Os hipertensos precisam ter cuidados redobrados
para não se infectar com a covid-19. Esse grupo está mais propenso a
desenvolver a forma mais grave da doença causada pelo novo coronavírus ou ter
sequelas posteriores à infecção. Em entrevista ao CB.Saúde — parceria do
Correio Braziliense com a TV Brasília — de ontem, Maira Polcheira, médica
nefrologista do Centro Especializado em Diabetes, Obesidade e Hipertensão
(Cedoh), disse que, para evitar ou amenizar as complicações, é preciso que os
pacientes com essa comorbidade mantenham o tratamento em dia.
A especialista explicou à jornalista Carmen Souza
que ainda não se sabe por que o hipertenso é mais vulnerável, mas que as
inflamações crônicas causadas no organismo afetam o coração e isso o torna um
paciente de risco para a covid-19. Além disso, Maira acredita que há
subnotificação de pessoas com pressão alta no Brasil. “Como a hipertensão, na
maioria das vezes, não tem sintomas, se nós não tivermos o hábito de fazer
consultas de rotina, a gente só vai diagnosticar quando ela estiver numa
situação muito grave”, disse.
A médica esclareceu que, para evitar ou tratar a
pressão alta, é importante adotar um estilo de vida mais saudável e ativo, além
de diminuir o consumo de álcool, cigarro e sódio. Nesse sentido, a meditação
pode ser um aliada, ainda mais no período de pandemia e isolamento social.
Confira os principais trechos da entrevista: A
cada 10 brasileiros adultos, três têm hipertensão. É uma doença crônica e,
provavelmente, a mais prevalente no Brasil, certo? Isso. Essas
estatísticas variam um pouco. A gente tem dados do Vigitel —que compõe o
sistema de Vigilância de Fatores de Risco para doenças crônicas não
transmissíveis (DCNT) do Ministério da Saúde — de que quando se entra com
contato com as pessoas em casa e elas informam que têm hipertensão, a
estimativa é de que cerca de 25% da população brasileira sofra com pressão
alta. Mas, quando a gente associa pacientes que se declaram hipertensos àqueles
que usam medicamento para hipertensão, esse número chega a 30%. Além disso,
sabemos que, à medida que se vai envelhecendo, essa incidência aumenta ainda
mais. Então, acima dos 60 anos, chega-se a 60% da população.
Há subnotificação? Sim. Diagnóstico de
hipertensão deveria ser feito por uma consulta de rotina que o paciente deveria
realizar. Como a hipertensão, na maioria das vezes, não tem sintomas, se nós
não tivermos o hábito de fazer consultas de rotina, a gente só vai diagnosticar
quando ela estiver numa situação muito grave.
No último ano, a gente tem percebido que a
hipertensão também é uma condição que deixa as pessoas mais vulneráveis em
relação à covid. Posso dizer que, no universo dos adultos brasileiros, pelo
menos três de cada 10 estão mais vulneráveis à covid-19? Sim. Ainda não se
sabe exatamente por que o hipertenso é mais vulnerável. O que se verificou é
que, dos indivíduos infectados e com complicações, o número de hipertensos era
muito maior em relação a indivíduos saudáveis ou com outras doenças. A
hipertensão é uma doença que causa uma inflamação crônica no organismo e que
acaba afetando o coração. E o coração afetado faz com que esse indivíduo fique
mais vulnerável às complicações da covid, que também causam uma inflamação
crônica.
Ter hipertensão, então, é uma condição que
dificulta o tratamento de covid-19? A hipertensão está muito associada às
doenças cardiovasculares, especialmente o infarto, ou o AVC, mas também pode
levar a outros quadros. Esse quadro de inflamação crônica que o indivíduo vai
desenvolvendo ao longo da vida e liberando substâncias no organismo que
favorecem a trombose e as isquemias disseminadas, por exemplo, fazem com que
esse indivíduo se torne mais suscetível a desenvolver as complicações da covid.
Por isso, é fundamental que esse indivíduo esteja tratando a hipertensão, com a
pressão controlada.
A gente pode imaginar alguma relação com sequelas
da covid? Se a hipertensão favorece o surgimento de mais complicações, é
esperado que esse indivíduo também venha a ter mais sequelas após a infecção.
Ainda não existe uma correlação muito certa, mas, em princípio, é esperado,
sim.
