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Entrevista - Adriana Behar » "Nós temos que ser líderes"

"Nós temos que ser líderes"

Primeira mulher a ocupar o posto defende protagonismo da modalidade no debate político e se inspira na SAF por uma "SAV"


Medalhista de prata nos Jogos Olímpicos de Sydney-2000 e de Atenas-2004, a ex-jogadora de vôlei de praia Adriana Behar é protagonista em outro time. Ela é a primeira mulher CEO da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) desde março do ano passado. Um dos desafios dela no mundo corporativo é rejuvenescer e modernizar a modalidade recordista de medalhas na história das participações do Brasil nos Jogos Olímpicos. São 24 no total, ao lado do judô. Em Tóquio-2020, só não houve um fracasso coletivo porque a Seleção feminina ganhou a prata na quadra. O masculino não pegou pódio e o vôlei de praia voltou de mãos abanando pela primeira vez. Em entrevista exclusiva ao Correio, Behar avalia o desempenho, coloca o dedo em algumas feridas, mas prefere olhar para a frente e fala em renovação. Parte desse longo processo liderado por ela ocorre em Brasília neste fim de semana. O Parque da Cidade recebe o Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia. Hoje, às 21h, a Arena BRB Nilson Nelson será palco do segundo jogo da final da Superliga Feminina entre Praia Clube e Minas. Ousada, a executiva não vê a capital do país apenas como roteiro de passagem dos eventos da CBV. Atenta aos movimentos do futebol no Congresso Nacional, ela estuda a possibilidade de algo parecido com a Sociedade Anônima do Futebol (SAF) para o vôlei. Quem sabe uma SAV. Ela fala desse e de outros temas na conversa a seguir.


Como foi a transição do vôlei de praia para a gestão? Eu comecei a pensar logo o que eu faria no meu segundo momento. Voltei para o estudo logo que parei. Eu era formada em educação física e fiz pós-graduação em gestão de negócios. Quando a gente se prepara e as oportunidades aparecem, nós temos mais condição de tomar decisões. 

 

O trabalho no COB ajudou? Trabalhei no COB por sete anos na área de planejamento esportivo. Fazia a relação com todas as confederações em cima do repasse da Lei Agnelo-Piva. Era toda a preparação para os Jogos Olímpicos do Rio-2016. Não é fácil sair do ambiente de atleta para o corporativo, mas isso me deu experiência e conhecimento para aceitar o convite da CBV.

 

Você assumiu como CEO em março do ano passado. Como encontrou a CBV e qual é o cenário? O primeiro caminho é analisar o planejamento estratégico da entidade, mesmo em um ciclo inédito e mais curto (até Paris-2024). Foram feitos ajustes não somente no resultado esportivo, mas no comercial, de imagem, mídia, engajamento, retenção de fãs e oportunidade de negócios para toda a cadeia. Isso com o respaldo de uma boa governança, transparência e ética. 

 

Você é a primeira mulher CEO da CBV. Mais um sinal de novos tempos? Além de integridade, excelência e resiliência, eu acho que valores como pertencimento e diversidade fazem parte do novo ambiente da CBV. Muito mais integrado com o mundo em que a gente vive. O desenvolvimento e resultado são a essência, mas não podemos estar alheios ao desenvolvimento humano. Temas como saúde, ambiente e diversidade são fundamentais para a gente se aproximar do nosso público alvo.

 

Quais são os desafios? O desafio continua, especificamente, no caso da mulher dentro da gestão. Hoje, tenho uma equipe de líderes igual em número de homens e mulheres. A gente tem que encurtar esse caminho. Opiniões diferentes são complementares. Alcançamos melhores resultados na inclusão.

 

O vôlei deu 24 medalhas ao país nos Jogos Olímpicos, mas, em Tóquio-2020, rendeu apenas uma prata no vôlei de quadra feminino. Há respostas para isso? O vôlei tem uma referência muito forte no Brasil não só de conquistas pontuais, mas de perenidade, sustentabilidade muito grande de resultados. 

 

O vôlei de praia zerou… Pela primeira vez, na história dos Jogos Olímpicos, não trouxemos nenhuma medalha no vôlei de praia. É um ponto de atenção. Cabe uma reanálise. Esse ciclo é curto, rápido. Temos excelentes atletas, mas o cenário internacional, hoje, é muito mais forte e desafiador para o vôlei de praia brasileiro. Precisamos pensar em Paris-2024, mas ter foco no desenvolvimento, renovação, trilhar um caminho pavimentado para Los Angeles-2028.

 

Faltou renovação ao vôlei de praia? Não posso dizer que faltou renovação. A competição é cada vez mais acirrada. Os países se estruturaram e têm duplas fortes. Ajustes têm que ser feitos. Não é normal acontecer isso com o vôlei de praia. Estamos trabalhando para que não se repita. Temos excelentes atletas, mas o foco é na performance, independentemente da idade. Eu conquistei medalha com 34 para 35 anos. O foco é o resultado sendo convertido em medalhas. A meta da CBV para Jogos Olímpicos e competições internacionais é pódio.

