A
posse da nova presidente da Petrobras, Magda Chambriard, consagrou a volta da
Petrobras como principal ferramenta para a promoção do projeto petista de poder
e do viés desenvolvimentista do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva
(PT), focado no intervencionismo estatal na economia. Com crescentes limitações
no Orçamento da União, grandes dificuldades para aprovação de projetos no
Congresso e ainda queda na popularidade, Lula aposta na “nova administração” da
petroleira como meio de abrir frentes de investimentos em áreas como indústria
naval, refino de petróleo e fertilizantes, além de ampliar a sua influência
política.
Devido
ao seu papel diferenciado no PIB, a Petrobras é a principal vitrine para o
mantra de Lula de que “dinheiro bom é dinheiro em obra”. Essa promessa de
campanha enfrenta dificuldades para deslanchar devido à falta de recursos para
o ambicioso e reeditado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Com o
impulso ao plano de investimentos da maior empresa brasileira, que agora,
segundo a nova presidente da empresa, está em absoluto alinhamento com o
governo, torce-se por resultados. Em paralelo, o Palácio do Planalto segue
tentando revisar medidas adotadas entre 2016 e 2022 dedicadas ao combate da
corrupção em estatais.
A
partir do governo do ex-presidente Michel Temer, a Petrobras avançou na
estratégia política para sair de negócios, se concentrando na considerar no
alvo principal: a produção de petróleo e gás natural em águas profundas.
Continuada no período de Jair Bolsonaro (PL), a ação colocou à venda refinarias
sob supervisão da Justiça e órgãos de defesa da concorrência.
A
atual tendência é reverter essa política de desinvestimentos iniciada em 2019.
A Petrobras privatizou quatro refinarias (e pretendia vender mais quatro) além
de se desfazer de operações em poços de petróleo menores, que não vinham dando
muito lucro. A ideia era sanar as dívidas da companhia, toná-la mais eficiente
e, com as privatizações, fortalecer a livre concorrência por meio da atração de
mais empresas para competir pelo mercado. A venda como um todo não ocorreu
porque depende de aprovação no Congresso que ainda estava muito dividido sobre
o tema.
Já
as gestões petistas da Petrobras foram marcadas por sérios prejuízos causados
por erros estratégicos e desvios gigantescos de recursos revelados pela
Operação Lava Jato. Entre os casos do Petrolão julgados pela Justiça,
destaca-se a compra da usina de refino sucateada em Pasadena (EUA), que
resultou em perda de US$ 741 milhões. Grandes projetos fracassados incluíram a
Refinaria Abreu Lima, em Pernambuco, conhecida como “a mais cara do mundo”, já
retomada, e o complexo petroquímico em Itaboraí (RJ), cujas obras foram
paralisadas em 2015 após escândalos de corrupção.
Os
desvios da Petrobras para partidos e contas particulares foram estimados em R$
50 bilhões, envolvendo empreiteiras como Odebrecht, OAS e Camargo Correa.
Subsidiárias e empresas criadas para suprir a Petrobras afundaram em crises
financeiras, como a Sete Brasil, que deixou prejuízo de R$ 17 bilhões. Como
resultado, a Petrobras teve perda de R$ 160 bilhões em valor de mercado e
atingiu passivo recorde, antes da sua recuperação a partir do governo Temer.
Lula
culpa Lava-Jato por resultados trágicos da Petrobras sob gestões
petistas: No seu discurso na posse de Magda Chambriard, no último dia 19,
Lula culpou a Lava-Jato pelos números trágicos da Petrobras nos governos do PT,
acusando a operação de buscar destruir o patrimônio da empresa. “Com o falso
argumento de combater a corrupção, a Lava-Jato mirava na verdade o desmonte e a
privatização da Petrobras. Se o objetivo fosse de fato combater a corrupção”,
disse, ignorando revelações, esquemas e cartéis descobertos. Sem qualquer “mea
culpa”, Lula afirmou que “os que quiseram destruir a Petrobras jamais
conseguirão”.
