diabetes, e, como precisam fazer o tratamento, não podem ser
isolados. Então, vamos estudar como esse grupo de risco é afetado.”
R$ 30
milhões: Aporte recebido pela UnB para pesquisas sobre
coronavírus; R$ 75 milhões: Valor necessário
para viabilizar todos os estudos
Para saber
mais: PCR; Conhecida como PCR
(Polymerase Chain Reaction), o aparelho analisa as amostras de DNA colhidas da
garganta e mucosa nasal de pacientes, para identificar se há o vírus testado.
Em duas semanas,151 máscaras: A professora Andrea Santos e os alunos Alexandre Crepory e Jean Rolszt
trabalham na Faculdade de Tecnologia em projeto para combater o vírus
Um dos
reflexos da pandemia é a alta procura e, consequente, a falta de insumos para
profissionais da saúde, sobretudo máscaras de proteção. Uma alternativa é o uso
de face shields, máscara com barreira de acrílico que protege e evita
contaminações. Foi essa possibilidade que movimentou a professora Andrea
Santos, do Departamento de Engenharia de Produção da Faculdade de Tecnologia da
UnB. Ela reuniu os alunos e, juntos, no Laboratório Aberto da universidade,
deram início à produção dos equipamentos para doação à rede pública de saúde.
Em duas
semanas, eles confeccionaram 151 máscaras do tipo. “Era agora ou nunca. Se
pensasse demais, não fazia”, declara. “Foi um plano de contingência. A gente
tinha feito o projeto inicial de pesquisa, e partimos para a produção, que é
temporária e de emergência. Nosso papel não é ser uma fábrica, mas, em virtude
do coronavírus, vimos a necessidade de atender prontamente à comunidade.”
Até o momento,
as doações foram para o Hospital Regional da Asa Norte (Hran), Hospital
Odontológico de Taguatinga, Hospital Regional do Gama (HRG), Instituto de
Química da UnB e Hospital Materno Infantil de Brasília (Hmib). A equipe,
composta por 10 alunos dos cursos de engenharia de produção, mecânica e
mecatrônica, trabalha em três turnos para aumentar a produção, feita graças aos
recursos do laboratório e de iniciativas privadas. O objetivo agora é ter 30
alunos na equipe.
Estudos
práticos: Uma das perguntas mais feitas em relação à Covid-19
é sobre medicações eficazes contra o vírus. O uso da hidroxicloroquina, por
exemplo, tem sido amplamente debatido, dentro e fora do meio científico. Para
verificar a real eficácia deste e outros medicamentos, a professora do
Departamento de Medicina da UnB e chefe do serviço de hematologia do Hospital
Universitário de Brasília (HUB), Flávia Xavier, dará início a uma pesquisa que
vai avaliar o uso da hidroxicloroquina, azitromicina e imunoglobulina em
pacientes de coronavírus internados em estado grave.
O estudo,
aprovado pela FAP, aguarda a autorização do Comissão Nacional de Ética em
Pesquisa (Conep). “Estamos ouvindo falar muito do assunto na mídia, mas, para
colocar em prática uma medicação, são necessários ensaios clínicos randomizados
para se ter maior evidência”, explica. Segundo a médica, será avaliado um grupo
de 317 pacientes, submetidos às substâncias aleatoriamente. O orçamento
necessário está previsto em R$ 2,2 milhões e terá colaboração do Hran e de 48
hospitais universitários da rede Ebserh (que administra o HUB).
O objetivo é
concluir tanto a eficácia dos compostos quanto os efeitos adversos. No caso da
hidroxicloroquina, isso inclui arritmia cardíaca e retinopatia. “O surto está
chegando muito rápido e está causando uma resposta inflamatória sistêmica no
paciente, o que leva a intubações traqueais muito longas. Se todos os leitos
estão ocupados ao mesmo tempo, isso pode levar a uma sobrecarga do sistema”,
alerta. “Os estudos clínicos visam descobrir como encurtar o tempo de UTI e
conseguir dar alta mais precocemente.”
(*) Mariana Machado - Fotos: Ana Rayssa/CB/D.A.Press - Marcelo Ferreira/CB/D.A.Press - Correio Braziliense
Tags
CoronaVírus