Aos
filhos: saibam guardar
*Por Ana Dubeux
Por um instante, olhando para a minha netinha, Liz,
visito a minha infância. Passo um tempo ali em plena perseguição às lembranças
mais antigas, tentando o impossível: saber o que se passa na cabecinha de uma
criança em seus primeiros anos. Meio improvável que tenhamos conscientemente
recordações dessa época de nossas vidas. Mas há algo que consigo manter em mim,
aqui dentro do coração e no centro das atenções, como o mais duradouro
aprendizado, aquele que é para sempre: a importância da minha mãe.
Consigo sentir seu cheiro, ouvir sua bênção, sentir
o sabor de sua comida, o aconchego do ventre, que permanece como minha
preferida morada. É para lá que eu corro, para a caverna mais primitiva da
existência, quando desejo um escurinho silencioso, bem nutrido e seguro para
pensar, chorar, curtir um momento sublime. Mãe é proteção, amor, divisão,
conforto. Não conheço outra forma de dar nome à maternidade que não sejam
palavras absolutamente relacionadas ao desprendimento do próprio ser. A
maternidade é doação. Que os filhos saibam guardar essa generosa oferta.
Neste Dia das Mães, desejo que meus filhos tenham
boas e más histórias a contar sobre mim, que saibam cantar minhas músicas
preferidas, rir dos meus vexames nas viagens de avião, perdoar minhas falhas e
se orgulhar das minhas conquistas. Mas, além disso tudo, o que sempre vou
perseguir, lá no íntimo, é que consigam guardar, abrigar na alma um ser humano
que erra e ama em demasia. Que tenham o meu amor em suas lembranças e que elas
sejam boas e generosas. Que acessem, com seus radares sentimentais, minha
história e minhas experiências como algo que possam levar de exemplo — e não
apenas bom exemplo, diga-se de passagem.
Hoje, leio relatos e mais relatos de jovens mães
lutando para, em meio à maternidade, descobrir-se novamente como mulher,
trabalhadora, amante, pessoa com direitos à própria individualidade, a momentos
de solidão escolhidos a dedo ou de prazer sem a presença dos filhos. Há um
esforço genuíno nisso tudo e bastante legítimo, mas desconfio lá no fundo que
nós, como mães, nunca mais seremos apenas nós — ou talvez sejamos, mas apenas
por lapsos de tempo. E não sei se isso é de todo mal.
Acredito que, no máximo, conseguiremos o benefício
da isenção de culpa e esta, sim, será uma conquista fenomenal. No mínimo, o que
deixaremos é uma herança linda de memórias e sensações para nossos filhos. Pode
ter certeza: isso fará deles seres humanos melhores, com um vasto repertório
amoroso. Feliz Dia das Mães!
(*) Ana
Dubeux – Editora-Chefe do Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog - Google