O
chefe do Executivo ainda aproveitou a ocasião para fazer uma defesa
entusiasmada do papel do Estado na condução da economia e na formulação de
políticas de desenvolvimento. “Queremos um Brasil grande, e é por isso que
amamos a Petrobras”, afirmou. Ele ainda lamentou que a Eletrobras e a Vale já
não estejam mais no rol das estatais.
Na
mesma cerimônia, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), agradeceu o
acordo fechado com a Receita Federal para encerrar uma disputa judicial
envolvendo dívidas tributárias da Petrobras. O acerto aprovado pelos acionistas
minoritários deu, segundo ele, “grande exemplo” de cooperação da empresa com o
Estado brasileiro. Anunciado na segunda-feira (17), o acordo terá impacto de R$
11,9 bilhões no lucro do segundo trimestre da estatal e ajudará o governo a
reduzir o déficit em suas contas.
Apesar
da autonomia de gestão, a Petrobras tem sinalizado submissão aos desejos do
sócio majoritário. Haddad disse em entrevista recente à TV CNN Brasil que Lula
vai atuar como controlador na política de preços e de investimentos porque
entende que a Petrobras é uma empresa estratégica.
Dirceu
aponta Petrobras como principal fator de desenvolvimento
econômico: Durante a sua palestra no relançamento da Universidade Popular
(Unipop) em Brasília, no último dia 11, o mais poderoso ministro dos governos
petistas e ex-presidente do PT, José Dirceu, destacou a importância central da
Petrobras no projeto de poder do partido. Ele afirmou que uma virada na gestão
Lula, para contrabalançar a influência da direita adquirida nos últimos anos,
depende essencialmente do desenvolvimento econômico. Nesse contexto, o grande
“dilema” para o governo é encontrar fontes de financiamento para alcançar esse
objetivo.
De
acordo com Dirceu, desde o início da exploração do pré-sal em 2008, o petróleo
tornou-se a principal fonte de recursos para impulsionar a economia. No
entanto, ele observou que as mudanças na governança da Petrobras, incluindo o
pagamento de dividendos extras aos acionistas e a flexibilização da legislação
do pré-sal durante o governo Temer reduziram significativamente essa fonte de
financiamento.
Com
a perspectiva do “novo pré-sal” na Margem Equatorial, o Presidente da República
voltou a enxergar oportunidade semelhante à que anunciou há 16 anos. A nova
fronteira exploratória abrange da costa do Rio Grande do Norte até o Amapá,
incluindo as bacias hidrográficas da Foz do Amazonas, Pará-Maranhão,
Barreirinhas, Ceará e Potiguar.
A
exploração dessa região enfrenta forte oposição de grupos ambientalistas e
organismos internacionais, que alertam para os riscos de aumento na exploração
de combustíveis fósseis, considerados os principais responsáveis pelo
aquecimento global, além dos possíveis impactos à biodiversidade, especialmente
na região do Rio Amazonas.
“Mesmos
personagens e métodos de volta à Petrobras”, lamenta líder da
oposição: Após as movimentações em torno da Petrobras envolvendo figuras
conhecidas do PT, condenadas pela Justiça por escândalos relacionados a
recursos públicos, e as declarações da nova comandante da empresa, Magda
Chambriard, o senador Rogério Marinho (PL-RN), líder da oposição no Senado,
afirmou que "voltaram os mesmos personagens e os mesmos métodos", com
os quais se podem esperar os "mesmos resultados".
Ironizando
sobre "a governança e o compliance no governo do amor", o senador
lamentou que os líderes petistas "não tenham aprendido nada com o
passado". "Tivemos a Petrobras como a empresa mais endividada do
mundo em seu segmento, um verdadeiro assalto, com delações, vários envolvidos e
recursos devolvidos", disse.
O
ex-tesoureiro do PT, João Vaccari, vinha atuando desde o ano passado por uma
mudança na estratégia de "defesa" da Petrobras em ações de
improbidade administrativa decorrentes da Lava-Jato. Ele se reuniu com o
departamento jurídico da estatal, mas sofreu resistências. Com a nova
presidente, há a expectativa de abertura, incluindo a chegada de Wellington
Silva, novo advogado-geral, próximo ao ministro da Casa Civil, Rui Costa.
