O
jornal americano The New York Times (NYT) revelou, nesta segunda-feira (25),
que o ex-presidente Jair Bolsonaro passou dois dias na embaixada da Hungria, em
Brasília/DF, quatro dias após o Supremo Tribunal Federal (STF) apreender seu
passaporte, fato que foi confirmado pelo próprio Bolsonaro, que disse ter se
hospedado no local para “manter contato com autoridades do país amigo”. Na
reportagem, o NYT sugeriu que a ida de Bolsonaro à embaixada indica a intenção
do ex-presidente de buscar asilo político naquele país, para escapar do alcance
de uma possível prisão decretada pelo STF, pois não poderia ser preso na
embaixada de um país estrangeiro que o acolhesse.
O
caso imediatamente incendiou as redes sociais, com manifestações inflamadas da
esquerda à direita. A esquerda histérica entrou em pânico e disse que Bolsonaro
planejava fugir do Brasil. Lindbergh Farias, deputado federal pelo PT, anunciou
que pediu a prisão preventiva de Bolsonaro à Procuradoria-Geral da República
(PGR), mesmo não tendo nenhuma legitimidade processual para isso. A direita,
por outro lado, ressaltou que Bolsonaro tem vínculos com líderes políticos do
mundo inteiro e não fugiu do Brasil quando teve a oportunidade, durante a
cerimônia de posse de Javier Milei na Argentina, por exemplo.
E
o que todos querem saber é: o STF vai prender Bolsonaro nesta semana pela ida à
embaixada? A minha aposta é de que o Supremo não vai prender Bolsonaro,
por duas razões principais. A primeira razão é que não estão presentes os
requisitos da prisão preventiva, previstos no art. 312 do Código de Processo
Penal. Ao contrário do que a esquerda passou o dia inteiro alardeando ontem, o
fato de Bolsonaro ter visitado a embaixada de um país estrangeiro não quer
dizer, por si só, que ele queria escapar da justiça brasileira. Muitas pessoas
utilizaram como argumento o fato de que embaixadas seriam “território
estrangeiro” e que, por isso, lá dentro, Bolsonaro estaria fora do alcance da
jurisdição brasileira. O argumento está incorreto: embaixadas não são
território estrangeiro, mas território inviolável, por força da Convenção de
Viena de 1961, de modo que Bolsonaro nunca deixou o solo brasileiro e nem
violou nenhuma das cautelares impostas por Moraes na operação Tempus Veritatis,
quando o passaporte de Bolsonaro foi apreendido.
Um
outro argumento equivocado da esquerda é de que Bolsonaro precisa ser preso
porque planeja pedir asilo político à Hungria e isso o colocaria fora do
alcance da justiça brasileira. O próprio Moraes já utilizou este argumento para
manter a prisão preventiva do ex-deputado federal Daniel Silveira. O argumento,
contudo, não procede quando há fortes indícios de perseguição política porque,
nesse caso, o pedido de asilo político é um direito humano, previsto no art.
XIV da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que dispõe: “Todo ser humano,
vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros
países”.
O
exercício de um direito humano não pode ser interpretado como uma violação da
lei ou tentativa de descumprir medidas cautelares. Bolsonaro e sua defesa
expressaram que ele não procurou asilo político na Hungria, mas, se houvesse
feito, estaria exercendo um direito, já que a perseguição política contra ele é
inegável. Independentemente do mérito dos casos, todas as investigações contra
Bolsonaro no Supremo estão repletas de ilegalidades, a começar pelo fato de que
nem Bolsonaro nem os demais investigados têm foro privilegiado no STF. Só isso
já bastaria para causar a nulidade de todos os procedimentos. O mesmo STF que
coou um mosquito para anular as condenações de Lula engole agora um camelo no
caso Bolsonaro.
Por
fim, a prisão preventiva exige ainda dois requisitos adicionais: prova da
existência do crime e indício suficiente de autoria, que são os mesmos
requisitos que a lei considera suficientes para a apresentação de denúncia, que
é a acusação formal feita pelo Ministério Público contra quem praticou crimes.
Bolsonaro não foi denunciado até agora e a Polícia Federal (PF) sequer concluiu
as investigações. Como então prendê-lo neste momento? Se Bolsonaro fosse preso
agora, a PGR precisaria, necessariamente, apresentar denúncia contra ele no
prazo legal de 40 dias ou a prisão seria ilegal, embora o STF já tenha
desrespeitado - também de modo absurdo - esse prazo com prisões preventivas
alongadas, como a de Mauro Cid, Silvinei Vasquez, Anderson Torres e dezenas de
outros réus do 8 de janeiro. De todo modo, o fato de a PGR não ter denunciado
Bolsonaro até o momento significa que não há provas suficientes nem para a
denúncia e nem para a prisão preventiva.
E
o Direito ainda vale alguma coisa? Isso conduz ao próximo ponto.
Independentemente do mérito dos casos, todas as investigações contra Bolsonaro
no Supremo estão repletas de ilegalidades
A
segunda razão pela qual aposto que os ministros do Supremo não vão prender
Bolsonaro neste momento não é jurídica, mas política. Os próprios ministros já
disseram na imprensa que não vão fazê-lo. Durante as últimas semanas, ministros
do Supremo falaram de modo anônimo para jornalistas, num claro prejulgamento,
que a prisão de Bolsonaro não virá agora, mas apenas depois do trânsito em
julgado dos processos a que o ex-presidente venha a responder no futuro.
Segundo falas dos ministros na imprensa corroboradas ontem, Bolsonaro será
condenado e o cronograma para sua prisão já existe, mas isso só acontecerá após
burocracias que deem ao caso algum revestimento de devido processo legal, que é
violado dia sim, dia sim, no STF. Além disso, os ministros disseram ainda temer
a repercussão de uma prisão de Bolsonaro, que o vitimizaria diante de seus
apoiadores. A verdade é que o STF tem medo, especialmente após a bem-sucedida
manifestação na avenida Paulista em 25 de fevereiro, que ganhou maior
relevância após as fracassadas manifestações da esquerda no último sábado (23).
Neste
momento, o STF pode até não prender Bolsonaro pela visita à embaixada, mas tudo
indica que o tribunal se prepara para prendê-lo no momento que for mais
conveniente politicamente para o próprio Supremo. Há um cálculo político do STF
em tudo o que diz respeito a Bolsonaro e, no momento, o temor da corte é em
relação a uma conflagração social decorrente do grande apoio popular que
Bolsonaro demonstrou ter nas ruas. O cálculo político reforça a percepção de
que há uma perseguição política que inclui a distribuição direcionada dos
casos, o julgamento em tribunal sem competência, as prisões de auxiliares em
violação escancarada aos prazos legais (sem denúncia), as pescarias
probatórias, os prejulgamentos na imprensa e por aí vai. Os ministros parecem
agir não de acordo com as provas, os fatos e a lei, mas de acordo com
conveniências políticas que apontam para uma conta de chegada, em que o único
resultado possível é a condenação e a prisão de Bolsonaro.