“Estamos prestes a concluir o processo e licitar o
projeto de reforma (do Teatro Nacional)”, destacou ao Correio o secretário de
Cultura e Economia Criativa, Bartolomeu Rodrigues. De acordo com ele, mesmo
durante a pandemia, a pasta manteve ações de suporte ao setor cultural, e
ressaltou que, a partir da Lei Aldir Blanc, a secretaria começou a construir o
novo modelo de editais do Fundo de Apoio à Cultura (FAC), inclusivos e
descentralizados. “Agora, ninguém mais está invisível”. Adiantou também que em
breve, será lançado o DFPlay, uma plataforma digital que dará suporte ao Festival
de Brasília do Cinema Brasileiro.
Com o avanço da vacinação, os eventos culturais começam a receber mais público. Apesar disso, produtores e artistas ainda sofrem com o longo período de inatividade. Como a Secretaria de Cultura atua para mitigar esse problema? Essa preocupação surgiu no momento em que entramos em estado de pandemia. E, desde então, pode verificar em pesquisas de atuação da pasta, foi uma ação atrás da outra. Não houve um só mês sem fazer nada, nem de oferecer opções de algum tipo de auxílio para a classe artística, iniciando-se por uma série de premiações com recursos do Fundo de Apoio à Cultura, o FAC, e outras fontes da secretaria. E por que iniciamos com premiações? Por ser uma modalidade mais simples e rápida, sem necessidade de o beneficiário prestar contas daquilo que recebeu.
Mas, reconhecemos, não alcança a todos nem foi
suficiente para manter o ritmo das atividades. Teatros foram fechados,
espetáculos cancelados e a agenda de eventos, que empregam muita gente, ficou
na espera indefinida. Circos de lona, famílias inteiras sem fonte de renda,
sobrevivendo da solidariedade das pessoas, recebendo quentinhas para comerem...
Aquilo foi demais! Depois, tivemos a Lei Aldir Blanc para somar. Até hoje, as
repercussões positivas desse auxílio são sentidas e nos serviram para
compreender e ir mais a fundo nos problemas de toda a cadeia da arte e cultura
do Distrito Federal.
Posso afirmar que foi a partir da Aldir Blanc que
passamos a construir o novo modelo de editais, inclusivos e descentralizados,
do FAC. Tivemos um choque de realidade e descobrimos novos interlocutores para
entender a cultura local, além dos tradicionais, com os quais dialogamos há
décadas e que, de certa forma, não permitiam que enxergássemos o outro lado.
Agora, ninguém mais está invisível.
Há também uma demanda represada de eventos culturais na cidade, quais
projetos o senhor destaca para a agenda 2021/2022? Enquanto
discutíamos as linhas do FAC este ano, tivemos essa preocupação em mente.
Eventos e festivais importantes, que compõem parte expressiva da rede da
economia criativa — e aí se incluem as festas juninas e o carnaval — atingiram
o limite para garantir um mínimo de planejamento com vistas à progressiva
liberação de eventos para o final do ano e 2022. No caso do carnaval, onde é
crítica a situação de muitas agremiações, nos antecipamos com um edital de
criação da Escola do Carnaval que, na prática, significa um “esquenta” para o
que esperamos ser o retorno total em 2023.
E, para grandes eventos, a garantia de
investimentos a projetos que atendam aos protocolos de reabertura e tragam de
volta o público ansioso por entretenimento. Esta foi a grande vantagem de não
nos acomodarmos durante a pandemia. Criamos condições para a retomada e, mais
que isso, o reconhecimento de que o setor cultural é imprescindível, basilar,
ao processo de desenvolvimento social e econômico. No pós-pandemia, não tenho
dúvida quanto a isso, será a cultura quem vai tirar o brasileiro do divã.
O Festival de Brasília do Cinema Brasileiro do ano passado foi
totalmente on-line. Para 2021, o senhor sinaliza com um formato híbrido. Como
seria? A rigor, a edição número 54º do Festival será
virtual, conforme determina o edital que estabeleceu as regras de seu
funcionamento este ano. O que estou propondo é uma abertura no sistema híbrido,
aproveitando o fato de que o Cine Brasília está pronto para reabrir as portas,
depois de um longo período fechado. Só para não perdermos aquele gostinho de
festival. E também porque o evento ganhou uma importância enorme no cenário
nacional, atingiu maturidade e mostrou ao Brasil e ao mundo que o cinema está
aí, embora aos trancos e barrancos, vivinho da silva. Espero que seja possível.
Este ano, o Festival vai ser visto por mais de 1 milhão de pessoas, segundo as
estimativas. Teremos de repensar, daqui para frente, como serão as próximas
edições. Penso que a utilização de plataformas digitais veio para ficar. Não
por menos, estaremos em breve lançando o DFPlay.
O Espaço Renato Russo é um ponto de cultura para a nova
dinâmica da W3 Sul, com áreas de gastronomia e arte. É esse o novo perfil
da região? Como fazer com que o espaço da 508 possa se transformar num
potencializador da economia criativa? O
projeto de revitalização da W3 tem a marca do governador Ibaneis Rocha, que,
inconformado com o grau de abandono daquela emblemática área do Plano Piloto,
juntou várias secretarias para ir além das obras de calçadas e estacionamentos.
Foi uma decisão acertadíssima. Vejo a W3 Sul com essa vocação para atividades
da economia criativa e precisamos aproveitar a oportunidade e oferecer as
condições necessárias. É aí que entra o Espaço Renato Russo, uma referência de
décadas e, agora, com uma responsabilidade bem maior. Totalmente revitalizado,
só falta agora receber uma gestão nos moldes de uma parceria público-privada.