A
Petrobras sempre se posicionou como vítima em ações judiciais, mas as decisões
recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) anulando sentenças da Lava-Jato
levaram delatados a defender a revisão da tese. Vaccari argumenta que tal
mudança facilitaria a defesa dos incriminados em processos ainda em curso,
incluindo casos de superfaturamento, como a construção da sede da Petrobras em
Salvador.
Especialistas
veem mercado receoso com a Petrobras “sob nova administração”: Para
François Moreau, diretor da consultoria Estratégia & Valor, as declarações
da nova presidente da Petrobras durante a sua posse, além dos comentários
feitos por Lula na mesma cerimônia, dão motivos de sobra para uma crescente
preocupação dos investidores com os rumos que a empresa tomará. “O risco de
retorno das práticas deletérias é real. O discurso de posse da Magda é claro: a
busca da eficiência econômica está sendo abandonada, enquanto o seu uso
político foi retomado”, disse.
O
engenheiro Armando Cavanha, professor da PUC Rio e ex-diretor da Petrobras, não
acredita que a significativa inflexão nos rumos da empresa traga impactos
efetivos no atual mandato de Lula. A mudança ideológica entre governos não
consegue, por exemplo, afetar de imediato a tendência para o parque de refino e
a busca por autossuficiência numa área que requer pesados investimentos, mas
com baixo retorno. Além disso, ele observa que a variação de conceitos na
petroleira esbarre em lideranças internas formadas nos últimos tempos,
dificultando implementação de visão mais voltada para um amplo foco, que vai da
produção ao varejo.
Sobre
a aposta na transição energética, Cavanha concorda ser inevitável investir na
diversificação, incorporando fontes renováveis para a geração elétrica, mas sem
uma substituição completa das fontes fósseis. Para ele, a Petrobras deve
continuar buscando ampliar a produção de óleo cru, que é importante para a
balança comercial do país, explorando a Margem Equatorial, uma reserva
promissora que deve ser aproveitada rapidamente, sem os temores de riscos
ambientais, contornados pelo avanço tecnológico e pela posição geográfica dos
poços em águas profundas e distantes da costa.
O
especialista vê uma “aposta inteligente” na produção de fertilizantes, um
mercado em que o Brasil é grande demandante, por causa do agronegócio. Mas ele
ressalta que a abordagem precisa ser a mais acertada, com ou sem participação
de capital privado. Ele teme que em outras frentes, como a produção de navios e
plataformas, a Petrobras repita erros passados, como a fixação de percentuais
exagerados de conteúdo local, que levaram a atrasos e ineficiências. Para ele,
o mecanismo de proteção industrial tem tudo para falhar novamente, caso seja
resgatado.
Quanto
à percepção dos investidores com a nova administração da petroleira, Cavanha
acredita que a promessa de pagamento de dividendos traz satisfação a curto
prazo, mas o foco na produção, sobretudo da Margem Equatorial, está sob
análise, visando retorno significativo e sucesso do plano de investimentos da
empresa no longo prazo. Sobre os riscos de desvios de recursos, ele
também não vê como escapar deles.
Magda
procurou agradar investidores com promessa de pagar dividendos: Consciente
do estresse causado ao seu antecessor, Jean-Paul Prates (PT), pela tentativa do
governo de alterar a política de pagamento de dividendos, Magda Chambriard
buscou em seu discurso equilibrar o viés governista com a promessa de boa
interação com investidores. Após a mudança traumática na liderança da estatal,
ela garantiu a manutenção da política de preços de combustíveis e o aumento da
distribuição de dividendos. Ela enfatizou a importância da lucratividade da
Petrobras para “todos os acionistas” e sinalizou foco no aumento da produção,
incluindo a abertura de novas frentes exploratórias, como a Margem Equatorial,
além de explorar o refino e o segmento de fertilizantes.