*Por Severino Francisco
Sérgio Moriconi é uma espécie de neto espiritual do crítico Paulo Emílio
Salles Gomes. É cineasta, crítico, jornalista, ensaísta e professor; e cada um
desses ofícios enriquece e tensiona o outro. Da mesma maneira que os poetas
parnasianos declamavam sonetos de cor, ele recita planos ou sequências inteiras
de Griffith, de Eisenstein, de Godard, de Visconti, de Abas Kiarostami, de
Nelson Pereira dos Santos, de Glauber Rocha ou do cinema mais recente.
É um legítimo representante da inteligência brasiliana forjada a partir
da audácia dos projetos pioneiros da Universidade de Brasília, que criou o
primeiro curso de cinema da universidade brasileira, concebido por Paulo Emílio
Salles Gomes e Nélson Pereira dos Santos e, em segundo momento, materializado
por Vladimir Carvalho.
Sérgio vive cinema 24 quadros por segundo e tem mais horas em salas de
exibição do que beija-flor de voo. Não é um erudito previsível que repete as
informações acumuladas. Ele filtra, seleciona, critica, recorta e estabelece
conexões originais.
Com seus cursos livres, ele formou quatro gerações de apaixonados por
cinema na cidade. Não tem preconceitos, gosta de se renovar na interação com as
novas gerações, aceita discutir a percepção dos adolescentes, por mais
aparentemente estapafúrdia que seja.
Moriconi escreveu um livro essencial para compreender Brasília: Cinema
brasiliense: apontamentos para uma história. Na verdade, ele nos revelou
que, no princípio, era o cinema em Brasília. Antes mesmo de existir a cidade,
cinegrafistas de todo o mundo desembarcaram no Planalto Central para documentar
a criação épica da capital modernista em cima do cerrado no meio das nuvens de
poeira. Esse era um claro sinal da predestinação da cidade para a produção
audiovisual.
Moriconi é o responsável pela programação do Cine Brasília e, graças a
ele, a sala passou por um processo de renascimento. Ele diversificou e
modernizou a programação como se fosse a de um shopping. O Cine Brasília exibe
quatro ou cinco filmes durante os fins de semana. As crianças têm opção de
qualidade garantida e passaram a frequentar a sala.
Antes da gestão de Moriconi, o Cine Brasília, uma das melhores salas de
cinema do país, era mais um elefante branco na paisagem. Ele transformou o
elefante branco em um espaço vivo durante todo o ano. É a melhor homenagem que
pode ser prestada aos 50 anos do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, a
serem comemorados neste 2017.
Este templo do cinema nacional não pode ser reduzido a mero palco do
evento. Moriconi está mostrando como se faz uma ocupação inteligente dos
espaços públicos. É muito bom ver os prédios públicos revitalizados por uma
programação de qualidade. E isso acontece quando a pessoa certa está no lugar
certo.
Orquestra
Sinfônica Claudio Santoro apresenta concerto especial
para as crianças no Cine Brasília.
(*) Severino Francisco - Jornalista, colunista do Correio Braziliense -
Fotos: Bento Viana - Luís Nova/CB/D.A.Press - Ilustração: Blog - Google