O belga Joost Van Damme, 77 anos, planta várias frutas e ainda preserva as margens do Lago Descoberto: "Preocupação com o meio ambiente"
O Ibram e a Secretaria de Agricultura do DF aguardam até maio
do próximo ano as inscrições de produtores no Cadastro Ambiental Rural (CAR),
que servirá para mapear e detalhar os terrenos destinados à exploração agrária
Rosany é presidente da Pró-Descoberto: trabalho de conscientização
Eduardo aderiu ao cadastro para manter a documentação em dia
Para que agricultura e a preservação ambiental caminhem
juntas, é preciso correr contra o tempo. Produtores do Distrito Federal têm até
5 de maio de 2016 para se inscreverem no Cadastro Ambiental Rural (CAR) (leia
Para saber mais), ferramenta que deve regularizar e organizar quantos são, como
estão divididos e quais as atividades desenvolvidas nos imóveis localizados em
regiões de campo. Isso significa que os cerca de 20 mil terrenos em área
agrária deverão ser incluídos no sistema. A situação preocupa, pois, até agora,
menos de 10% do setor aderiram ao CAR. A dificuldade em convencer os
responsáveis pelos terrenos a fornecer informações necessárias para o cadastro
esbarra, em geral, no receio de punição por degradação ambiental. A não adesão,
no entanto, pode levar à aplicação de multas e à restrição de acesso a
programas de crédito.
O CAR foi
instituído a partir da versão mais recente do Código Florestal Brasileiro, de
2012. Ele vale para todos os imóveis agrícolas, escriturados ou não. O objetivo
do cadastro é realizar a regularização ambiental das propriedades, não a
fundiária. Assim, a ferramenta divide as propriedades em duas categorias: as
que têm até quatro módulos fiscais — 20 hectares — e aquelas com metragem
superior a essa. Os responsáveis pelas terras devem informar a situação das
APPs (aquelas com grande relevância para a preservação de recursos naturais, da
flora e da fauna), das Reservas Legais (fração do terreno com cobertura vegetal
nativa e possível de ser explorada de forma sustentável), das florestas das
Áreas de Uso Restrito (parcelas de grande relevância para manutenção de
recursos naturais, mas passíveis de exploração sustentável) e das áreas
consolidadas (local de atividade rural).
O prazo
para finalizar o CAR preocupa o Instituto Brasília Ambiental (Ibram-DF) e
demais entidades ligadas à agricultura no DF. Isso porque, até agosto, dos 20
mil imóveis rurais, apenas 1,8 mil forneceram os dados. Destes, 1,3 mil
referem-se a pequenos produtores familiares, que devem receber, inclusive, apoio
técnico do Poder Público para aderir ao cadastro. Esse suporte consiste de
atendimento, por meio de telefone, e de mutirões a serem realizados nas regiões
produtoras da capital. Uma plataforma virtual também deve ser lançada, em
setembro.
A Bacia
do Descoberto é a região prioritária no processo, uma vez que corresponde a 65%
do abastecimento de água do território e é onde concentram-se as unidades
produtoras de hortifrutigranjeiros do DF. “A nossa proposta é garantir a
preservação e a recuperação de locais degradados para evitar que se chegue a
uma situação como a que vive São Paulo, hoje, com escassez de recursos hídricos
e efeitos na agricultura”, alerta o gerente de Reserva Legal do Ibram, Alisson
Santos Neves. Para ele, as alterações refletem uma mudança na forma como a lei
encara a questão ambiental e a atividade econômica. “O CAR confirma uma
vertente geotecnológica do Novo Código Florestal, com mecanismos de
georreferenciamento e de entendimento de que a agricultura depende da
preservação ambiental”, explica.