Os idosos, durante todo esse tempo de pandemia,
ficaram em casa, isolados. Imagino que o controle da hipertensão e de
outras doenças crônicas acabou sendo comprometido, certo? Em primeiro
lugar, é muito importante a questão da mudança de estilo de vida. A gente sabe
que a hipertensão está relacionada a uma dieta não saudável, com excesso de
sal, gordura, sedentarismo, com o tabagismo, consumo elevado de bebidas
alcoólicas e o próprio estresse — que aumentou muito durante a pandemia. Então,
para que a gente tenha um tratamento adequado, é muito importante que esse
paciente, seja idoso, seja jovem, procure adaptar-se aos hábitos mais
saudáveis. Ou seja, diminuir o consumo de sal, se possível, cessar o tabagismo,
diminuir o consumo de álcool.
Outro público em que também encontramos
covid-19 e hipertensão com mais frequência são os jovens adultos. Como a
gente pode relacionar isso? Estima-se que a hipertensão aumentou no
público mais jovem em virtude do estilo de vida. É um público que tende a comer
mais fast-food, alimentos gordurosos e ricos em sódio. Eles têm se tornado mais
sedentários e estão utilizando mais mídias, videogames, televisão e celular,
deixando de lado a atividade física. Eles ainda mantêm os hábitos de cigarro,
de ingerir muita bebida alcoólica. A obesidade também está relacionada.
Antigamente, o jovem era mais ativo e saudável. Agora, adotaram esse estilo de
vida menos saudável, o que favorece a hipertensão.
Alguns estudos mostram que, talvez, a infecção pelo
coronavírus possa aumentar o risco de surgimento da hipertensão durante a
gravidez. Você tem observado isso? É uma realidade? Temos observado que as
gestantes que foram infectadas pela covid desenvolveram hipertensão durante a
gravidez. Ainda não se sabe o que está provocando o aumento da hipertensão, mas
acredita-se que a própria questão inflamatória causada pela covid-19, que acaba
levando ao estreitamento dos vasos sanguíneos, que leva à hipertensão, tem
provocado a hipertensão na gestação. A maior complicação é o risco do parto
prematuro.
Os profissionais de saúde dizem que as grávidas
precisam se vacinar. Queria que a senhora fizesse uma correlação entre a
vacinação da gripe e da covid-19. Elas precisam muito se vacinar. Não
existe nenhuma interferência em relação à vacina da gripe com a da covid-19. O
que é solicitado é que tenha um intervalo de, pelo menos, 30 dias entre uma
vacina e outra. Até para que se tenha uma avaliação melhor dos efeitos e
reações a uma ou outra vacina. Isso é importante, epidemiologicamente, para
tentar identificar qualquer problema que algum tipo de vacina possa gerar. Mas
quem vacinou contra a covid pode, sim, vacinar contra a gripe respeitando esse
intervalo de 30 dias.
E as crianças, têm sido diagnosticadas com
hipertensão com mais frequência? Sim. Uma das principais causas de
hipertensão na infância é a obesidade. A gente tem visto o aumento da obesidade
infantil muito relacionado ao aumento do sedentarismo e do consumo de
fast-foods. Geralmente, esses quadros se resolvem apenas com a adoção de
hábitos de vida saudáveis e perda de peso.
A hipertensão pode ser a porta de entrada para
outras complicações? Ela é principalmente relacionada a doenças
cardiovasculares. Por exemplo: o AVC, popularmente conhecido como derrame.
Estima-se que 80% dos casos de AVC estão relacionados à hipertensão não
controlada.
Quais são os sintomas e sinais de alerta de que
precisamos ficar atentos à pressão alta? Um dos principais fatores
complicadores da hipertensão é: ela é uma doença silenciosa. Na maioria das
vezes, o indivíduo não percebe que a pressão está elevada, só quando ele desenvolve
algum tipo de doença relacionada. Por isso, é fundamental o acompanhamento.
Principalmente a partir dos 40 anos, que é quando aumenta a incidência de
hipertensão. Faça uma consulta de rotina pelo menos uma vez ao ano para avaliar
a pressão e a glicemia.
Na questão da vacinação, não é todo hipertenso que
faz parte do grupo de comorbidades, certo? Isso. São os hipertensos
considerados estágio 3, que têm o nível de pressão acima do 180 por 110; os
hipertensos que têm outras comorbidades ou que já têm lesão de órgão, ou seja,
alteração cardíaca ou de vasos.