O ministro Joaquim Barbosa nem está mais no Supremo Tribunal Federal,
mas o País pode ir se preparando para um clima de guerra na Corte a partir
desta semana, quando o processo do impeachment de Dilma Rousseff bate as portas
da Justiça.
Dilma levou um susto e perdeu triplamente na criação da Comissão
Especial do impeachment: Eduardo Cunha manobrou para admitir a votação secreta
e a apresentação de uma chapa anti-Dilma; a oposição venceu no final e emplacou
os seus nomes; e Dilma só teve o voto de 199 dos 513 deputados. O governo
concluiu que a coisa está feia e é preciso esvaziar o poder de Cunha e da
Câmara.
Tirar da Câmara e levar para onde? Para o Supremo, onde o ministro Luiz
Edson Fachin paralisou o processo por ao menos uma semana, e para o Senado,
onde o presidente Renan Calheiros está a postos para embaralhar o processo de
impeachment.
Se, na Câmara, o que se vê é quebra-quebra de urnas, troca de ofensas,
safanões e manobras rasteiras, não se espere algo muito mais civilizado no
Senado, principalmente agora que o PSDB decidiu se unir pelo afastamento de
Dilma. Mas no Supremo?!
No mensalão, com as longas sessões transmitidas ao vivo, tivemos
brilhantes aulas de Direito e pudemos assistir a um show de enfrentamento entre
Joaquim Barbosa, relator e depois presidente do tribunal, e Ricardo
Lewandowski, revisor e depois vice-presidente. Nem sempre dentro de padrões
tradicionais, mas mesmo assim, ou até por isso mesmo, foram embates memoráveis.
E agora? Pelo que se ouve, vê e lê, os contendores da linha de frente
tendem a ser, de um lado, o mesmo Lewandowski agora alçado à presidência e, de
outro, um Gilmar Mendes armado até os dentes. E seja o que Deus, as pressões e
a Constituição quiserem.
Na primeira batalha, destacou-se Fachin, que não apenas paralisou o
processo como alardeou que vai apresentar na quarta-feira um “rito” para o
impeachment. Como assim? Gilmar deu um pulo e não foi o único. Quem estabelece
o rito nesse caso é o legislador, não o juiz.
A lei de 1950 que rege o processo por crime de responsabilidade é a
mesma que serviu para apear Fernando Collor do poder. No caso dele, ninguém
reclamou, o Supremo não foi acionado nem se manifestou. Aliás, manifestou-se
anos depois para inocentar Collor, ou por falta de provas ou porque os crimes
estavam prescritos. Agora, o Supremo não só é acionado como já está se
manifestando abertamente e se jogando no olho do furacão político. A tendência,
senhoras e senhores, é de que acabe rachando ao meio, como se casa política
fosse.
Temendo a beligerância da Câmara, a Procuradoria-Geral da República
requereu a anulação da primeira Comissão Especial do impeachment, enquanto
Dilma pedia garantia de defesa prévia e já sustentava uma segunda questão: que
a aprovação do impeachment pela Câmara não vinculará a decisão do Senado. Ou
seja: o Planalto quer que o Senado ignore a decisão da Câmara, que tende a ser
desfavorável a Dilma, e não instaure o processo.
Pelo artigo 86 da Constituição, porém, se a Câmara admitir a acusação
contra a presidente por 2/3 de votos, o Senado terá que votá-lo, sem ter a
opção de não instaurar o processo. E, instaurado o processo no Senado, a
presidente será afastada por 180 dias, segundo o parágrafo primeiro do mesmo
artigo. Exatamente como ocorreu com Collor.
Fachin quer mudar isso? O plenário do Supremo vai concordar? Com base em
quê? E para quê? É isso que veremos ao longo desta nova semana de crise,
descalabros e muita tensão. O foco estará dividido entre a Câmara, onde Cunha
ultrapassa todos os limites, e o Supremo, onde todos e cada um dos ministros
estarão em xeque.
Xô, crise. Emendo uma semana de férias com a folga de fim de ano. Volto
à redação dia 28 e às páginas dia 30. Ótimo Natal!
Fonte: Estadão