A
direita ia ganhar as eleições na França – mas quando foi se contar os votos do
turno definitivo, deu-se que a direita perdeu. Não apenas não levou a maioria
das cadeiras no Parlamento, como imaginou que levaria. Viu a esquerda ficar em
primeiro lugar e ganhar força para obrigar o presidente Emmanuel Macron,
responsável ao mesmo tempo pelo pânico da vitória da direita e pelo tumulto da
vitória da esquerda, a chamar as lideranças esquerdistas para dentro do seu
governo.
A
“ameaça” que as classes culturais e civilizatórias temiam não se realizou. O
que aconteceu foi justamente o contrário: a esquerda mais radical da França,
reunida numa “Frente Popular” cujo nome traz as piores lembranças, foi quem
elegeu o maior número de deputados – 178, num total de 577 assentos. Junto com
os 150 de Macron, que se aliou às forças da esquerda, formam agora a maioria.
A
ciência política única que está hoje em vigor determina que existem dois tipos
diferentes de voto popular. Quando a maioria dos eleitores vota na direita, não
é uma manifestação natural da democracia – é fascismo
Onde
foram parar, então, os votos da direita nas eleições europeias e, logo a
seguir, no primeiro turno da eleição nacional? Como na natureza, nada se perde
e tudo se transforma. A votação do RN, o partido da direita na França, passou
dos 88 deputados que tinha para 125 – o que não parece ser uma derrota, e não é
mesmo, mas dá apenas medalha de prata.
É
a velha história: ficar em terceiro lugar não resolve a vida de ninguém em
política sobretudo quando os dois primeiros se juntam para bater em você. A
direita francesa vai fazer mais barulho, vai dar assunto para muita mesa
redonda em televisão e vai continuar sendo acusada de sintetizar o que existe
de pior na humanidade, mas não vai mandar em nada no governo. Tem sido assim há
40 anos. Assim continuará até a próxima eleição presidencial, e depois disso é
voo cego.
As
eleições na França, assim que apareceram os resultados, foram tidas
naturalmente como uma extraordinária vitória da democracia. Mas essas
mesmíssimas eleições não estavam sendo denunciadas, até agora, como um perigo
mortal para essa mesmíssima democracia? Estavam, mas é assim que funciona o
pensamento equilibrado, virtuoso e correto do momento. Eram uma ameaça quando
se achava que a direita podia ganhar. Passaram a ser uma vitória do bem quando
a esquerda ganhou.
A
ciência política única que está hoje em vigor determina que existem dois tipos
diferentes de voto popular. Quando a maioria dos eleitores vota na direita, não
é uma manifestação natural da democracia – ao contrário, é fascismo, extremismo
e “ditadura através do uso do voto”. Quando a maioria vota na esquerda e no
“centro” o sinal inverte – nesse caso a democracia está salva.