Parte dos
proprietários de terrenos que margeiam o Lago do Descoberto, no Núcleo
Alexandre Gusmão, em Brazlândia, aderiu ao sistema. A Associação dos Produtores
e Protetores da Bacia do Descoberto (Pró-Descoberto) se uniu para fazer o
cadastro. “Fizemos um trabalho de consciência para mostrar os benefícios dele,
uma vez que as nossas terras têm áreas direcionadas à preservação ambiental. A
dúvida de muitos é se o instrumento vai garantir mesmo a sustentabilidade. A
expectativa é de que ele seja usado para monitorar também pontos mais distantes
da bacia, pois a nossa parte de preservação da orla está sendo feita”, explicou
a presidente da entidade, Rosany Cristina Carneiro. Ela produz plantas
ornamentais e preserva a margem.
Equilíbrio
Com produção
de milho, mandioca, verduras e plantas ornamentais em 10 hectares, o produtor
rural Eduardo Keyko Tsuboi, 47 anos, aderiu ao cadastro com a intenção de
manter a documentação da propriedade em dia. “Quis evitar também as
penalidades”, reconheceu. A propriedade dele, assim como as demais que margeiam
o Lago Descoberto, fica em uma APP que ocupa 2 hectares do terreno. “Não
tivemos muito o que adaptar, pois já fazíamos esse trabalho de preservação.
Porém, acho essencial que, após o cadastro, os produtores tenham um
acompanhamento para saber lidar com as maneiras de manter o ambiente
equilibrado”, defendeu.
O sistema
também possibilita que preservação e produção sejam trabalhadas de forma
conjunta. Com 13,8 hectares de produção de acerola, manga, banana, limão, entre
outros frutos, o belga Joost Van Damme, 77, equilibra as duas vertentes. Na
propriedade dele, é possível ver a APP às margens do lago, a reserva legal e os
pomares. “Não precisamos mudar nada por aqui, pois tínhamos a preocupação com o
meio ambiente. O lago não é degradado pelas minhas terras”, comentou. A adesão
ao CAR foi pensada por ele como uma maneira de garantir financiamento. “Não
tenho necessidade de pegar empréstimos no momento, mas é sempre bom manter tudo
regularizado”, diz.
O divisor
de águas, neste contexto, é a Lei de Crimes Ambientais. Isso porque, como a
norma só foi publicada em 2008, as punições ambientais só passaram a valer a
partir da data. Isso quer dizer que quem degradou antes daquele ano fica isento
de multas. Apesar das perdas ambientais ocorridas antes disso, a punição não
pode ser aplicada, aponta Alisson, do Ibram. “A proposta do CAR é
educativa, não punitiva”, completa.
Como fazer o cadastro
» A
adesão ao CAR ocorre por meio de envio das informações ao banco de dados
on-line. Assim, o
detentor do imóvel rural, proprietário, posseiro ou arrendador deve acessar o
site www.car.gov.br e incluir dados como dimensão da área, áreas de proteção
permanente, nascentes e demais recursos naturais e área consolidada. Tudo isso
é verificado por meio de georreferenciamento. Após a fase de cadastro, todos os
processos serão analisados, para comparação do que foi declarado com o que
está, de fato, no imóvel rural. Após avaliação individual, passa-se às ações de
recuperação de locais degradados.
PARA SABER
MAIS »Organização e mapeamento
O Cadastro Ambiental Rural (CAR) decorre do Código Florestal
Brasileiro, aprovado em 2012. O objetivo do CAR é mapear e organizar a situação
dos imóveis rurais em todo o país. Assim, após a adesão ao banco de dados, os órgãos
ambientais e ligados à agricultura terão dimensão de como estão as terras, onde
houve degradação e como é possível reverter a situação. Não há punições nem
multas previstas para quem aderir ao programa até 5 de maio de 2016. No
entanto, produtores rurais que não enviarem as informações estarão sujeitos ao
previsto no Decreto nº 6.514/2008, que define quais são os crimes ambientais e
as punições a serem aplicadas.
Por: Maryna Lacerda – Thiago Soares – Correio Braziliense –
Foto: Ed Alves/ CB/D.A. Press
Parabéns pelo artigo!
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