Eu nunca ouvi Bolsonaro dizer obrigado a
alguém." Após a delação do ex-ministro Sérgio Moro, outras testemunhas
começam a tomar coragem e decidem dizer aquilo que, segundo o discípulo João,
liberta a alma. O delator da vez é o empresário Paulo Marinho. E o que ele
diz é ainda mais grave do que a delação de Moro. A operação Furna da Onça
não acabou. Está apenas começando.
Por Victor Dornas
De onde surgem as milícias? Nos quadrinhos, quando uma cidade
é sitiada, se insurge então a figura anárquica de um vingador mascarado que
salva os inocentes. A vida real é um tanto mais complexa do que isso, pois na
política, nada é tão ruim que não possa piorar. O cenário do caos é ainda mais
propício ao surgimento de mais impropérios morais.
Na realidade, diferentemente da maior parte das ficções, a figura
anárquica que se anuncia como aquela que repreenderá o mal, se torna tão ruim
quanto ou até pior. Na realidade, a imagem do vigilante valente, destemido e
capaz de resolver sozinho todos os males da humanidade, se dá apenas na frieza
da lei, no debate civilizado. As milícias, portanto, lá atrás surgiram dizendo
que resolveriam aquilo que o Estado inepto não conseguiu resolver, porém desde
o início, ambicionam o controle total da situação. Por isso, assertivamente,
são terroristas.
Paulo Marinho, agora encorajado pelo primeiro tiro dado pelo ex-juiz
Sérgio Moro testemunha que o filho investigado do presidente, Flávio Bolsonaro,
o senador que recorreu dez vezes ao Supremo para tentar impedir que investiguem
o esquema criminoso mantido em seu gabinete por assessores, na verdade teria
sido informado pela Polícia Federal, ainda no ínterim do pleito presidencial de
2018, acerca do início das investigações sobre Fabrício Queiroz e cia. O
fato, por si só, já seria escandaloso, porém reserva ainda uma série de
agravantes.
Caso a fala de Marinho seja verdadeira, ainda não se sabe quem foi o
delegado que transmitiu as informações ao filho do presidente, porém consta na
chefia de operações correlatas o nome de Augusto Ramagem, aquele que culminou
na saída de Sérgio Moro. Outra questão ainda mais preocupante é que, em tese, a
polícia teria protelado as investigações para que as eleições não fossem
influenciadas, haja vista que Queiroz também pertenceu ao gabinete do ainda
deputado Jair Bolsonaro. Trata-se, em tese, do aparelhamento político da PF e
manipulação eleitoral. No regime presidencialista, nada é mais grave do que
fraude eleitoral.
O leitor mais fiel, que me acompanha nessa coluna, já vem sendo alertado
há tempos sobre o problema da politização da PF e como isso serve para mascarar
malfeitos terríveis usando-se o sucesso de investigações como a própria
lava-jato. O testemunho do empresário Paulo Marinho ainda é deveras recente,
porém pode-se dizer que talvez seja o início de uma onda de informações
provindas de testemunhas que tinham medo de contrariar os interesses da
milícia.
O processo de delação em pirâmide começa dessa forma. As figuras
mais fortes, como Sérgio Moro iniciam o processo. Outros menores, que agora se
sentem menos intimidados, doravante passam a falar também.
E ainda aqueles que, com o perdão da grosseria do termo, teriam o rabo
preso, negociam delações para tentarem amortizar suas penúrias e
ilícitos. O fato é que, mais uma vez, aventa-se a hipótese da deposição,
caso comprava a ligação de tudo isso com Jair Bolsonaro que, se não bastasse o
envolvimento de sua família com tanta coisa errada, decide, com a conivência de
boa parte do alto escalão das forças armadas, fomentar o caos com teses
negacionistas em plena pandemia.
Outros presidentes foram depostos por muito menos do que isso.
Quem segura Bolsonaro na cadeira presidencial? Rodrigo Maia, o emissário
do centrão. O suposto inimigo que Bolsonaro colocou na chefia do congresso.
Muita informação? Sem dúvida. A verdade, caro leitor, dita pelo discípulo João,
não se resume a chavões populistas de segunda linha. A verdade costuma ser
complicada, dura de ouvir. Mas necessária. Sempre necessária.
Victor Dornas - Colunista do Blog do Chiquinho Dornas
- Fotografia: Google.