Depois de retalharem, a golpes de facão, as Dez
Medidas contra a Corrupção propostas pelo Ministério Público Federal e
avalizadas por mais de 2 milhões de cidadãos de todo o país, esse pequeno
grupo, mas muito bem articulado, que se diz representante do povo, conseguiu,
com a ajuda prestimosa daqueles ministros parciais, instalados no Supremo, pelo
lulopetismo, quebrar as pernas da medida, já em vigor, da prisão em segunda
instância, carimbando com o selo de inocente o mais danoso conjunto de
corruptos já surgidos na República.
Sob a presidência de um antigo advogado do Partido
dos Trabalhadores, o Supremo, sem qualquer pudor legal, derrubou em 2019, a
possibilidade de prisão de sentenciados em segunda instância, modificando uma
decisão já adotada por essa mesma corte em 2016 e feita sob medida para
beneficiar o chefão do PT. Note-se aqui que, sem a dobradinha STF/ Congresso,
dificilmente essa verdadeira contrarreforma teria avançado em pautas que, sem
qualquer dúvida, foram tecidas para permitir o regresso do antigo status quo,
representado pelo Estado corporativista e infestado por sanguessugas.
Com essa decisão, muitos dos que se encontravam
trancafiados por malversação dos recursos públicos ganharam novamente as ruas,
onde juntaram forças para voltar ao antigo métier da pilhagem. Não pensem que a
reação desses grupos ávidos por impossibilitar o combate à corrupção é feito de
modo amador. Pelo contrário, existe nesse ardil, coordenação e articulação
metódicas envolvendo os diversos atores desses intentos, muitas vezes
realizadas em reuniões informais, jantares e confraternizações onde esses
aficcionados do embuste entabulam suas melhores táticas, conferindo, a cada uma
delas, uma falsa roupagem republicana para melhor serem deglutidas pelos
incautos.
Depois da decisão marota do ministro Fachin,
considerando o ex-juiz Sérgio Moro incompetente para processar e julgar o
ex-presidente Lula, nos casos relativos ao Triplex do Guarujá, do Instituto
Lula e do sítio de Atibaia, essas ações foram escandalosamente anuladas e
remetidas para o baú sem fundo da justiça em Brasília, onde deverá ser recomeçada
do zero.
Com isso, o grande intento de tornar Lula um Ficha
Limpa se cumpriu, conforme já era tramado há tempos nos gabinetes da capital,
entre a junta dos mais caros advogados do país, ministros do Supremo e todo o
conjunto de parlamentares empenhados nessa trama. Com essa decisão e com a
estampa provisória de inocente, o ex-presidente poderá concorrer e disputar os
cargos que quiser até o fim desse século, uma vez que a condenação final por
essa penca de crimes jamais ocorrerá até lá.
As pedras finais que vão configurando toda essa
estrada de retorno dessa turma têm sido colocadas, cautelosamente, para inflar
as ruas e melindrar o que ainda resta de indivíduos que creem em coisas como
ética pública e probidade. Depois desses descalabros tramados à noite e
adotados à luz do dia, em horário de expediente, os ministros parcialistas do
Supremo puderam, finalmente, dar o tiro de misericórdia na Operação Lava Jato,
ao julgar a suspeição do ex-juiz Sérgio Moro, feita por esse magistrado de
primeira instância e confirmada por uma dezena de outros juízes posteriormente.
Assim, foi feito um rombo nas decisões anteriores,
abrindo uma enorme brecha para a anulação de todas as condenações anteriores de
Moro, relativas às estripulias de Lula e de seu grupo, num veredito tão e
espantoso surrealista, que nem mesmo os magistrados italianos da Operação Mãos
Limpas, que passaram pelo mesmo processo de desmanche, poderiam imaginar
existir.
Do outro lado da Praça dos Três Poderes, os
parlamentares simpatizantes dessa contrarreforma, cuidaram, ainda, de afrouxar
a Lei de Improbidade Administrativa, considerando que a punição dos maus
gestores públicos só ocorrerá quando houver intenção de dolo, comprovadamente
feito. Abrindo oportunidades ainda para a volta do nepotismo e outras práticas
antiéticas já banidas da vida pública. Sob o argumento de que a Lei de
Improbidade deixava os gestores “engessados”, o próprio presidente da Câmara
dos Deputados cuidou, pessoalmente, para que os pontos positivos dessa lei
fossem afrouxados ou perdessem sua eficácia.
Nesse mesmo plenário, os parlamentares cuidariam
ainda de aprovar modificações pontuais na Lei da Ficha Limpa, de modo a impedir
que seja declarado inelegível por oito anos o político que tiver suas contas
rejeitadas, transformando essa punição em uma multa simbólica. Fica o dito por
não dito, e voltamos todos ao passado que imaginávamos ter deixado num passado
não muito distante. Há ainda uma série de outras medidas, claramente
regressivas e antirrepublicanas, que também devem entrar nas pautas de votação
do Congresso e em julgamento no plenário do Supremo, e que cuidarão de aplainar
todo o trajeto para o retorno triunfal do antigo regime, sob o olhar
complacente de todos os cidadãos votantes, emudecidos e inertes.