Por Victor Dornas
Há um fenômeno que
antecede as instrumentalizações jurídicas chamado Segredo Industrial.
Diferentemente das patentes que foram criadas justamente para transformar o
segredo industrial numa oportunidade de negócio com escopo social entre inventores
e governantes, o segredo industrial faz parte da natureza humana, uma vez que
quando alguém descobre algo com valoração relevante, a tendência natural é de resguardo
dessa informação. Isso vem lá dos primórdios, portanto, nas estratégias de guerra
entre tribos e não pode ser extinguido.
Com o desenvolver das
relações sociais, a modernização da instrumentalização da máquina estatal,
criou-se então formas de cooperação onde inventores adquirem vantagens em troca
de divulgação de suas informações, como no caso das patentes e dos acordos de
transferência de tecnologia.
Quando o presidente Bolsonaro diz que o Brasil
somente firmou contrato de transferência de tecnologia com a Inglaterra e não
com a China e seu laboratório Sinovac, não se sabe se isso foi por má vontade
de alguma das partes, uma vez que o presidente tem por hábito hostilizar a
China, mas se sabe, com certeza, que se existem acordos de transferência
tecnológica entre países no caso da vacina anti covid 19 é sinal de que os
laboratórios não estão trocando informações entre eles, ou seja, estão
competindo por dinheiro.
Para muitos isso soaria
óbvio, contudo é interessante refletir que, na hipótese dos laboratórios agirem
em cooperação e não em competição desde o início, talvez esta e outras inúmeras
doenças já tivessem sido curadas. Utópico? Em certo ponto, não, pois a quebra
do segredo industrial depende sempre de uma boa negociação, de agentes
diplomáticos bem treinados.
O clima de rixa entre
nações certamente inibiu essa cooperação. Quando homens do poder, como
presidentes, por exemplo, começam a se hostilizarem em público, não se enganem
pela ânsia de querer figurar do lado certo da história, uma vez que a Rússia é
uma autocracia e a China uma ditadura. Todos perdem!
A competição é a mola
primordial do capitalismo, contudo nem tudo pode ser resolvido no modelo de
mercado. Para fins de vacina, por exemplo, não me parece nem um pouco forçoso
considerar que um clima mais ameno no cenário geopolítico poderia acelerar
bastante o progresso se houvesse de fato troca de informações.
A ironia da história é
que sempre que há segredo industrial, há também espionagem industrial. Todas as
vacinas mais famosas que estão sendo testadas, a chinesa, a inglesa e a russa,
provocam febre imediata nos voluntários. A febre é um sintoma comum em vacinas
de qualquer natureza? Sem dúvida, porém, talvez essas vacinas não sejam assim
tão diferentes umas das outras e estejam explorando basicamente as mesmas
possibilidades.
E caso assim seja, por
qual motivo há a necessidade de acordos de transferência tecnológica? O presidente russo
Vladimir Putin anunciou hoje que a vacina russa está pronta. As pessoas estão
receosas, pois especialistas (?) dizem que o processo de testes feito pela
Rússia não gozam da publicidade esperada. Enfim, numa corrida por dinheiro,
ainda que se diga sempre que não há interesse de lucro (se fosse assim, por
qual motivo fariam acordos de exclusividade?), é natural que as pessoas estejam
receosas sobre todas essas vacinas.
Além disso, ainda há o
problema de testagem da própria covid. Uma pessoa que está contaminada com um
vírus não pode ser vacinada para aquele mesmo vírus, sendo certo que a vacina
deve ser precedida desta certeza de inexistência de contágio. Sabe-se, porém,
que a tal testagem com mais acuidade é de difícil acesso, ou seja, a maioria da
população não sabe sequer se tem o vírus ou não. Em outras palavras, além da
certificação de eficácia de todas essas vacinas, há também toda a dificuldade
em distribuí-las, uma vez comprovada sua eficácia, por todas essas razões de
identificação de público alvo.
O segredo industrial é
uma marca da alma humana, que tem por atavismo a competição. Num cenário de
mercado, onde a competição aperfeiçoa os produtos, tudo isso é muito belo. Num cenário onde a
presença de grandes grupos e do próprio estado é indispensável, os fenômenos
econômicos são mais complexos.
O segredo das vacinas é
que elas são tão complicadas quanto a convivência humana.
(*) Victor Dornas - Colunista do Blog Chiquinho Dornas ,fotos ilustração: Blog-Google.
(*) Victor Dornas - Colunista do Blog Chiquinho Dornas ,fotos ilustração: Blog-Google.