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Que elas possam apenas existir

Que elas possam apenas existir

 

Ao longo da semana, talvez nada tenha chamado mais atenção do que a desistência da ginasta Simone Biles de disputar a maioria das provas nas Olimpíadas de Tóquio. O motivo alegado foi o descompasso entre saúde mental e física. Ainda que em condições físicas para levar mais uma coleção de medalhas para a casa, o desgaste emocional ou alguma outra condição de comprometimento mental fez com que a americana tomasse a corajosa decisão de dar esse passo para trás.

 

Quando desistir é sinal de coragem? Como uma desistência pode ser, na verdade, uma atitude de resistência a uma pressão, muitas vezes, desumana? Quantos dias, meses, anos uma pessoa pode aguentar com a faca no pescoço, obrigando-a a se superar, a insistir, a lutar, a tentar? Não sei muitos detalhes da história, do diagnóstico, dos problemas ou mesmo da vida dessa jovem de impressionante talento. Mas sei que ela não é a única a se sentir assim.

 

Na realidade de esforços sangrentos dos atletas, são muitos e muitos os que vivem intimados a ser mais do que são ou do que querem ser. Na vida de gente “comum”, somos igualmente submetidos a duras condições de pressão, o tempo todo, por motivos diversos. Diria que, para algumas pessoas, em especial a população excluída e marginalizada, a vida é uma maratona diária tão pesada que pode levar a um quadro de profunda exaustão, além de tristeza, dor, angústia, ansiedade.

 

Mas não posso deixar de pontuar também a magnitude de quem não desiste. Podemos dizer que os atletas brasileiros, a maioria deles sem os milhões de patrocínios destinados injustamente a uns poucos e selecionados garotos-propagandas, são o pódio da resistência.

 

Ver a ginasta brasileira Rebeca Andrade, uma menina negra (lembrando que mulheres pretas são a população mais vulnerável do Brasil), levar o Baile de Favela para o solo de um ginásio olímpico do outro lado do mundo e voltar com uma medalha pendurada no pescoço me faz lembrar que boa parte da população não tem outra opção senão resistir dia após dia. E assim é feito. Rebeca e sua mãe foram e são resistentes, além de carregarem tantas outras virtudes e talentos.

 

Minha torcida é que meninas como Simone e Rebeca conquistem um direito que extrapola a desistência. Que elas possam apenas existir e gozar a vida com plenitude, liberdade, justiça social e equidade de gêneros.


Ana Dubeux – Editora-Chefe do Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog – Google– Correio Braziliense




 

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