 

A rota está sendo corrigida? O primeiro estudo foi entender o campeonato nacional. Essa competição é não somente o desenvolvimento do vôlei de praia no Brasil, mas a trilha e a plataforma para a formação de campeões. Tentamos avaliar o comportamento da modalidade nos últimos ciclos. A proposta de um novo modelo de competição foi um caminho fundamental para focar na performance e no desenvolvimento em longo prazo. 

 

De forma prática… Damos oportunidade para jovens terem jogos mais equilibrados. Quem vem do qualifying, com um nível esportivo teoricamente menor, deixa de enfrentar logo de cara o primeiro do ranking. A chance de essa dupla ganhar o jogo era mínima. Quando você passa para um segundo jogo de meio de tabela, aumenta a possibilidade de vitória. Só se faz desenvolvimento esportivo com jogo. É o caminho para o salto de qualidade. Esse foi o modelo para fazermos a competição de Top 8 e Torneio Aberto no vôlei de praia. Todos os estudos mostraram que, nos últimos anos, as duplas que ganhavam o Circuito Nacional, obrigatoriamente, estavam entre os oito. Não havia acesso a quem estava abaixo disso, de ser campeão na etapa nacional. 

 

O DF tem times de desenvolvimento nas Superligas feminina e masculina? Como manter esses projetos? Com parcerias, projeto de longo prazo. Esse é o desafio. Do contrário, você fica sempre no risco de o projeto acabar. O longo prazo gera receita, valor no seu local. A cidade é que vai suportar o desenvolvimento. Esse é o caminho para alcançar algo mais sustentável.

 

A ausência em playoffs deixa o projeto em xeque? É muito difícil pensar ano a ano. Brasília está indo muito bem. Eu estimulo que mais estados possam começar a ter seus clubes em uma Superliga C, B… Faz parte do desenvolvimento. O longo prazo traz parcerias perenes. 

 

Há prazo para o sucesso? Para se tornar maduro o suficiente, o atleta precisa de dois ciclos. Os projetos necessitam ser mais focados em longo prazo não somente na quadra, mas, também, nas duplas. É o que vivenciei com a Shelda. A nossa parceria durou 12 anos. Se não for a mais longeva, é uma delas. 

 

As trocas de duplas atrapalham o desempenho? Perde a identificação da dupla, do ídolo. Perde o programa. O planejamento tem momentos de alto e baixo, mas se o foco está claro, bem traçado, o resultado vem. 

 

O vôlei feminino voltou com a prata. O masculino não pegou pódio. Frustrou? As duas seleções vieram da Liga das Nações alguns meses antes dos Jogos Olímpicos com conquistas fantásticas. O jogo, em si, não pode desmerecer o trabalho de um ciclo. Do outro lado, há atletas e profissionais competentes. Nosso foco está no desenvolvimento para termos uma renovação planejada e garantirmos sempre a medalha. 

 

Tóquio deixou o foco na quadra ou na areia? A CBV foca tanto no desenvolvimento interno quanto na preparação das duplas para as competições internacionais. É o nosso modelo. Outros países focam nas etapas mundiais. Na quadra, temos o suporte para as seleções. O foco, hoje, está na base. Não podemos olhar apenas para 2024, mas, também, para 2028 e 2032.

 

A saúde mental dos atletas está na pauta da CBV? Temos um trabalho em parceria com o COB. Equipes multidisciplinares e dessa parte da psicologia ou comportamental. Há muitas interferências externas que atrapalham o desenvolvimento esportivo. Temos um olhar muito cuidadoso para a saúde física e mental dos atletas para protegê-los. O desenvolvimento esportivo precisa caminhar com o humano. Trabalhamos com pessoas. 

 

Como está a relação entre a CBV e o Banco do Brasil? É um parceiraço. Completamos 30 anos. É um case de sucesso não somente no esporte, mas em qualquer outro ambiente. Estamos felizes não somente com o que a gente tem, mas reforçamos que o Banco do Brasil está totalmente alinhado com a gente em um caminho próspero. 

 

O futebol ganhou a SAF. O vôlei merece uma “SAV”? Estamos estudando isso, hein?! A SAF é voltada para o futebol, mas a gente tem estudado isso. A CBV, como segunda modalidade do país, tem que ser líder em temas que possam impactar o esporte. Temos estudado algo que possa se encaixar e faça sentido ao esporte olímpico. A gente tem que abrir caminhos para propor.

 

Você foi de atleta a gestora. Pensa em uma cadeira no Congresso? Não penso nisso, mas acho importante, sim, participar. São movimentos importantes. O esporte tem que ser trabalhado dentro de um ambiente maior.



Marcos Paulo Lima – Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog-Google


 

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