Curicaca
A natureza enlaça o brasiliense de maneira tão inapelável que
impõe uma convivência cotidiana com os bichos. O meu consultor para a matéria é
o artista plástico Luiz Gallina, que elaborou diversas séries de gravuras
inspiradas na vegetação e na fauna do cerrado. Atualmente, é possível avistar
muitas aves raras no centro da capital do país. É o caso da curicaca, uma ave de
grande porte, que costuma aparecer nos gramados. O arredio alma-de-gato também
costuma dar o ar de sua graça.
Biguá
A
quantidade de biguás, uma espécie de pato que mergulha à caça de peixe,
aumentou muito no lago. Certo dia, Gallina viu uma revoada com cerca de 500. O
sabiá laranjeiro, os papagaios, a arara-vermelha, os beija-flores, as
curicadas, os joões-de-barro são presenças frequentes da cidade-parque.
Gallina
imaginava que a população de pássaros havia crescido no Plano Piloto apenas em
razão do Lago Paranoá. Mas um amigo antropólogo explicou que, infelizmente,
isso tem ocorrido também por causa da pressão exercida pelas plantações de
soja, que provocam um desequilíbrio ambiental. Os pássaros e os bichos estão
aprendendo a viver na cidade.
Quando
passou a morar em um condomínio, Gallina se viu envolvido em muitas aventuras
cotidianas. Ao atravessar a ponte Honestino Guimarães, divisou um bando de
capivaras cruzando o asfalto, parou o carro e começou a fazer sinais
desesperados aos motoristas para que não atropelassem os bichos. Do outro lado
da pista, outro sujeito fez o mesmo. Depois que as capivaras partiram, claro
que os dois ficaram conversando um tempão sobre bichos. É muito comum acontecer
isso em Brasília.
Estava de
volta para casa, quando avistei um ciclista no meio de uma via do Lago Sul,
próximo a uma área de reserva ambiental, com acenos aflitos. Imaginei que ele
alertasse para algum acidente próximo. Olhava e não detectava nada. Mas, de
repente, baixei os olhos e vi algo brilhante se movendo no chão. O que o
ciclista protegia era uma elegante cobra desfilando tranquilamente pela avenida.
Existem
as corujinhas da Octogonal, as corujinhas das placas-tótens de identificação da
713 Norte e, agora, os tucanos da 415 Norte. Da janela dos prédios, os
moradores e observadores de pássaros acompanham os mínimos movimentos da
família tucanuçu durante o período de reprodução. Nada escapa: a festa da
comida, as bicadas e os beijos.
Tucanuçu
Há alguns anos, atirei pedras para dispersar uma turma de macacos-pregos que infernizam o telhado de casa e tive uma torção no braço que me provocou dores terríveis. Fiquei igual aquele personagem da famosa charge: “Dói só quando eu respiro”. Todos a quem narrei os meus padecimentos ficaram mais preocupados com os macaquinhos do que comigo. Nunca vi turma mais bagunceira. Até o doutor Rafael, competente fisioterapeuta que me atendeu, fez recomendações em tom intimidatório: “Mas os macaquinhos? Trata bem dos macaquinhos”. Realmente, brasiliense gosta de bicho, brasiliense fala a língua dos bichos.
Há alguns anos, atirei pedras para dispersar uma turma de macacos-pregos que infernizam o telhado de casa e tive uma torção no braço que me provocou dores terríveis. Fiquei igual aquele personagem da famosa charge: “Dói só quando eu respiro”. Todos a quem narrei os meus padecimentos ficaram mais preocupados com os macaquinhos do que comigo. Nunca vi turma mais bagunceira. Até o doutor Rafael, competente fisioterapeuta que me atendeu, fez recomendações em tom intimidatório: “Mas os macaquinhos? Trata bem dos macaquinhos”. Realmente, brasiliense gosta de bicho, brasiliense fala a língua dos bichos.
Macaco Prego
Por: Severino
Francisco - editor de Cultura e colunista do Correio Braziliense – Fotos/Ilustração:
Blog – Google
Prezado Chiquinho Dornas
ResponderExcluirBelíssima crônica. Viver numa cidade-parque tem suas vantagens.
Poré, discordo, em parte, da afirmação do antropólogo, citado pelo artista plástico Luiz Gallina:
“.... imaginava que a população de pássaros havia crescido no Plano Piloto apenas em razão do Lago Paranoá. Mas um amigo antropólogo explicou que, infelizmente, isso tem ocorrido também por causa da pressão exercida pelas plantações de soja, que provocam um desequilíbrio ambiental. Os pássaros e os bichos estão aprendendo a viver na cidade”.
Não é bem assim, pois há as reservas nativas em cada propriedade rural e as aves e pequenos animais silvestres lá estão. Se assim fosse, outras cidades também teriam a grande quantidade de pássaros e pequenos animais que nossa Brasília tem. Sabe qual é a diferença entre Brasília e outras cidades que não desfrutam dessa fauna, presente diariamente? A grande área verde com frondosas árvores, sendo que milhares delas são frutíferas (abacate, amora, jamelão, goiaba, manga, jaca, caju, jabuticaba, manga, pitanga, laranja, banana, carambola... e tantas outras).
Aí está a receita para se ter pássaros e pequenos animais: árvores frondosas para nidificação e fartura de alimento (frutas). Quer uma prova? Veja a foto do macaco prego que ilustra a crônica. Ele está no galho de uma árvore chamada “jamelão” que produz enorme quantidade de frutos (preto/roxo... bom para danificar a pintura do carro...rsrs) que servem de alimento para toda a fauna.
A Brasília de antes não tinha tantos pássaros e pequenos animais selvagens. Só agora, mais recente, com o crescimento das árvores e proliferação das frutíferas, eles estão chegando e aqui se reproduzindo. Em frente à minha janela as pombas “asa-branca” (em Minas chamamos de “trocal” ou juriti, um pouco mais marrom e bem maior que as rolinhas) fazem seus ninhos e se deliciam com jamelão, amora e abacates. Foi assim na minha chácara. Depois que plantei várias espécies de fruteiras, os pássaros se multiplicaram. Até os tucanos passeiam por lá em busca de mamão, sua fruta predileta, sem contar os canarinhos-da-terra que nos alegram com suas redobradas cantorias.
Um abraço