General da reserva Paulo Chagas
"As fake news têm que ser
investigadas, estudadas, definidas e devidamente enquadradas como crime, mas
não por intermédio de um inquérito ilegal"
O senhor, que foi alvo do
inquérito das fake news no ano passado, como avaliou o que ocorreu na última
quarta-feira, com mandados de busca e apreensão e determinação de depoimentos
de deputados atuantes nas redes sociais? É uma situação contraditória, porque o inquérito é,
e continuará sendo, irregular, ilegal e inconstitucional. A
ex-procuradora-geral da República Raquel Dodge, por causa disso, pediu o seu
arquivamento, o atual procurador-geral, Augusto Aras, não se manifestou contra,
mas, agora, acha que estão exagerando! Por outro lado, ninguém tem dúvidas de
que essa história de fake news (que é crime, mas não está definido como crime)
tem que ser investigada como um todo, sem viés político, partidário ou
ideológico para desmascarar quem se vale ou se valeu deste artifício para levar
vantagem nas eleições e destruir reputações. É por isso que fui a favor da CPI
que se propôs a investigar e separar o joio do trigo. Fui criticado por isso!
As pessoas confundem o direito de opinião com fake news. A opinião de alguém
pode estar errada ou equivocada, mas não é mentira, nem tampouco tem autoria
desconhecida.
As fake news têm que ser
investigadas, estudadas, definidas e devidamente enquadradas como crime, mas
nao por intermédio de um inquérito ilegal.
O que aconteceu com a investigação
envolvendo o senhor? Não sei e acredito que ninguém saiba, porque tramita em sigilo de
justiça. Até hoje não fui informado do que estou sendo acusado para figurar na
relação de "suspeitos". O que eu escrevo, eu compartilho e assino e é
o que penso, se, ao expressar a minha opinião, na visão da justiça, fui áspero,
grosseiro, inconveniente ou agressivo estou pronto para assumir as
consequências, mas, com certeza, ter opinião não é fake news.
O presidente Jair Bolsonaro disse
que não é possível aceitar essas medidas “pacificamente” e o deputado Eduardo
Bolsonaro afirmou que é uma questão de tempo até haver uma ruptura
institucional. O que pode acontecer? Na minha opinião não vai acontecer nada. Acredito que vai prevalecer o
bom senso, e as partes, os Três Poderes, vão cair em si e nos limites das suas
responsabilidades, principalmente os ministros do STF que, há muito, têm
extrapolado das suas atribuições e invadido áreas que não são suas. Os
ânimos estão exaltados, vejo muito alarde com fisionomia de ameaças. O deputado
Eduardo Bolsonaro disse que a ruptura é apenas uma questão de tempo e que uma
medida enérgica deve ser tomada, mas não esclareceu qual seria essa medida,
tampouco quem iria tomá-la. O presidente Bolsonaro também disse que o
"limite" foi atingido e que tem as armas da democracia, só não
revelou que limite é este e quais armas da democracia tem nas mãos e como
pretende usá-las. Parece que o presidente do Congresso e o ministro Ramos já
estão em campo para restabelecer o diálogo e pacificar o ambiente.
Se ficar comprovado que o
presidente interferiu na Polícia Federal, como denuncia o ex-ministro Sergio
Moro, Bolsonaro terá condições de continuar governando o país? O ex-ministro Moro não disse, nem poderia dizer,
que houve interferência indevida na PF. O que, na minha opinião, ficou clara
foi a "intenção" do presidente de ter algum conhecimento sobre
investigações em curso, o que acabou não ocorrendo por força do tumulto criado
com o barulhento pedido de demissão do ministro. Não houve crime, portanto, não
pode haver consequências judiciais.
Acredita que os militares na ativa
apóiam o presidente Bolsonaro? Os militares da ativa e da reserva, individualmente, como eleitores,
comportam-se como cidadãos iguais aos demais, têm opiniões, acompanham as
evoluções da política na sua tumultuada passarela e tomam posições. Por outro
lado, em conjunto, como instituições, as Forças Armadas, por dever
constitucional, acompanham tudo que se passa na política, mas não se envolvem
com ela. Seu comprometimento é com a manutenção da lei e da ordem e com a
garantia do ambiente conveniente para o pleno funcionamento de todas as
instituições republicanas. Nada além e sem preferências por qualquer dos
Poderes.
Apoiariam uma intervenção no STF e
no Congresso? Certamente
que não!
Se fosse para fazer um diagnóstico
do país hoje, o que o senhor diria? E qual remédio receitaria? Eu diria o óbvio. Estamos vivendo três crises ao
mesmo tempo, uma importada, que atingiu o mundo todo, a pandemia; outra, também
mundial, a econômica, que vem na esteira da pandemia; e uma terceira, política
e institucional, provocada pelo oportunismo dos nossos políticos, em especial
os que exercem cargos executivos, que se empenham para aparecer e tirar algum
proveito das outras duas crises. O presidente Bolsonaro subestimou a ameaça do
vírus e acabou sendo ultrapassado pelos governadores porque não se antecipou ao
problema. O governo federal tinha que ter montado um plano geral de ação,
centralizado, como muito bem salientou o ministro Pazuello, cuja execução seria
descentralizada e adaptada às circunstâncias de cada região. É o que se está
tentando fazer agora, mas com indevido retardo. Para tudo há soluções e,
quaisquer que sejam elas, a sua implementação começa com diálogo, foco,
responsabilidade e comprometimento de todos os envolvidos. É o que nós, o povo,
temos que exigir daqueles a quem elegemos para nos representar e para conduzir
a nação.
Ana Maria Campos - Coluna
"Eixo Capital" - Correio Braziliense
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