Fala-se muito em reformas
tributárias, administrativas e políticas, mas pouco se ouve sobre reforma do
Poder Judiciário. O tema parece ter virado uma espécie de tabu. O assunto,
embora não seja novo, tem reascendido debates, justamente, em decorrência da
crise de credibilidade instalada no sistema judicial brasileiro, sobretudo, em
consequência da rotineira extrapolação de competências e de prerrogativas do
Supremo Tribunal Federal.
Para os ministros, instalados
confortavelmente nesse alto Poder, o tema é incômodo e necessita ser pensado em
termos globais, já que, para eles, existe uma lista de reformas prévias
mais relevantes e que precisam ser levadas adiante, antes de se falar em
mudanças no Judiciário. Fica claro que esse tema virou um vespeiro a incomodar
suas excelências, detentoras de um poderio institucional e de um mando
exacerbado, jamais vistos em tempo, leis e lugar algum.
As raízes dessa extrapolação de
competência tiveram início, justamente, no parlamento, com os partidos nanicos
judicializando a política, por meio de ações junto ao Supremo para questionar
decisões adotadas pelo Legislativo. De lá para cá, o Supremo e, principalmente,
alguns ministros mais ativistas gostaram da mecânica que era inaugurada e
passaram, eles mesmos, a inverter o sentido de ações, politizando a
justiça e assumindo responsabilidades que antes eram circunscritas apenas ao
Legislativo e ao Executivo.
Hoje essa situação, de clara
inconstitucionalidade, segue em ritmo crescente, o que, para muitos cientistas
políticos, poderá resultar, em curto espaço de tempo, num impasse institucional
e numa crise incontornável e de grandes proporções.
Outro fato a pesar sobre essa
crise anunciada é dado pela própria composição dos membros do STF e do STJ, na
sua grande maioria indicada pelo partido de esquerda no Poder. Por mais
que se fale em independência dos ministros, a população, nessa altura dos
acontecimentos, já pode perceber que essas indicações falam muito sobre o que é
decidido internamente nessas altas cortes.
É impossível tratar da crise de
credibilidade deixando de fora o rito e a origem das indicações feitas. A
questão também não pode ser posta, como acredita o presidente do Senado,
Rodrigo Pacheco, limitando o acesso ao STF, para que se evite ponto de
contato constante com a sociedade. Existem, e não é de hoje, propostas
tendentes a mudar as regras de indicação de ministros para as altas cortes,
reformando seu funcionamento, reduzindo e fixando mandatos e, com isso, pondo
fim ao cargo vitalício. Também, na Câmara, dormitam propostas para limitar atos
dos magistrados, dando ao Legislativo prerrogativas para derrubar decisões do
Supremo que invadam competência de outros poderes. Os ministros não querem nem
ouvir falar nessas propostas, porque, segundo dizem, todas elas trazem aspectos
pouco democráticos.
Mesmo a afirmativa feita por
figuras dessas altas cortes, de que o Judiciário desempenhou papel ativo em
defesa da democracia e contra ações e ameaças que visavam golpeá-la,
não se sustenta de pé, necessitando de certo distanciamento no tempo, para ser
analisada com mais objetividade, razão e verdade. Falta, dos dois lados desse
debate, tanto do Judiciário como do Legislativo, vontade real de levar essa
questão à frente, em benefício do país.
Ao Judiciário, falta humildade e
desapego. Ao Legislativo, coragem de defender a sociedade e de lutar por seu
espaço político. O que os próceres desses dois Poderes não sabem ou fingem não
saber é que o que está em jogo é a democracia, uma criação do gênio humano, que
só funciona com certa perfeição quando há harmonia e equilíbrio entre os
Poderes. A hipertrofia de qualquer um dos três Poderes aponta para um Estado do
tipo ditatorial e deve ser evitada, custe o que custar.
Outro ponto passível de
discussão e que, pelo conteúdo, deve ser remetido ao futuro para análises mais
isentas, diz respeito à fala de um dos ministros do STF, que em solenidade
recente, ousou afirmar que: “Se a política voltou a ter autonomia, foi graças
ao Supremo Tribunal Federal. Se hoje nós temos a eleição do presidente Lula,
isso se deve a uma decisão do Supremo”. Trata-se aqui de uma espécie
de sinceridade suicida, que merece ser analisada adiante, quando todo
esse período de crise e de polarização ficar para trás. Outra frase do mesmo
autor, cujo nome não vale ser citado aqui, é que coube ao Supremo impedir que a
política continuasse a ser criminalizada, quando aquela alta Corte passou a
impor derrotas à Operação Lava Jato.
Nada mais vergonhoso do que essa
manobra e essa chicana que impediram a continuação do combate à corrupção,
levando o país a um retrocesso e a dívidas contraídas por falta de gestão,
planejamento e competência técnica.
É preciso destacar ainda que é
lavra do Supremo, decisões que afrontam diretamente a sociedade brasileira,
como é o caso da legalização do aborto, da descriminalização das drogas, do
retorno do imposto sindical, do fim do Marco Temporal, entre outras estranhas
iniciativas que batem na moral, aos costumes e às crenças religiosas.