Estamos trabalhando para apresentar um chamamento público em breve, estou
falando de questão de dias mesmo, com algumas novidades, no sentido de alcançar
outros equipamentos culturais, semelhante ao que está ocorrendo, por exemplo,
na Concha Acústica.
O Renato Russo vai ser o estopim para dar à W3 Sul
um novo conceito de aproveitamento dos espaços públicos e uma experiência
importantíssima no desenvolvimento da economia criativa. Alguns becos, antes
degradados, hoje estão revitalizados, com lojas e espaços culturais atraindo um
público cada vez maior.
Ainda esta semana vamos lançar um edital convocando
artistas grafiteiros e grafiteiras para pintar as 28 paradas de ônibus da
região. Será uma explosão de cor e arte. E pensar que ainda temos a W3 Norte
pela frente.
O Fundo de Apoio à Cultura (FAC) é uma conquista dos artistas da cidade,
que possui uma cadeia produtiva e de empregos relevante para a economia
local. Há ações de incremento para 2022? O projeto Meu primeiro FAC é um
avanço, está surtindo efeito? O FAC permitiu que
tivéssemos, este ano, o maior programa de fomento à cultura do país. É uma
ferramenta poderosíssima e, por isso, não deixa de provocar polêmica,
principalmente quando interesses em que predominam o pessoal, em detrimento do
coletivo, começam a atrapalhar. É no coletivo que devemos nos concentrar. Há
quem pense que os recursos do FAC têm caráter assistencialista; outros, de
benefício; e mais outros, de investimento. O desafio está em fazer com que o
fundo seja descentralizado, de forma a atender um universo maior de projetos
culturais, como preconiza a Lei Orgânica da Cultura no DF.
O que se espera de um gestor responsável por um
programa que destinou, em 2021, mais de R$ 144 milhões para financiar
atividades culturais é discernimento, equilíbrio e responsabilidade. No começo
do ano, fizemos uma intensa campanha para aumentar o número de artistas
inscritos no Cadastro de Entes e Agentes Culturais, o Ceac, justamente pensando
nisso.
Durante a execução da Aldir Blanc, nos deparamos
com muita gente que nunca ouviu falar do FAC, ou, quando ouviu, falou que não
era para o seu bico, algo como se o fundo existisse para atender uma casta
privilegiada. Isto acabou. Quando lançamos o FAC Multicultural 1, a ideia da
linha “Meu Primeiro FAC” pegou de imediato. Daí, inserimos este programa em todas
as linhas culturais, inclusive no Multicultural 2, em projetos de maior
robustez, como na área do cinema. Teremos, por exemplo, o Meu Primeiro Longa.
E, junto, a necessidade de incluir segmentos como do LGBTQIA+ e pessoas com
deficiências, as PCDs. Hoje, nossos editais estão sendo estudados e tomados
como referência por vários Estados e organismos que trabalham com inclusão. Em
matéria de políticas públicas, nós somos a vanguarda no Brasil.
O Polo de Cinema também é um gerador de empregos e renda que foi
esquecido no tempo. O GDF sinalizou com investimentos, mas o senhor não
acha que uma das vocações econômicas de Brasília está no setor
audiovisual? Quando visitei as ruínas (sim, verdadeiras ruínas)
do Polo do Cinema, pensei: isso aqui dá uma bela escola de audiovisual, de
cinema, de artes cênicas, de circo... Saí de lá com a cabeça girando. Mas, como
sei que estamos limitados ao tempo, partimos para a tarefa básica, que é de
limpar tudo, consertar estragos, aparar o mato, enfim, ressuscitar o morto e botar
nele uma roupa nova. Dessa forma, estamos não apenas fomentando projetos
culturais com recursos específicos, mas oferecendo também à classe equipamentos
para que possam fazer bom uso dele. Veja que dado interessante extraímos dos
filmes inscritos ao Festival de cinema: a maior parcela é de produções do
Sudeste, chega a ser um pouco mais de 50%. A produção do Centro-Oeste, onde
estamos, não chega a 15%. O setor estava agonizando. Daí a importância e o
acerto em investirmos em 16 longas-metragens com recursos do FAC este ano. As
condições estão postas, estamos fazendo a nossa parte; agora é a vez dessa
gente bronzeada mostrar seu valor.
Daqui a seis meses, Brasília comemora 62 anos, é bem ali. Como está o
planejamento para os festejos, no âmbito da cultura. A valorização dos
artistas locais está prevista? Não é apenas Brasília
que completa 62 anos. Tirante o fato de ser um ano político e que, em certo
momento, é a política quem vai dominar o cenário, em 2022 teremos o centenário
da Semana de Arte Moderna e o bicentenário da Independência. Não estamos
alheios a esses fatos, e, neste momento, temos uma equipe em São Paulo sondando
projetos que possam marcar essas efemérides em nossa cidade. Tanto o Museu da
República quanto o Museu de Arte de Brasília têm muito a oferecer, esperemos um
pouco mais para anunciar. Sem contar o réveillon e as festas de fim de ano,
para as quais o próprio governador Ibaneis acenou com a possibilidade de
flexibilizar os protocolos de segurança, na medida em que a população faça o ciclo
completo da vacina. Quando isso ocorrer, claro, a prioridade será oferecer
oportunidades aos artistas locais, que não deixam nada a dever aos demais
colegas nacionais.
Mais um ano sem novidades sobre o Teatro Nacional Claudio Santoro. Como
fazer esse projeto andar? Como desatar esses nós burocráticos? Já
desatamos esses nós que, devo dizer, eram maiores do que imaginamos. Uma
pergunta como esta talvez merecesse um comentário maior, porém serei breve para
dizer que estamos prestes a concluir o processo e licitar o projeto de reforma.
Aguarde, os detalhes dessa jornada contarei no momento certo.