Eis aqui uma questão que segue
em discussão mundo afora. Em muitos casos, esse tem sido o dilema enfrentado
pela humanidade ao longo dos milênios. De modo geral, a diáspora empreendida
pelos seres humanos ao longo de toda a sua existência prova que a sobrevivência
decorreu, em grande parte, da possibilidade de deslocamento das populações em
busca de terras e climas mais propícios.
No caso do Brasil,
especificamente, as migrações de grande número de cidadãos do Norte/Nordeste
para regiões mais ao sul provam que essa é uma premissa verdadeira. De modo
geral, podemos verificar que, em pleno século 21, essa é ainda uma realidade
entre nós. Quanto mais longe dos centros de decisão política estadual e
federal, mais e mais os municípios se veem largados à própria sorte.
Regiões perdidas nos confins do
nosso país, como é caso de muitos municípios situados geograficamente no Norte
e no Nordeste, sofrem com todo o tipo de carência, com muitos sobrevivendo
graças a políticas do tipo assistencialistas cujas portas de saída ou solução
para esse dilema simplesmente inexistem. Infelizmente, essa situação de penúria
tem persistido ao longo do tempo, justamente porque essa passou a ser uma
condição sine qua non para a perpetuação de certos tipos de políticas e
políticos, cujo discurso difere dos fatos.
No entra e sai de governos,
soluções milagrosas são anunciadas aos quatro ventos, e por eles levadas da
mesma maneira. Pesquisa elaborada pelo Departamento de Geografia da Faculdade
de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP demonstra que, nos nove
estados inseridos na região semiárida de nosso país, estão 90% dos municípios
que exibem residências permanentemente fechadas. Isso de acordo com o Censo
Demográfico de 2022.
A mesma pesquisa mostra que o
crescimento da população nessas áreas, de 3,7%, é quase a metade da média
nacional, que é de 6,5%. Embora os pesquisadores afirmem que essa diminuição
demográfica tem menos relação com as mudanças climáticas, sendo um problema
mais ligado a fatores sociais, o fato é que, aqui, o fator geográfico
impulsiona a roda do destino.
Não só existem municípios
fantasmas em nosso país, como essa tendência cresce à medida que essas
populações, principalmente as mais jovens, descobrem que estão desgarradas do
restante do país. O deslocamento populacional interno segue ainda sendo prova de
que geografia é destino e razão de ser para a manutenção da chamada indústria
da seca. Essa indústria, no sentido pejorativo, produz riqueza para os que a
usam como mote de seus discursos e promessas, significando, por outro lado, a
perpetuação de um ciclo de miséria que move a máquina política dos novíssimos
coronéis do sertão.
O termo indústria da seca foi
cunhado por Antônio Callado (1917-1997) nos anos de 1960. No livro Os
industriais da seca e os galileus de Pernambuco: aspectos da luta pela reforma
agrária no Brasil, o escritor, jornalista e teatrólogo já apontava, mais de 60
anos atrás, que havia uma espécie de “mito da seca”, que era usado como álibi
para a questão da miséria e que, em sua origem, estavam as figuras do
coronelismo e da corrupção endêmica a afetar toda a região — e que, ainda hoje,
persiste sem solução à vista.
Aqui, além da geografia determinar, com sua mão invisível, o destino dessas populações, a ação humana — no caso, o oportunismo de uma classe política local insensível — vem como um elemento a mais a determinar o êxodo permanente desses nossos compatriotas.
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